Arquivo do mês: novembro 2021

RETORNO

MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.com.br)

“Cada um de nós deve decidir se quer caminhar na luz do altruísmo construtivo ou nas trevas do egoísmo. ” (Martin Luther King)

Li tristemente pelos jornais que o presidente da Fundação Palmares, Sérgio Camargo, disse em entrevista que concorda com chibatadas como pena para a pichação. É o sonho de consumo dos saudosistas da tortura, a volta do sistema de punição que foi abolido em 1910, após a “Revolta da Chibata”.

Esta extemporânea e inconsequente regressão ao chicote dos capatazes da extrema direita não é um fato isolado. Observadores da política analisam que se trata de um objetivo do capitão Bolsonaro, após trair as promessas de uma economia liberal e do combate à corrupção pela reeleição que maldisse na campanha….

Junto-me aos que consideram um estorvo a instalação de uma Familiocracia tipo Coreia do Norte, assistindo repetidas ameaças à imprensa livre e a volta ao tempo execrável da ditadura.

A política nefasta do obscurantismo anticientífico que faz em nome da religião, o capitão Bolsonaro atrasa o desenvolvimento brasileiro em 10 anos ou mais, levando-nos historicamente à ignorância do papa Pio VII ao dizer para o cientista alemão Alexandre von Humboldt que os meteoritos eram pedras que caíam de uma fenda na abóboda celeste…. Este desatino dogmático retardou em 100 anos o desenvolvimento civilizatório!

Isto é o que se vê na estupidez do Negacionismo, produto do ódio obsessivo do capitão Bolsonaro e dos seus seguidores pela Ciência. Assim se vê um retorno à Era da Ignorância que fascina o falso conservadorismo para conquistar a massa ignara.

“Retorno”, aliás, é uma palavra que agrada muito aos autores de manifestos reacionários e aos recompiladores de títulos cinematográficos….  Como verbete dicionarizado é um substantivo masculino derivado do verbo retornar, originário do latim “re-tornare” significando “de novo”, “de volta”, “virar-se”, “fazer um movimento circular”.

A derivação regressiva de retornar é o ato ou efeito de voltar, dando-se em troca o que se recebeu. No espaço ou no tempo, o retorno nos leva â simbologia milenar dos chineses, egípcios e gregos, que o representavam ora como dragão, ora como serpente que mordem sua própria cauda. É o “ouroboro”, do grego antigo: οὐρά, que significa “cauda” e βόρος, que significa “devora”.

Pelas voltas que o mundo dá, filósofos metafísicos consideram uma “Lei do Retorno”; o padrão cíclico da Natureza no espaço infinito, recomendando o texto bíblico para julgar comportamentos, escrito no Apocalipse 13:10, “se alguém matar à espada, é necessário que à espada seja morto”.

Do outro lado, a escola científica mostra pela Fisiologia a impossibilidade biológica da volta a um efeito metabólico funcional influenciando a saúde dos indivíduos; e discorda sobre a repetição de um movimento corporal, de um gesto e da entonação de uma mesma palavra….

Assim, pregar o negativismo mordendo a própria cauda é prestar serventia à morte. Os que defendem o castigo das chibatadas, devem pensar que esta postura é reflexiva, e que possivelmente isto seja cogitado por outrem contra si…. É o que se comprova no exemplo das centenas de mortes de pessoas que negaram a vacina contra a covid-19 pelo mundo afora.

Isto não é “por acaso”, coisa que não existe nas análises metafísicas, empíricas ou materialistas. É translúcida a autossuficiência do religiosismo hipócrita, que assistimos na movimentação política que ocorreu no Dia do Evangélico explorado por Bolsonaro.

Ali faltou a complacência cristã nos discursos de ódio contra os adversários sob gritos de aleluia, e os ouvidos moucos ao princípio universal da Lei de Causa e Efeito determinando que tudo o que acontece na Natureza tem resposta, e que todo sentimento e todo comportamento humano, têm o seu retorno.

