Arquivo do mês: junho 2022

REVISÃO

MIRANDA SÁ (E-mail: mirandasa@uol.com.br)

“Precisamos promover a coragem onde há medo, promover o acordo onde existe conflito, incentivar a esperança onde há desespero” (Nelson Mandela)

Curiosamente nascido na Índia colonial inglesa em 1903, George Orwell é considerado um dos maiores escritores europeus do século XX, e segundo a crítica, o melhor cronista da cultura inglesa.

É difícil escolher o mais importante dos seus livros, considerando como clássicos, “Dias na Birmânia”, “Moinhos de Vento”, “A Filha do Reverendo” e os mais populares entre eles, “A Revolução dos Bichos” e “1984”.

Não é por acaso que os dois últimos se tornaram best sellers mundiais. Tratam-se de discursos anti-totalitários tão contundentes que foram considerados responsáveis intelectuais pela desconstrução biográfica de Stálin e o desmoronamento do estado policial que dominava a União Soviética.

O “1984” é uma novela que tem como cenário um império ditatorial sempre em guerra contra outros países usando a propaganda de exaltação patriótica para controlar os cidadãos em cada gesto, cada fala, e, por artifício tecnológico, vigiando-o em qualquer lugar onde se encontre.

O pior é a concentração do poder nas mãos de um ditador cuja administração partidária repressiva mantém um “Ministério da Verdade” com objetivo de criar uma realidade paralela, pela revisão histórica, censura literária e jornalística, falsificação de documentos e fraudes relacionadas com o passado antes do partido tomar o poder.

Através de um mecanismo criptográfico, o Ministério da Verdade mantém uma “novilíngua”, certa terminologia partidária e governamental que distorce o significado semântico do noticiário sobre a guerra, reverte informações estatísticas da economia e produz pesquisas de opinião enganosas para o grande público.

Enfim, fazendo-se uma síntese curta e grossa, resume-se: a função do Ministério da Verdade é mentir produzindo oficialmente o que chamamos de fake news.

Com esse conhecimento, vemos que não é só na ficção orweliana que assistimos tais práticas revisionistas; a História da Civilização está cheia de capítulos sórdidos de adulterações dos fatos e de perfis pessoais.

Garimpando alguns exemplos, temos a imolação do Grão-Mestre dos Templários, Jacques De Molay, acusado por falsas testemunhas junto com seus companheiros, de invocar o demônio e realizar “missas negras”. Esconderam as lutas travadas por eles para libertar os lugares santos da Palestina e a divulgação mundial da cruz como símbolo do cristianismo.

Os ardis foram tramados e executados somente para satisfazer a ambição do rei Felipe de França e a insanidade obscena do papa Clemente 5º. Observe-se que esta fraude se estendeu por centenas de anos pela perseguição à Maçonaria, obrigando os seus seguidores atuarem na clandestinidade.

Não causa perplexidade encontrarmos ainda hoje defensores de Adolf Hitler cuja loucura levou à morte cerca de 75 milhões de pessoas somente pelo fato de serem ciganos, eslavos, homossexuais e judeus. Para os neonazistas, o mundo seria feliz sob o domínio dos brutais e agressivos agentes das SS, defendendo por isto ditaduras e torturas.

Sobre revisões típicas do Ministério da Verdade, chega-nos às mãos cópias xerocadas de atividades sócio-políticas no Brasil que parecem extraídas do livro de Orwell. Vê-se apagarem a passagem corrompida, corrupta e corruptora de Lula da Silva e do seu partido, o PT, no governo federal.

Engenhosos embustes para suprimir o passado saem das oficinas dos poderes republicanos e em especial no Executivo, funcionando nos porões do Palácio do Planalto em obediência à distorcida e subversiva ideologia do capitão Bolsonaro. Vê-se agora o diversionismo manobrado para defenderem a corrupção do pastoril no Ministério da Educação.

Com um pouco de bom senso e critério, enxerga-se o assalto ao Erário na mais perfeita ação corrupta e corruptora dos tempos lulopetistas; e fica claro o envolvimento do ex-ministro pastor Milton Ribeiro, confessor da Primeira Dama.

