Arquivo do mês: outubro 2016

INVERSÃO

MIRANDA SÁ (E-mail: mirandasa@uol.com.br)

“A ditadura perfeita terá as aparências de uma democracia, uma prisão sem muros na qual os prisioneiros não sonharão sequer com a fuga” (Aldous Huxley)

Como explicar o resultado das eleições sem antes comprovar que o povo brasileiro despertou para a realidade, quarenta anos depois da redemocratização? Rebelou-se contra a politicagem e a corrupção como fez na passeata dos cem mil pedindo as diretas já.

Recordemos que o regime militar instalado com a derrubada do governo de João Goulart, teve altos e baixos, erros e acertos, mas foi intoleravelmente ditatorial. Era um sistema imperfeito, mas durou 21 anos.

Aplaudida pelos amantes da liberdade, a redemocratização veio, porém, incompleta: recuperou velhos políticos e suas ideias ultrapassadas, barrando a evolução para os novos tempos. A redemocratização errou ao promulgar uma Constituição desorientada, leniente e passiva, tanto na visão autoritária como na liberal.

A Carta de 88 permitiu – é difícil registrar quando começou – que se instalasse a inversão de valores morais e éticos. Este conceito de inversão social estabeleceu mais direitos do que deveres, num desequilíbrio que perverteu a Democracia, mantendo a força e a influência das minorias como ocorre nas ditaduras.

A “Constituição Cidadã” esqueceu que no regime democrático quem manda é a maioria, e banalizou a definição de ideologia e de partido, implantando a ideia de que “ideologia” é um princípio escrito e que partido é uma organização burocrática sem a necessidade de adotar uma ideologia de fato.

Nesta inversão de valores tudo que é incorreto, aético, desonesto e imoral é tratado como algo banal, conforme escreveu um observador da cena política no Brasil, de quem, infelizmente, não gravei o nome.

O pior de tudo é que a implantação da democracia capenga vulgarizou o desprezo pela correção, pela ética, pela honestidade e a moral. Mas isto não se deu pela força, através de uma revolução; se achegou sutilmente, sem pressa e sem que ninguém percebesse.

Dessa maneira, já temos uma geração formada pelo mecanismo da inversão de valores. Não é absolutamente por acaso que na administração pública reinam a amoralidade e a corrupção. As universidades e escolas públicas estão sob domínio de uma cultura infame, que investe contra a ordem, o patriotismo, o respeito ao próximo e a solidariedade humana.

As minorias fazem greve parando o sistema de saúde e a escola pública; e o povo, que necessita desses serviços, é o único prejudicado, pois no fim o salário dos grevistas é injustamente pago. A greve de empregado contra patrão é reconhecida historicamente; mas a greve de professores e pessoal da saúde contra o povo, é crime.

Comprovando esses desacertos, concluímos que escapamos do regime militar e caímos na esparrela de uma democracia onde o Estado sustenta com o dinheiro dos tributos associações corporativas, ONGs, partidos, sindicatos, cada qual defendendo interesses pessoais e grupistas. Esse reino da pelegagem minoritária atingiu o ápice durante a Era Lulopetista.

É com muita tristeza que constatamos isto. Ainda mais aflitivo e melancólico é ver que se trata de um projeto político, para a conquista do poder por um partido de formação totalitária.

Durante os mandatos presidenciais lulopetistas atravessamos uma caricata “revolução cultural” com os olhos oblíquos de Mao-Tse Tung na cabeça de Antônio Gramsci. O PT e seus puxadinhos agiram furtivamente em defesa do partido e da manutenção do poder a qualquer custo, sem respeitar a liberdade e a democracia. Por isto, pelo despertar do povo, estão sendo enxotados.

No Rio de Janeiro, o PSOL, frente “coxinha” do PT, convergiu com seus parceiros do PCdoB, desbotando suas bandeiras e escondendo seus símbolos para ludibriar o eleitor. Mas o eleitor não se deixou enganar.

A metamorfose fraudulenta não se expandiu; limitou-se ao discurso deles para eles mesmos, sem participação popular. Ficaram circunscritos aos guetos da Zona Sul. O povo preferiu os não-políticos e o não-voto como manifestação de repúdio à corrupção institucionalizada pelo lulopetismo, e derrotou-o.

