DOS LIVROS(2)
MIRANDA SÁ (Email: mirandsa@uol.com.br)
Não se pode falar de livros sem dar uma volta ao passado e lembrar a Biblioteca de Alexandria fundada no Império Macedônico. Conforme historiadores, foi uma iniciativa do “faraó” Ptolomeu 1º (366 a.C. – 283 a.C.), sucessor de Alexandre no governo egípcio e fundador da dinastia ptolomaica do Egito.
A Biblioteca fez parte de um extraordinário complexo cultural ao lado do primeiro museu da História (assim chamado em homenagem às Musas), um observatório astronômico e um jardim zoológico. Esse conjunto arquitetônico tornou Alexandria o centro intelectual de sua época, atraindo gente de todo mundo civilizado.
A universalidade cultural deu lugar a fervilhantes debates de caráter filosófico, político e religioso, num raro momento histórico de liberdade do pensamento. Talvez em razão disto, após servir por quase 600 anos, foi destruída entre os anos 250 a 270.
Segundo estudiosos da cultura helênica disseminada mundo afora, o incêndio maligno teria sido provocado por uma guerra ou pela intolerância religiosa, com diferentes versões sobre a responsabilidade do fato.
Uma das opiniões credita a Júlio César a destruição após o fim do triunvirato romano. Para impedir o confronto marítimo com Pompeu, teria incendiado os navios aportados em Alexandria, e o incêndio se estendeu alastrando-se até à Biblioteca.
Outra variante, mais forte do que esta, aponta como incendiário Anre ibne Alas, o sunita conquistador do Egito. Registra-se que ele teria seguido instruções do califa Omar que o orientou argumentando que “se os livros estiverem de acordo com o Alcorão, não precisamos deles; e se eles se opõem ao Alcorão, destrua-os”.
Bernard Lewis, autor do livro “O que deu errado no Oriente Médio” diz que a história é falsa e foi reforçada na Idade Média por Saladino, quando se tornou sultão do Egito; e, como chefe militar, enfrentou cruzados europeus no Levante.
Lewis subscreve que Saladino decidiu acabar com a coleção de textos ismaelitas heréticos do Califado Fatímida no Cairo, e alardeou a intervenção de Omar no caso da Biblioteca para dar aparência legal às suas medidas destrutivas.
Ambas interpretações são duvidosas porque as datas não correspondem ao calendário apresentado. Também provoca incredibilidade responsabilizar o cristianismo imperial romano afirmando quando o imperador romano Caracala incentivou o saque da cidade de Alexandria pelo seu exército, a Biblioteca teria sido invadida e incendiada por cristãos fanáticos que destruíram os livros que não estavam de acordo com sua fé.
Com relação aos livros, considera-se que mais importante para o mundo é a herança deixada pela Biblioteca de Alexandria, registrada na História da Humanidade como a primeira universidade do mundo; um modelo seguido até os dias atuais.
Verifica-se tristemente que a queima de livros ocorrida no Mundo Antigo com milhares de papiros e outras formas de transmitir informações científicas, históricas, filosóficas e religiosas, foi aproveitada pelos nazistas…….
Joseph Goebbels, ministro nazista da Propaganda, para alinhar as artes e a cultura alemãs com os objetivos nazistas, determinou em 1933 à Gestapo levar professores universitários, reitores e estudantes a participar da – “Bücherverbrennung” – Queima de Livros, e levar à fogueira obras de Bertolt Brecht, Erich Maria Remarque, Ernest Hemingway, Heinrich Heine, Henrik Ibsen, Karl Marx, Sigmund Freud, Stefan Zweig e Thomas Mann, entre outros que não lembro.
O Tribunal de Nuremberg condenou o fato a pedido dos promotores franceses e soviéticos, mas negou a prisão dos responsáveis pelo assassinato da Cultura…
Talvez por falta desta punição, vê-se tristemente nesses inícios do século 21 pessoas que desejam imitar os nazistas proibindo livros, punindo autores e imprimir a censura! Esses zumbis fascistóides não dão valor ao legado da Antiguidade que a Biblioteca de Alexandria nos deixou.
Para defender verdadeiramente a Democracia, seus auto-assumidos guardiães do STF não os condena, relativizando os ataques à literatura que assistimos. Deveriam conhecer o pensamento do escritor, dramaturgo e poeta Oscar Wilde que gravou: “Não existem livros morais ou imorais. Os livros são bem ou mal escritos”
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