MISTÉRIOS

MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.com.br)

“O Mistério, para ser misterioso, não mostra a cara; mas ao ser revelado parece óbvio” (Anônimo)

Os mitos mais antigos do Egito dos Faraós reverenciavam o antropomorfismo cultuando como deuses seres metade homem, metade animal. Nos seus templos tinham o deus Thoth, com corpo humano e cabeça do íbis, um pássaro sagrado.

Atribuía-se a Thoth a posse da sabedoria universal, os estudos astronômicos, a criação da escrita, da música e da alquimia. Referindo-se ao deus, textos encontrados na Península Arábica, relatam a história de um sábio que teria vivido no Egito antigo, assumindo a identidade de Toth. Chamava-se Hermes Trismegisto.

Trismegisto – Três Vezes Grande – teve o seu perfil divulgado na Grécia pelos neoplatônicos, conferindo-lhe a autoria de vários livros ocultistas, entre os quais a “Tábua de Esmeralda” e o “Corpus Hermeticum”.

Nestas obras encontra-se a referência dos seres humanos trazendo em si partículas da divindade, outorgando-lhes a qualidade de serem, em determinadas circunstâncias, a condição de um minúsculo deus.

Hermes Trimegisto explica na analogia entre o macrocosmo e o microcosmo, que a atribuição da divindade humana ocorre porque “o que está no alto iguala-se ao que está embaixo” mantendo o equilíbrio do universo e do átomo. E, na mente humana, o mistério da tristeza e da alegria.

Sobre o mistério da alegria, é-me impossível deixar sem repartir as minhas memórias juvenis e a esperança de um futuro radiante, deixando para trás a realidade deteriorada do negativismo funesto do bolsonarismo que vivemos hoje.

Acredito que a alegria é um mistério. Explico-o pelo exemplo de uma polêmica que acompanhei no Twitter sobre a participação histórica do ex-presidente Juscelino Kubitscheck; um cidadão ignorou e ideologizou danosamente a presença do grande mineiro na política brasileira; e o outro protagonista, Antônio Carlos Rosário, com cultura e inteligência, desfiou o rosário da vida de JK calando-o, deixando-me saudoso daquela época feliz.

Alexandre Herculano, um dos mais importantes escritores da língua portuguesa, escreveu que “o segredo da felicidade é encontrar a nossa alegria na alegria dos outros”.  Foi inspirado nisto que faço questão de registrar que vivi para contar sobre aquele tempo, testemunhando que o Brasil de Juscelino foi um cenário de alegria, embalado pela no brilhante celofane da Esperança.

As lembranças afloram na minha cabeça: exercitando a cidadania, dei o meu primeiro voto a Juscelino, e não somente votei, mas conferi-lhe a minha admiração. Recordo o sorriso que dominava o semblante dos brasileiros, um sorriso de confiança no futuro, que infelizmente nunca chegou.

Deixou, porém, a saudade, após se abater sobre o Brasil misteriosamente uma sinistra realidade social, política e econômica. De lá para cá, sofremos a liberdade foi sufocada na ditadura militar, que se seguiu à impostura da chamada redemocratização e depois da revoltante temporada da corrupção lulopetista.

Para culminar as pragas, veio eleição do capitão Bolsonaro e as traições de suas promessas eleitorais, com as trapaças típicas do Centrão.

Parece-nos difícil escapar desse inferno astral, encerrados que estamos no triângulo diabólico da herança ditatorial, da roubalheira do PT e da mitomania bolsonarista porque ficamos na dependência de um ritual misterioso que serve de toga jurídica para os “garantistas” livrarem seus bandidos de estimação.

Sob a ameaça de volta ao reinado da corrupção lulopetista ou da fome que ameaça milhões de brasileiros pela incompetência bolsonarista, clareia no horizonte político o esperançoso brilho de terceira via eleitoral que nos livrará da polarização extremista.

Teremos a oportunidade ímpar de nos livrar do degenerado esquerdismo de um, e o descrédito do outro; escapar do retorno ao lulopetismo para escapar da corrupção e da política necrófila bolsonarista da fome. Como muitos outros patriotas, declaro apoio à luta de libertação do maldito maquinismo populista.

