Arquivo do mês: julho 2019

PRECONCEITO

MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.com.br)

“Nunca é tarde para abrirmos mão dos nossos preconceitos” (Henry Thoreau)

A História registra grandes preconceitos que, como uma vitória da consciência humana, foram derrubados ao longo do tempo. Há poucos registros sobre isto, e um deles garimpei nas minhas pesquisas: já no estágio civilizatório ocidental, até o século 17 era proibida a subida de mulheres num navio e até pouco tempo era voz corrente entre os marinheiros que elas davam azar entrando num submarino…

O preconceito foi quebrado num fato que marcou o início da colonização dos Estados Unidos e até hoje é motivo de orgulho para os norte-americanos, a migração dos puritanos ingleses conhecidos como Os Peregrinos, que saíram da Inglaterra em 1620 no navio Mayflower com 25 tripulantes e 102 passageiros, incluindo famílias já formadas e recém-casados.

Em geral, os preconceituosos nem sabem mesmo porque o são. Li a história vivida pelo grande músico italiano, Arturo Toscanini, que ouvindo uma sinfonia de Beethoven gravada em disco, criticou a interpretação, sem saber que a execução era dele, gravada num dos seus concertos. Quando soube, reconheceu que o disco era seu…

O triste é que há preconceitos apoiados até pela Bíblia, cujo texto os católicos não podem pôr em dúvida, porque o Concílio de Trento, em 1546, proibiu que se pusesse em dúvida a inspiração divina do Livro. Nele, porém, está gravada a intolerância em Lucas, XIV, 23: “Se alguém não permanecer em mim, será lançado fora com a vara, e secará e enfeixá-lo-ão, e o lançarão no fogo, e arderá”.

Muitas pessoas se sentirão hoje tão perseguidas quanto a proibição da Marcha Gay em Havana pelo maravilhoso socialismo fidelista, ao tomar conhecimento do que está escrito no Deuteronômio (XXII): “Não haverá traje de homem na mulher, e não vestirá o homem com roupa de mulher”.

Se na religião encontramos isto, imagine como pululam preconceitos como larvas nas poças enlameadas da politicagem. Hitler mandou que se queimasse livros de judeus e comunistas notáveis, grandes cientistas, literatas e pensadores. Stálin, com mania de perseguição, mandou expulsar médicos judeus da Associação Médica da URSS. Depois, prendeu-os.

O narco-populismo da pelegagem que assomou ao poder na América Latina como reação aos regimes militares implantados durante a guerra fria, tentou se manter no poder baseando-se em preconceitos, que conseguiu em grande parte, porque muitos subsistem.

Fingindo combater o racismo, a vertente nacional do socialismo bolivariano importou dos Estados Unidos o abominável termo afrodescendente, como se os negros não fossem brasileiros como todos os que aqui nasceram ou se naturalizaram. É o racismo às avessas.

É do lulopetismo, também, o confronto religioso entre católicos e evangélicos, aliás muito aproveitado por políticos oportunistas dos dois lados. E o mais execrável é o feminismo xiita, um grupo diminuto que prega a aversão pelo homem seletivamente na sua atuação social, falando pretensiosamente em nome de todas as mulheres…

Parece precipitado falar, mas os agentes que usam os preconceitos para dividir a sociedade a fim de controla-la, estão infiltrados em todos os estamentos da vida pública, até nas sanduicherias dos fritadores de hambúrgueres…

Dicionarizada, a palavra Preconceito é um substantivo masculino formado pelo prefixo latino “pré” (anterioridade, antecedência) mais o substantivo “conceito” (comportamento, opinião, reputação). Trata-se de sentimento hostil e intolerância, com atitudes apressadas impostas pela formação ou o meio.

Geralmente ocorre contra indivíduos ou grupos de afiliação política, identidade de gênero, linguagem/língua, nacionalidade, raça/etnia, crença religiosa, profissão e até torcida esportiva.

O preconceito é algo que deve ser abolido com intensidade e urgência do mesmo modo como queremos varrer a corrupção, o fanatismo e a traição nacional de pessoas e partidos que pregam a secessão no Brasil.

 

 

 

ESPECIALISTAS

MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.com.br)

“Em questões mundiais qualquer um aqui pode saber tanto quanto os especialistas. ” (Noam Chomsky)

O jornalismo atual não exige muito dos profissionais de imprensa. Donos de jornal e seus executivos se preocupam mais com a aparência, esperteza e vivacidade dos comunicadores recrutados ao léo, e é por isto encontramos várias artimanhas nas notícias veiculadas.