Não se exige sequer uma ativa vigilância para se ver o Brasil espremido entre a nojenta polarização dos extremismos populistas “de direita” e “de esquerda”, defendidos por comissários civis e fardados falseando a História e alterando as biografias.

E no mundo fantástico do revisionismo polarizado, salvam-se o Pelegão condenado por corrupção e lavagem de dinheiro e o Capitão afastado do Exército por indisciplina, insanidade mental e subversão.

Sem revisões, acredito no surgimento de um fato novo que intervenha nas eleições e facilite o surgimento de um nome que represente a 3ª Via.

SOLDADOS

MIRANDA SÁ (E-mail: mirandasa@uol.com.br)

“O Exército deveria ser o grande mudo, pronto ao sacrifício pelo bem da Nação, sem, contudo, intervir em mesquinhas questões de politicagem” (Marechal Rondon)

Os atributos do soldado são muito reconhecidos nas guerras. Lamentados pela morte ou ovacionados nos desfiles, são heróis e patriotas; mas a consagração em tempo de paz é rara; e. no Brasil, muito poucas.

Um soldado, pelo espírito desprovido de individualismo, pelo poder de decisão e da audácia para enfrentar o desconhecido foi o marechal Rondon. Nascido em 1865 no atual Município Santo Antônio do Leverger, Mato Grosso, foi batizado como Cândido Mariano da Silva Rondon, e formou-se engenheiro militar na Escola Militar da Praia Vermelha, Rio de Janeiro.

Segundo um dos seus biógrafos, Rondon e os expedicionários civis e militares que o acompanharam percorreram a pé, em lombos de mulas ou em frágeis canoas, cerca de 77.000 quilômetros (quase duas voltas em torno da Terra), desbravando os sertões brasileiros.

Nestas expedições, implantou o primeiro sistema de telecomunicações no país, conseguindo integrar dois “brasis” que não se falavam: o “Brasil do litoral” com o “Brasil do interior”.

A minha geração familiar (só restamos três) aprendeu a admirar e respeitar o Marechal pela transmissão de histórias sobre ele contadas pelo meu avô, Henrique Miranda Sá, falando das suas incursões por regiões isoladas do Centro-Oeste e Norte. Meu avô de quem mantenho o nome, acompanhou Rondon, trabalhando na construção e instalação da rede de telégrafos do País.

É de lembrar que o Marechal foi responsável pela implantação da primeira linha telegráfica, idealizador do Parque Nacional do Xingu e do Serviço de Proteção aos Índios, SPI, do qual foi diretor.

Além de perseguir o progresso da Nação, o marechal Rondon viu como estratégica a presença dos índios no Brasil Central e na Amazônia pela sua utilidade como guardiães da floreta que protegiam contra incursões ilegais de garimpeiros, madeireiros e posseiros denunciando ilegalidades aos órgãos competentes.

Para ele, uma floresta habitada é uma floresta preservada, razão por que se deveria pacificar os índios, respeitando os seus costumes e tradições, e pela sua formação positivista, os contatos iniciais com tribos isoladas deveriam ser cuidadosos e amistosos obedecendo a máxima: – “Morrer, se necessário for matar nunca! ”.

Esta exigência da floresta ser habitada por índios e com aqueles que com eles convivam fraternalmente respeitando sua cultura e modo de vida deveria ser estimulada; nunca, jamais, por garimpeiros, madeireiros, posseiros e traficantes delinquentes, que são abonados por ministros do Governo Bolsonaro.

Esta invasão de bandidos resultou no brutal assassinato do sertanista brasileiro Bruno Araújo Pereira e do jornalista inglês Dom Phillips, cometido por capangas certos da impunidade que vem ocorrendo há anos na Amazônia, agora abandonada delituosa e perversamente para deixar a boiada passar como quer o Presidente.

Com vistas nesta criminosa situação, o oficialato militar que estudou a vida do Marechal Rondon nos bancos escolares, deve se envergonhar do que vem ocorrendo na atual política governamental contra o meio ambiente, e na abertura dos territórios indígenas “para a boiada passar”.

O soldado brasileiro que sempre manteve uma posição patriótica em defesa da integridade territorial do Brasil, não pode seguir agora a ideologia enfermiça que vem sendo implantada pelo capitão Bolsonaro para desagregar o País.