 

FAMÍLIA

MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.com.br)

“A humanidade transformou-se em uma grande família, tanto que não podemos garantir a nossa própria prosperidade se não garantirmos a prosperidade de todos”  (Bertrand Russell)

Quem vem do tempo em que o Twitter se iniciou com os 140 toques, puxando pela inteligência para sintetizar um pensamento e criar abreviaturas, assistiu com certa tristeza a invasão da rede nas últimas eleições por robôs controlados remotamente e, o que é pior, pelos politiqueiros que xerocam palavras-de-ordem baixadas pelos porões do poder.

Estes últimos, agitadores profissionais, que elogiam espirros e aplaudem as flatulências dos heróis que cultuam, podem ser qualificados sociologicamente como convictos e fanáticos. Os convictos adotam “ideologias” e “crenças” por espírito de imitação, suprimindo de si para si, qualquer sombra de dúvidas na “verdade” que constroem.

Os fanáticos assumem a defesa de tudo que venha “de cima”, fazendo disso uma questão de princípio. Não cultuam apenas Bolsonaro, como as massas alemãs que seguiram cegamente Hitler, mas têm anotado os nomes e datas de aniversário das ex e atual mulher dele, dos filhos e dos puxa-sacos acompanhantes de viagens turísticas.

Ambas figuras medíocres, convictos e fanáticos, têm uma grande participação nas redes sociais, sempre a postos para retuitar fluxos e refluxos das fake news chapas-brancas.

Transformam-se em comandos avançados da mentira nesta Era da Mitomania Bolsonarista. Sentinelas da moralidade hipócrita, repetem as trapaças ideológicas tiradas da mochila do capitão Bolsonaro. Uma delas, mais ridícula do que simplesmente uma fraude, é a defesa que ele faz da família.

Vê-se na realidade que o Capitão é tão apegado à família que já constituiu três, e quando trata de relações pessoais e alianças políticas, ilustra-as como namoro, noivado e casamento….  Movimenta-se agora, por exemplo, para o casório eleitoral com Waldemar da Costa Neto, passando a usar a aliança do Mensalão com a Rachadinha.

Como demagógica questão de princípio, a família é uma escora político-religiosa de Bolsonaro que vem contaminada de falsidade. Não passa de uma camisa verde, com o sigma, para os herdeiros do fascismo tupiniquim, galináceos que cocoricam o lema integralista “Deus, Pátria e Família”.

Trata-se, portanto, de um balão de ensaio para se contrapor à doutrinação comunista que Trotsky defendeu, a substituição da família tradicional pelas creches, internatos e estabelecimentos análogos para asilar crianças.

Dá para imaginar a burocracia estatal substituindo o convívio familiar? Parece-me tão falso como criar a fantasia da família encaramujada na propaganda governamental e numa religião ministrada por agentes políticos.

Como verbete dicionarizado, “Família” é um substantivo feminino de etimologia latina (familia, -ae), significando à época pessoas que viviam sob o mesmo teto, inclusive escravos e servidores. Modernamente, é o conjunto formado pelos pais e pelos filhos, ampliado para os parentes do casal.

Do mais puro idealismo à mais terríveis abominações, a família, como o sexo, é um imperativo da natureza. Quando o homem se elevou acima dos outros animais, nasceu o sentimento do amor, a atração instintiva da procriação; então constituiu a família para cumprir as funções biológicas e fortalecer uma economia de subsistência. E assim foi, tanto no patriarcado como no matriarcado….

Não é dessa maneira, evidentemente, que veem os convictos e fanáticos da direita extremista. Definem a família do jeito como “o seu mestre mandar”…. Poderiam até nos divertir em situações de normalidade, mas tornam-se criminosos acumpliciando-se com a corrupção, defendendo (ou ignorando) as rachadinhas da família Bolsonaro. Pior ainda: alimentam-se naquele prato sem digerir, para depois vomitar o negacionismo, a patologia obsessiva do Capitão, responsável por mais de meio milhão de mortes.

A preservação da família para os negativistas visa somente atingir um fim: enganar os desavisados. Ainda bem que Lincoln nos deixou um alerta: “Pode-se enganar a todos por algum tempo; pode-se enganar alguns por todo o tempo; mas não se pode enganar a todos todo o tempo”.