No regime de exceção – com um censor presente nas redações – botava-se na seção de cartas as críticas que normalmente seriam censuradas. Hoje, porém em pleno Estado de Direito, com a liberdade de imprensa inegavelmente vigorando, não há razão para se inventar personagens fictícias, fingindo veracidade do texto.

Os repórteres falam de fonte que não quer se identificar, e os colunistas citam “um ministro” ou “um empresário”, ou “um parlamentar” anônimos; e, pior do que isto, são useiros e vezeiros em citar “um especialista” fantasma.

Esses “especialistas” que se multiplicam na chamada grande imprensa são invocados para falar de qualquer assunto; tal qual os animadores dos programas políticos da Globo News, com onisciência capaz de saber o que se passa na cabeça da Rainha da Inglaterra.

Tanto uns como outros me irritam profundamente, porque sou do tempo em que especialista detinha um doutorado em determinada área, com o conhecimento aprofundado de uma matéria; e não se escondiam. Encontrávamos entre eles, também autodidatas excepcionais, raros, porém autênticos conhecedores da antropologia, arqueologia, arte, astronomia, economia, farmacologia, física, química, etc.

Entre especialistas de verdade, tínhamos profissionais de artesanato, telefonia, telégrafo, música, ocupando espaços na administração pública ou nas empresas privadas.

O verbete “Especialista” dicionarizado é um substantivo de dois gêneros, indicando que ou quem se dedica a um ramo do saber ou sabe muito sobre determinada coisa na ciência ou nas artes; pessoa que conhece a fundo a maneira de criar e produzir objetos manufaturados. Diz-se também de quem tem habilidade ou prática em certa função.

São especialistas o montador de azulejos e o encanador na construção civil; mecânicos de manutenção de automóveis e aeronaves, enfermeiros e fisioterapeutas, médico perito no tratamento de certas doenças ou autópsias.

Até nos animais como os cães farejadores de narcóticos e burros, camelos, jumentos, lhamas e mulas usados em transportar cargas a longas distâncias temos especialistas. E, por falar em transportes, garimpei do escritor Pittigrilli numa das suas admiráveis crônicas, conta a história de quem foi forçado a tornar-se especialista:

“Um carteiro levou um telegrama que precisava de assinatura do recibo. O endereço, uma Sinagoga, tinha um porteiro analfabeto que precisou chamar Rabino para assiná-lo. Por este incidente, o reverendo demitiu o empregado por falta de instrução.

“Desempregado, o ex-porteiro foi à estação ferroviária e tornou-se carregador de malas. Decorou os horários e com os ganhos, comprou um carrinho para o serviço e recrutou outros colaboradores cooperativados.

“Pelo êxito nos negócios fez empréstimo bancário, constituiu uma empresa e com o tempo, várias filiais. Ficou milionário e reverenciado.

Recebendo uma homenagem da Federação das Indústrias, o porta-voz da entidade exaltou-o como um vencedor mesmo sem instrução, e enfatizou: ‘Ele é um especialista que seria muito maior tivesse estudado! …”.

“O homenageado agradeceu a peroração e respondeu humildemente: – ‘Especializei-me porque se eu tivesse estudado estaria esperando a aposentadoria como porteiro de sinagoga! ”

SOPA DE PEDRA

MIRANDA SÁ (E-mail: mirandasa@uol.com.br)

“Hoje em dia, muitos estão dispostos a meter sua colher, mas poucos estão dispostos a ajudar a fazer a sopa.” (Ditado popular)

Está no folclore brasileiro a história de um mendigo que acendendo uma fogueira de gravetos e madeira colhida numa obra perto, improvisou uma trempe, e pôs sobre ela uma lata de dez quilos com água a ferver. Esta encenação juntou vizinhos curiosos no entorno.