 

Manoel de Barros

Desexplicar

Escrever nem uma coisa
Nem outra –
A fim de dizer todas –
Ou, pelo menos, nenhumas.

Assim,
Ao poeta faz bem
Desexplicar –
Tanto quanto escurecer acende os vaga-lumes

Gabriela Mistral e Cecília Meireles

DÁ-ME TUA MÃO

 

Dá-me tua mão, e dançaremos;

dá-me tua mão e me amarás.

Como uma só flor nós seremos,

como uma flora, e nada mais.

 

O mesmo verso cantaremos,

no mesmo passo bailarás.

Como uma espiga ondularemos,

como uma espiga, e nada mais.

 

Chamas-te Rosa e eu Esperança;

Porém teu nome esquecerás,

Porque seremos uma dança

sobre a colina, e nada mais.

 

 

 

Extraídos de GABRIELA MISTRAL & CECÍLIA MEIRELES; GABRIELA MISTRAL Y CECÍLIA MEIRELES. Rio de Janeiro: Academia Brasileira de Letras; Santiago de Chile: Academia Chilena de La Lengua, 2003

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Dylan Thomas

A força que impele através do verde rastilho a flor
impele os meus verdes anos; a que aniquila as raízes das árvores
é o que me destrói.
E não tenho voz para dizer à rosa que se inclina
como a minha juventude se curva sobre a febre do mesmo inverno.

A força que impele a água através das pedras
impele o meu rubro sangue; a que seca o impulso das correntes
deixa as minhas como se fossem de cera.
E não tenho voz para que os lábios digam às minhas veias
como a mesma boca suga as nascentes da montanha.

A mão que faz oscilar a água no pântano
agita ainda mais as da areia; a que detém o sopro do vento
levanta as velas do meu sudário.
E não tenho voz para dizer ao homem enforcado
como da minha argila é feito o lodo do carrasco.

Como sanguessugas, os lábios do tempo unem-se à fonte;
fica o amor intumescido e goteja, mas o sangue derramado
acalmará as suas feridas.
E não tenho voz para dizer ao dia tempestuoso
como as horas assinalam um céu à volta dos astros.

E não tenho voz para dizer ao túmulo da amada
como sobre o meu sudário rastejam os mesmos vermes.

tradução: Fernando Guimarães

Antero de Quental

Evolução

Fui rocha em tempo, e fui no mundo antigo
tronco ou ramo na incógnita floresta…
Onda, espumei, quebrando-me na aresta
Do granito, antiquíssimo inimigo…

Rugi, fera talvez, buscando abrigo
Na caverna que ensombra urze e giesta;
O, monstro primitivo, ergui a testa
No limoso paúl, glauco pascigo…

Hoje sou homem, e na sombra enorme
Vejo, a meus pés, a escada multiforme,
Que desce, em espirais, da imensidade…

Interrogo o infinito e às vezes choro…
Mas estendendo as mãos no vácuo, adoro
E aspiro unicamente à liberdade.

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SANTUÁRIO

MIRANDA SÁ (E-mail: mirandasa@uol.com.br)

“A consciência é um santuário sagrado em que somente Deus pode entrar na qualidade de juiz”. (Félicité Lamennais)

Um santuário (do Latim sanctuarium, de sanctus), no conceito religioso, é um local sagrado, possui objetos simbólicos usados no culto para onde, por devoção, acorrem peregrinos de regiões longínquas.

Os católicos romanos e ortodoxos guardavam nos santuários relíquias e imagens. A Igreja Romana, tendo abolido o culto de imagens, as mantêm, entretanto, como respeito às tradições.

O termo santuário também pode ser usado em sentido figurado. Na Idade Média e mesmo na transição para o Renascimento considerava-se que as igrejas serviam de abrigo, reconhecido pelo Direito Canônico para os fugitivos da justiça e criminosos em geral.

No Brasil, em pleno Estado de Direito, as casas do Congresso estão se transformando em santuários para dar refúgio a políticos corruptos, denunciados pela Lava Jato. O santuário político foi registrado pela primeira vez na Guerra do Vietnã.