Seguindo o exemplo do marechal Rondon devem defender a vida e não a aventura egocêntrica de um renegado do Exército por subversão e insanidade. Ele está lembrado numa passagem do livro ”César e Cleópatra” de Bernard Shaw; este notável escritor e filósofo irlandês pôs na boca da estátua do deus Ra as palavras: “O caminho do soldado é o caminho da morte; mas o soldado que não se desvia dele em defesa da vida é um imbecil”.

É um preceito que não deve ser esquecido. Os quarteis que barraram a tentativa do golpe de 7 de setembro são ocupados por soldados herdeiros da glória de Rondon e certamente defenderão a vida contra a insânia assassina dos inimigos do Meio Ambiente.

 

LUCIDEZ

MIRANDA SÁ (E-mail: mirandasa@uol.com.br)

“A claridade é uma justa repartição de sombras e de luz” (Goethe)

No meu último artigo, “Dialética”, deixei de lado o silêncio sobre as críticas que recebo, e numa delas – faz algum tempo – fui acusado de esquecer a minha laicidade político-religiosa para defender o Papa Francisco.

Não nego que vejo como positiva para a Igreja Católica e para os autênticos cristãos, a presença do cardeal presbítero Jorge Mario Bergoglio, o argentino que atualmente se senta no trono de São Pedro.

Esta posição deve-se à percepção de que Francisco levou para Roma uma visão nova, arejada, experiente e, sobretudo, corajosa. Não é por acaso que é um Jesuíta; e assim sendo levou-me a uma narrativa que ouvi do padre José Maria, meu primo já falecido.

Esse meu parente sacerdote, cristão convicto de vocação eclesiástica, abandonou a batina para se casar, forçado pelas cretinices herdadas de estúpidos dogmas e das imposições imperiais do imperador Constantino que nada têm a ver com Jesus Cristo.

A história é a seguinte: – “Reunidos certa noite quatro religiosos, um beneditino, um capuchinho, um dominicano e um jesuíta liam o breviário. Uma pane na energia apagou a lâmpada. Daí, falou o capuchinho: – Continuo o breviário no escuro, pois conheço-o de cor.

“O beneditino então sugeriu que se abandonasse o breviário e conversassem sobre a origem da Criação pelas palavras de Deus, “Faça-se a luz”. Pegando a palavra, o dominicano discursou sobre a vontade de Deus na origem de tudo.

“O jesuíta havia se afastado, e mal se fez silêncio na interlocução dos colegas a iluminação voltou. Ele fora trocar o fusível e iluminou o ambiente…”.

A praticidade dos membros da Companhia de Jesus é um dos motivos que me faz dar crédito ao Pontífice na condução dos destinos da Igreja Católica. Embora não seja católico e, em matéria de religião, um agnóstico, acato e respeito a fé dos cristãos, como admiro o humanismo dos budistas e o fervor dos islamitas.

Pela independência em torno das ideias que insisto em manter, sinto-me liberto dos preconceitos políticos, religiosos e sociais; e quando da coroação do Papa Francisco estava de passagem por Buenos Aires, cidade que me fascina e reforça a minha admiração pelos argentinos.

Estava na capital platina quando a fumaça branca anunciou a eleição do novo papa. Pensei que encontraria à venda fotos e botons de Francisco para levar para amigos católicos no Brasil, mas procurando-os em Buenos Aires nada achei.

Lá em Buenos Aires, tenho um amigo comunista que é dono de uma banca de jornal na calle Florida, a quem perguntei qual a razão desse desprezo por um conterrâneo, no que ele, no seu sectarismo ideológico, foi curto e grosso dizendo-me –: “Precisamos de tempo para apreciá-lo por que nunca se sabe de que lado ele está…”

A desconfiança de fazer prognósticos sobre o papel de um indivíduo assumindo o poder, me parece correta. Fi-lo com relação ao capitão Bolsonaro; depois, revoltado com a sua traição às promessas de campanha, com a decepção que cresceu pelas suas mentiras cínicas em defesa dos filhos e contra a Lava Jato, tornei-me opositor um dia após Sérgio Moro sair do Ministério.