– “Estou fazendo uma sopa de pedra”, disse, mostrando uma lasca de granito, jogando-a dentro da lata; pediu a uma senhora que olhava seu movimento, um pouco de sal, que ela atendeu indo à casa buscar o condimento. A outra pessoa pediu uma cebola; e depois, aos demais, suplicou um tomate, um pimentão, uma batata, uma cenoura e restos do jantar da noite anterior…

Não demorou muito tempo que o cheiro atraente trasladasse ao redor e então ele se serviu oferecendo ao redor a sua refeição; quem experimentou, achou deliciosa a “sopa de pedra”…

Certa vez li a curiosa frase de Voltaire, “O livro melhor escrito é a receita de uma sopa”, e resolvi fazer também uma sopa de pedra aproveitando um seixo que colhi no leito do Rio Tietê quando nas suas margens haviam clubes de natação e remo, e as pessoas nadavam e mergulhavam.

Tempero a minha sopa inicialmente com a peroração de Marco Antônio diante do cadáver de César, segundo Shakespeare: “O mal que os homens fazem sobrevive depois deles. O bem é quase sempre enterrado com seus ossos. ”

Boto pitadas de alegria da época em que Juscelino Kubitschek foi presidente, e os brasileiros exultavam com o avanço do Brasil 50 anos em cinco; mas modero o paladar com o vinagre dos anos de supressão da liberdade no regime de exceção.

Evito estragar o apetite com a chamada redemocratização, o cadáver de Tancredo Neves, a demagogia de Ulisses Guimarães e a gordurosa Constituição de 88… não quero juntar a triste memória de Fernando Collor e as folhas secas da corrupção, usadas depois por Fernando Henrique ao comprar a reeleição e criar o Mensalão.

O ingrediente depravado da Odebrecht não estragará a minha sopa, usado indigestamente nos 16 anos de governos lulopetistas, quando oficialmente foi instituída a corrupção no Brasil e as propinas tornaram-se produto de exportação para a América Latina.

Não porei um pingo sequer do óleo queimado da Petrobras, tomada pelo assalto criminoso da gangue do Partido dos Trabalhadores, quadrilha especializada em assaltos ao Erário.

Não misturo porções indigestas das ameaças que vêm com a medida de Dias Toffoli para salvar seus corruptos de estimação ou de conchavo; livrando-me delas com o apetitoso odor de ervas finas e folhas de couve que lembram, pela cor, as fardas dos generais setentões que intervêm na vida nacional, mais patrioticamente do que os defensores de uma intervenção militar.

Recuso a salsa da impunidade, porque neste alimento não se admite a presença de corruptos de estimação, preferindo o sabor da Lava Jato, com a pimenta de cheiro da PF, MP e Justiça Federal; e não acrescento a raiz amarga da direita exibicionista de última hora.

Para enriquecer o caldo, acrescentarei a soja que iria num graneleiro levar comida para os iranianos, mas Trump proibiu de abastecer o navio, intrometendo-se nos nossos negócios. Alguns esqueceram, mas relembro o princípio “O Brasil acima de tudo”…

Por fim, para compensar qualquer mistura inadequada, acrescento três colheres de recados para os inimigos das reformas e do progresso, com um discurso de Cícero, “Até quando abusarás da nossa paciência? ”.

O JUIZ

O JUIZ

MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.com.br)

“Alguns juízes são absolutamente incorruptíveis; ninguém consegue induzi-los a fazer justiça” (Brecht)

Impressionei-me ao encontrar numa coletânea de frases judaicas um pensamento atualíssimo: “Infeliz da geração cujos juízes merecem ser julgados”. Posso até estar errado, mas comprovo isto neste triste momento da História do Brasil.

O quipá (aquele solidéu que os judeus usam na Sinagoga) cai direitinho na cabeça do presidente do STF, ministro Dias Toffoli, depois da sentença em defesa da impunidade, impedindo que os dados do BC, Coaf e Receita sejam usados na investigação de criminosos, principalmente os políticos suspeitos de corrupção.

É indiscutível que temos uma maioria de juízes da melhor qualidade enfrentando poderosos delinquentes nos círculos empresariais e políticos. Por serem bons, nivelam os políticos e empresários corruptos aos criminosos comuns; mas quando isto ocorre é “um deus nos acuda”…

Ao ocupar o poder, muitos políticos acreditam flutuar acima do bem e do mal, e o maior exemplo disto está nas declarações do presidiário Lula da Silva sobre os togados do STF. Referindo-se aos julgamentos a que respondia por crimes contra o Erário, o Pelegão disse em mensagem ao seu fantoche Dilma, então ocupando a presidência da República: – ‘Nós temos uma Suprema Corte totalmente acovardada’.