Os vietcongs criaram “santuários” nas fronteiras do Laos e do Camboja e em regiões acessíveis apenas pelas “trilhas de Ho-Chi-Mim”. Lá faziam o treinamento de guerrilheiros e estabeleciam pequenas fábricas de armas e gráficas, para o combate e propaganda.

Daí em diante, o conceito de santuário pulou do campo religioso para o campo político: Está associado a um conceito ecológico, pois determina um lugar protegido, com ajuda dos humanos, para grupos de animais selvagens e/ou ameaçados de extinção.

O Dicionário Aurélio registra “santuário ecológico”, local em condições favoráveis à preservação das espécies, onde a caça é permanentemente proibida. E é o título de um filme americano-australiano com roteiro de John Garvin e Andrew Wight, e dirigido por Alister Grierson, que viveu o drama desenrolado pela película.

“O Santuário” conta a história de um mergulhador e sua equipe que são obrigados a fugir de uma tempestade mergulhando mais fundo e embrenhando-se num labirinto de cavernas subaquáticas para sobreviver.

Sem devoção religiosa, nem guerra, nem ambientalismo, os brasileiros se assombram e se revoltam ao ver o Senado acoitar bandidos – oficialmente – como nos tempos do cangaceirismo. Um “santuário” do mal.

O presidente da Casa, Renan Calheiros, ele próprio envolvido numa série de denúncias por ação criminosa, usa a polícia legislativa com sofisticado aparelhamento e portando armas letais para defender-se e abrigar senadores e ex-senadores corruptos.

Com tristeza, o Brasil assiste à formação de uma legião de defensores deste disparate: o Poder Legislativo, que deveria representar o povo, transforma-se num estado dentro do Estado, comandado por bandidos.

Há os que não enxergam a existência de uma polícia particular, com atiradores experientes, prontos para atender uma voz de comando e atirar contra manifestantes indefesos. E pior que isto: com um “grupo de inteligência” formado para a contrainformação, fazendo escutas e preparando dossiês.

Que País é este, que Democracia é esta, convivendo com este cenário antinacional e antidemocrático?  Que Justiça é esta, que cega não para ser imparcial, mas para ser leniente com este estado de coisas?

Pedir intervenção das FFAA ou queixar-se à Mãe do Bispo para mim, não é saída. Somente a volta – POR CONSCIÊNCIA –  dos patriotas às ruas, aos milhões, como juízes, para acabar com a farra do “santuário” de Calheiros…

Federico Garcia Lorca

Confusão
(Tradução de Oscar Mendes)

 
Meu coração
é teu coração?
Quem me reflexa pensamentos?
Quem me presta
esta paixão
sem raízes?
Por que muda meu traje
de cores?
Tudo é encruzilhada!
Por que vês no céu
tanta estrela?
Irmão, és tu
ou sou eu?
E estas mãos tão frias
são daquele?
Vejo-me pelos ocasos,
e um formigueiro de gente
anda por meu coração.

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Ferreira Gullar

Aprendizado

Do mesmo modo que te abriste à alegria
abre-te agora ao sofrimento
que é fruto dela
e seu avesso ardente.

Do mesmo modo
que da alegria foste
ao fundo
e te perdeste nela
e te achaste
nessa perda
deixa que a dor se exerça agora
sem mentiras
nem desculpas
e em tua carne vaporize
toda ilusão

que a vida só consome
o que a alimenta.

De Barulhos (1980-1987)

Dylan Marlais Thomas

AMOR NO HOSPÍCIO

Uma estranha chegou
A dividir comigo um quarto nessa casa que anda mal da cabeça,
Uma jovem louca como os pássaros

Que trancava a porta da noite com seus braços, suas plumas.
Espigada no leito em desordem
Ela tapeia com nuvens penetrantes a casa à prova dos céus

Até iludir com seus passos o quarto imerso em pesadelo,
Livre como os mortos,
Ou cavalga os oceanos imaginários do pavilhão dos homens.

Chegou possessa
Aquela que admite a ilusória luz através do muro saltitante,
Possuída pêlos céus
Ela dorme no catre estreito, e no entanto vagueia na poeira
E no entanto delira à vontade
Sobre as tábuas do manicômio aplainadas por minhas lágrimas deâmbulas.