A LÍNGUA

MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.com.br)

“A degeneração de um povo, de uma nação ou raça, começa pelo desvirtuamento da própria língua” (Rui Barbosa)

O poeta Olavo Bilac, com sadio ufanismo, escreveu que “a Pátria não é a raça, não é o meio, não é o conjunto dos aparelhos econômicos e políticos: é o idioma criado ou herdado pelo povo. ”

As lições que recebemos dos nossos mestres nos ensinam a amar o nosso idioma que o grande poeta e compositor Noel Rosa cantou no seu belo samba “Não tem tradução”:  “Tudo aquilo que o malandro pronuncia/ Com voz macia, é brasileiro, já passou de português…”. E com isto, o professor gaúcho José Carlos Bortoloti criou o neologismo “Brasilês”.

Alguém já disse (e eu m’esqueci quem, quando e onde…) que a fisiologia humana nos deu a voz para que possamos com a língua dizer coisas amáveis a nossos amigos e duras verdades a nossos inimigos”….

Os povos antigos sabiam disto. No antigo Egito os embalsamadores de cadáveres seguiam instruções do Livro dos Mortos para deixar as múmias de boca aberta para falarem no julgamento de Osíris; e os padres jesuítas no século XVI ficaram curiosos para saber porque os guaranis punham seixos nas bocas dos seus defuntos, e ouviram algo semelhante.

Um antiquíssimo ditado reza que a voz do povo é a voz de Deus, de onde estudiosos do idioma concluíram que a linguagem coloquial é a mãe da linguagem clássica, expondo que a sintaxe é uma questão de uso, não de princípios. O grande poeta Manuel Bandeira confessou: “Nunca fui um antiacadêmico. O problema é que eu gostava de tomar minhas licenças com a língua…”.

Concordamos, dessa maneira, que todos escorregos são perdoados, contanto sejam escritos corretamente, estabelecendo que escrever bem é escrever claro, mas não necessariamente certo.

Ocorre, porém, que devemos evitar ao máximo permitir que a língua ultrapasse o pensamento, como aconselhava o poeta Tchecov, porque extrapolar a ideia sobre a exposição termina por criar mal-entendidos; também não se deve revoltar-se pela circunstância de usar palavras estrangeiras, hoje quase obrigatórias em função da tecnologia de ponta.

Tempos atrás escrevi um artigo, onde – recordando os meus tempos de repórter setorista na Câmara dos Deputados e no Senado Federal – lamentei que “infelizmente desapareceu na política brasileira o brilho da expressão elegante que gostávamos”; sobrando apenas a demagogia e a mentira.

Relembrando a eloquência do grande orador paraibano José Américo guardei a passagem dele, candidato a senador (acho que em 1970), discursando num comício em Cajazeiras – a cidade que é a última fronteira ao Norte do Estado – iniciou a sua fala em voz baixa, quase inaudível, quando uma pessoa na multidão gritou: – “Fale mais alto, doutor! ”…. E Zé Américo aumentou o tom de voz: – “Estou falando baixo para quê no Ceará não saibam que estou mendigando votos na Paraíba”.

É aí que a gente encontra “a magia da linguagem” que Edward Bulwer-Lytton classifica como “o mais perigoso dos encantos”, e por isto que levo a sério a observação do autor de “1984”, George Orwell, ao dizer que “a linguagem política dissimula para fazer as mentiras soarem verdadeiras e para dar aparência consistente ao puro vento”; uma verdade que temos assistido na Era da Mediocridade que o Brasil atravessa dos discursos políticos chinfrins, muitas vezes sem nexo.

A polaridade da dissimulação mostra que apesar da habilidade adquirida em anos de pelegagem, Lula da Silva confessou, de própria voz, que alterava números e estatísticas em proveito próprio; e o atual Presidente, visivelmente menos preparado do que o Pelegão, usa e abusa de mentiras, sendo reconhecido mundialmente pela mitomania.

Ambos, Bolsonaro e Lula, influenciam muitas pessoas com suas inverdades e trapaças, convergindo na ficção matemática de que as paralelas se tocam no infinito…. Mostram assim, na prática, que um só existe politicamente em função do outro.