Isto, porque o plenário do STF mostra-se disposto a fazer Justiça. É repugnante alguém querer servir-se da magistratura para fraudar a Lei, torcendo por um julgamento obeso de falsas interpretações, de charlatanismo e cobranças pela dívida das nomeações, cobrança a que Platão se refere como: – “O juiz não é nomeado para fazer favores com a Justiça, mas para julgar segundo as leis”.

Pensando como Lula, há quem veja alguns gabinetes dos tribunais superiores como tendas de comércio, tendo a Justiça como a “dona” do negócio, com a balança nas mãos, pronta para fraudar no peso…

Não é bem assim. O nosso Supremo, não é uma loja; vê-se, entretanto, três ou quatro ativistas togados, com dezenas de assessores para suprir deficiências, fazendo a Casa parecer um comitê eleitoral para atender interesses partidários. É o que assistimos com a atuação desses “alguns” a quem batizei de “O Bando dos Quatro”.

São realmente quatro ministros togados contumazes em proferir sentenças com interpretação exclusivamente política, principalmente quando cabe a qualquer deles uma decisão monocrática… Sobre esta situação temos um alerta do pensador François Guizot que disse: – “Quando a Política adentra no recinto dos tribunais, a Justiça sai por outra porta”.

Dicionarizada, a palavra Juiz é um substantivo masculino de origem latina (judice (la)), significando “aquele que tem o poder de julgar”. No Direito, é o magistrado a quem a lei atribui a função de julgar, assumindo a autoridade para censurar ações, admoestar, castigar atos que entende serem maus, decidir desavenças entre pessoas.

Francisco de Quevedo, o notável escritor espanhol do século 17 – época conhecida como o “Século de Ouro da Literatura Espanhola” – deixou-nos uma lição memorável ao dizer que “Causam menos danos cem delinquentes do que um mau juiz”…

Juízes não concursados, nomeados politicamente, ocupam gabinetes luxuosos e belos; pisam em tapetes macios e sentam-se em cadeiras estofadas com legítimo couro de bezerro ao custo de um ano de salário de um trabalhador. Apesar de tudo isto, levam até 10 anos para apreciar um caso e 24 horas quando se trata do seu interesse…

Em comparação, apreciamos os magistrados de 1ª instância, que ralam para fazer um concurso, iniciam a carreira como juízes substitutos em comarcas do interior e esperam indicação por antiguidade ou mérito para chegar a desembargador na 2ª instância.

Não é por acaso que o povo brasileiro vai às ruas e praças em apoio ao ministro Sérgio Moro, o paradigma do julgador estudioso e independente, que por levar o poderoso ex-presidente Lula da Silva à cadeia por corrupção e lavagem de dinheiro sofre insidiosos ataques dos cúmplices da roubalheira institucionalizada nos governos petistas.

Os corruptos olham odientos para o Ministro, refletindo as próprias personalidades criminosas; ao contrário dessa perfídia, felizmente, 83% dos brasileiros patriotas vêm em Moro um modelo para os jovens juízes.

 

Gregório de Matos

Triste Bahia

Triste Bahia! Ó quão dessemelhante
Estás e estou do nosso antigo estado!
Pobre te vejo a ti, tu a mi empenhado,
Rica te vi eu já, tu a mi abundante.

A ti trocou-te a máquina mercante,
Que em tua larga barra tem entrado,
A mim foi-me trocando, e tem trocado,
Tanto negócio e tanto negociante.

Deste em dar tanto açúcar excelente
Pelas drogas inúteis, que abelhuda
Simples aceitas do sagaz Brichote.

Oh se quisera Deus que de repente
Um dia amanheceras tão sisuda
Que fora de algodão o teu capote!

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Castro Alves

O “Adeus” de Teresa

A vez primeira que eu fitei Teresa,
Como as plantas que arrasta a correnteza,
A valsa nos levou nos giros seus
E amamos juntos E depois na sala
“Adeus” eu disse-lhe a tremer co’a fala

E ela, corando, murmurou-me: “adeus.”

Uma noite entreabriu-se um reposteiro. . .
E da alcova saía um cavaleiro
Inda beijando uma mulher sem véus
Era eu Era a pálida Teresa!
“Adeus” lhe disse conservando-a presa

E ela entre beijos murmurou-me: “adeus!”

Passaram tempos sec’los de delírio
Prazeres divinais gozos do Empíreo
… Mas um dia volvi aos lares meus.
Partindo eu disse – “Voltarei! descansa!. . . ”
Ela, chorando mais que uma criança,

Ela em soluços murmurou-me: “adeus!”