Segui o caminho de quem é patriota e combatente contra a corrupção; é impossível que se aceite a aliança silenciosa do bolsonarismo com o lulopetismo, pela impunidade dos corruptos, igualando-os e juntando-os na fotografia em grande angular do extremismo populista e delinquente.

Segundo Tolstoi a lucidez deve chegar ao limiar da alma; por isso estou à espera de alguém, não importa cor, sexo, religião ou partido, que se candidate a trocar os fusíveis, e que se faça a luz para a Nação Brasileira.

DIALÉTICA

MIRANDA SÁ (E-mail: mirandasa@uol.com.br)

“Não se pode mergulhar duas vezes no mesmo rio; ambos não serão os mesmos na segunda vez” (Heráclito)

A Dialética é o processo analítico do pensamento filosófico, desenvolvido desde a antiguidade clássica, velha Grécia de Platão, Aristóteles e Heráclito de Éfeso (nosso epigrafado), um dos principais filósofos pré-socráticos.

Heráclito precedeu os filósofos modernos com a enunciação da pessoa e do rio que se tornam outros na segunda entrada, porque a correnteza leva as primeiras águas e a biologia orgânica sofre mutações em fração de segundo.

Mais tarde, Friedrich Hegel demonstrou a Dialética como método analítico, teoria que foi apropriada por Karl Marx, para aplicar para explicar o movimento contraditório da História da Humanidade como a história da luta de classes.

Enquanto Marx usou a Dialética no materialismo histórico, Hegel com isenção ideológica mostrou que o método é uma razão que se autogera, auto diferencia e auto particulariza. Embora com abordagem diferente, é válido na análise dos fatos econômicos, políticos e sociais.

A base fundamental da análise dialética é a busca da contradição presente na Natureza e na realidade da vida excluindo a visão unitária na condição natural, deduzindo-a como uma unidade diferenciada; apresenta oposições íntimas como afirmação (tese) e a negação (antítese), que confrontadas, resultam numa conclusão (síntese).

A aplicação básica desse processo obedece à sistemática da afirmação e da negação, uma contradição semelhante ao milenar princípio da filosofia chinesa em que yin e yang são duas energias opostas e complementares.

Do mesmo jeito como o taoísmo descreve duas forças fundamentais opostas e complementares, a dialética vê na contradição o resultado sistemático de um fato. É assim que faço nas minhas observações da política, tentando encontrar o efeito final do raciocínio.

Estas divagações ficariam melhor num estudo acadêmico, mas estou fugindo do meu contumaz estilo para enfrentar críticas em postagens a mim dirigidas.

Uma delas foi a divulgação de um artigo de Madeleine Lacsko que considerei “uma perfeita contradição dialética”, pela colocação no caso revoltante da ação da Polícia Rodoviária Federal em Sergipe, levando à morte um cidadão numa improvisada câmara de gás.

A articulista reviu a primeira nota da PRF classificando o episódio “como uma fatalidade desvinculada da ação policial” e o capitão Bolsonaro, defensor da violência, classificou o caso criminoso como “exageros e pressão da mídia”. Analisando-os, Madeleine concluiu que essas posições não defendem a polícia, ao contrário, abate e aniquila a força policial.

Trata-se de uma conclusão dialética, como ocorre com a outra postagem feita sobre o alerta da Rússia protestando contra o envio pelos Estados Unidos de foguetes avançados para a Ucrânia, jogando mais lenha na fogueira. Intitulei a nota como “Provocação inconsequente de Biden” o que valeu uma crítica.

Por fim, retuitei uma mensagem de @MariaLCAb em que ela diz que “o bolsonarismo é um lulismo de direita. São siameses. Defendem com unhas e dentes as tramoias dos do lado deles”. Na minha análise, a contradição entre os populismos auto-assumidos como “de direita” e “de esquerda” são apenas investidas divergentes para conquistar votos e tomar o poder.

Diante disto, um povo culto e patriota não deve aceitar sem analisar e refletir o que nos reserva o futuro do País nas mãos de um ou do outro. A polarização eleitoral estapafúrdia de Bolsonaro e Lula é antipovo e antinacional; pelo estudo dialético, a semelhança avessa dessas forças nos leva pelo raciocínio lógico à síntese original: a Terceira Via para derrotá-las.