E arrebatado pela luz de seus braços, enfim, meu Deus, enfim
Posso de fato
Suportar a primeira visão que incendeia as estrelas.

.(tradução: Ivan Junqueira)

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LADRÃO

MIRANDA SÁ (E-mail: mirandasa@uol.com.br)

“Um homem que rouba por mim fatalmente roubará de mim” (Theodore Roosevelt)

O primeiro presidente Roosevelt, dos EUA, nosso epigrafado, chega à perfeição expressando como age o ladrão do dinheiro público; pode até ‘justificar’ a razão do roubo, para o partido, para a revolução, para a vitória do socialismo, mas é um ladrão, que rouba por ele, nunca pelo povo.

Ladrão é aquele que rouba. A palavra dicionarizada pode ser adjetivo e substantivo masculino.  Vem do latim, latro/latronis. Quando a palavra chegou ao português, ainda no século 11 recebeu a grafia ladrones: Então, como hoje, tinha a definição de “aquele que furta, rouba, se apodera do alheio”.

O português falado no Brasil tem uma rica sinonímia da palavra ladrão: além de gato, gatuno, larápio e rato, é adjetivado como “ladrão de carteirinha”, referindo-se ao profissional; “ladrão de gravata ou de colarinho branco”, da classe alta, “ladrão de galinha”, o pé de chinelo…

O “ladrão” é tema no mundo cultural: no cinema tivemos o premiado filme francês de André Téchiné, “Os Ladrões” de 1996, e na literatura, os contos “O ladrão”, de Mário de Andrade e “Um ladrão”, de Graciliano Ramos, este último levado ao teatro.

É coloquial até o superlativo “ladrãozão”, que o Dicionário de Gíria de J.B. Serra e Gurgel dá um exemplo que parece bastante atual para ser usado: “O senador é um ladrãozão. E viva a impunidade! ”.

Os “ladronzões’ do dinheiro público sempre existiram, mas se multiplicaram geometricamente nos governos de Lula e Dilma, do Partido do Trabalhadores. Não é por acaso a prisão dos hierarcas do PT, quatro tesoureiros do partido entre eles.

A Nação tem acompanhado a condenação dos envolvidos no escândalo do Mensalão e do Petrolão envolvendo a Petrobras, Eletrobrás, empresas públicas e fundos de pensão. Na primeira fase, com a prisão do ministro-chefe da Casa Civil do governo Lula, revelou as propinas distribuídas a parlamentares para sustentar a base parlamentar do PT-governo.

Daí em diante uma corrente fluindo com centenas de corruptos nos poderes da República, evidenciou a existência de uma organização criminosa. Através da descoberta dessa organização criminosa chegou-se ao Petrolão.

A Operação Lava-Jato foi causa e consequência de uma grande faxina para varrer de uma vez para sempre os corruptos e corruptores da vida nacional. Os investigadores encontraram provas contundentes do envolvimento de parlamentares de todos os partidos.

Não há dúvida, entretanto, que o suporte do assalto ao Erário, é o lulopetismo e principalmente o seu chefe Lula da Silva. Qualquer aprofundamento nas investigações, nas delações premiadas, testemunhos e provas, aponta para Lula como mentor, articulador e usufrutuário da roubalheira.

Seguindo o levantamento dos crimes praticados leva-nos até ao passado criminoso dos lulopetistas ao chegar ao empréstimo do Banco Schahin executado pelo PT. Foi para pagar um chantagista que ameaçava acusar Lula como responsável do assassinato do prefeito Celso Daniel, de Santo André.

A criminalidade de Lula se estendeu ao poste eleito por ele, a destrambelhada, incompetente e inconsequente Dilma Rousseff, cuja administração institucionalizou a ação dos ladrões do dinheiro público.

É indiscutível a participação de Dilma no fato revoltante da compra das refinarias de Pasadena e Nansei Sekiyu, uma bandidagem inolvidável, cujo rombo nas contas da Petrobras é quase impagável.

O grande William Shakespeare adverte que “A suspeita sempre persegue a consciência culpada; o ladrão vê em cada sombra um policial”; é assim que se assiste o pânico das hostes defensoras do antigo regime derrubado pela prática criminosa.