Quando voltei era o palácio em festa!
E a voz d’Ela e de um homem lá na orquestra
Preenchiam de amor o azul dos céus.
Entrei! Ela me olhou branca surpresa!
Foi a última vez que eu vi Teresa!

E ela arquejando murmurou-me: “adeus!”

Cecília Meireles

Canção

Não te fies do tempo nem da eternidade,
que as nuvens me puxam pelos vestidos
que os ventos me arrastam contra o meu desejo!
Apressa-te, amor, que amanhã eu morro,
que amanhã morro e não te vejo!
Não demores tão longe, em lugar tão secreto,
nácar de silêncio que o mar comprime,
o lábio, limite do instante absoluto!
Apressa-te, amor, que amanhã eu morro,
que amanhã eu morro e não te escuto!
Aparece-me agora, que ainda reconheço
a anêmona aberta na tua face
e em redor dos muros o vento inimigo…
Apressa-te, amor, que amanhã eu morro,
que amanhã eu morro e não te digo…

Hilda Hilst

Poemas aos homens do nosso tempo

 

Enquanto faço o verso, tu decerto vives.
Trabalhas tua riqueza, e eu trabalho o sangue.
Dirás que sangue é o não teres teu ouro
E o poeta te diz: compra o teu tempo.

Contempla o teu viver que corre, escuta
O teu ouro de dentro. É outro o amarelo que te falo.
Enquanto faço o verso, tu que não me lês
Sorris, se do meu verso ardente alguém te fala.

O ser poeta te sabe a ornamento, desconversas:
“Meu precioso tempo não pode ser perdido com os poetas”.
Irmão do meu momento: quando eu morrer
Uma coisa infinita também morre. É difícil dizê-lo:
MORRE O AMOR DE UM POETA.

E isso é tanto, que o teu ouro não compra,
E tão raro, que o mínimo pedaço, de tão vasto
Não cabe no meu canto.

AMIGOS

MIRANDA SÁ (mirandasa@uol.com.br)

“Que importa o tempo? Há amigos de oito dias e indiferentes de oito anos.”   (Machado de Assis)

Fui educado dando valor à amizade; aprendi com meu pai radical nos seus conselhos, um dos quais se tornou, para mim, princípio de vida: – “Nunca se sente à mesa para comer, beber ou jogar, sem ser com amigos”. Sigo até hoje este ensinamento.

Para o povão, o cantor Roberto Carlos ressaltou o amigo na canção em homenagem ao seu parceiro Erasmo Carlos: “Você meu amigo de fé, meu irmão camarada/ A sua palavra de força, de fé e de carinho/ Me dá a certeza de que eu nunca estive sozinho”; e o mineiríssimo Milton Nascimento reforça esta ideia: “Amigo é coisa pra se guardar/ Debaixo de sete chaves, / Dentro do coração”.

Dicionarizado, o verbete Amigo é um substantivo para os dois gêneros, masculino para amigo e feminino para amiga. Vem do vocábulo latino “amicus,i” originado do verbo “amo”, significando “gostar de”, “amar”.

Coloquialmente usamos para uma pessoa com quem se mantém relação de amizade, de afeto, de companheirismo; e o seu reconhecimento, para os mais exigentes, achei num provérbio histórico vivido pelo filósofo Sócrates da antiga Grécia.

“Conta-se que o Sábio, já reconhecido como uma personalidade respeitada entre os atenienses, mandou construir uma casa para morar com a sua família. Então, os colegas de estudos, conhecidos da Ágora e alguns familiares começaram a criticar a construção.

“Diziam que o frontispício era modesto, que a estrutura externa não era digna de um cidadão da sua personalidade, e quase em unanimidade condenaram os aposentos achando-os pequenos. Enfim, nenhum detalhe escapou à censura.

“Ouvindo os comentários críticos e opiniões contrárias, Sócrates, imperturbável, exclamou: – ‘Provera Deus que a minha casa, tal como eu a desejo, pequena e acanhada, pudesse estar cheia de verdadeiros amigos’”.

Esta preleção tem o peso da sabedoria que o Filósofo com a notável perspicácia nos deixou, através dos seus brilhantes discípulos Platão e Xenofonte – porque ele não deixou escritos os seus pensamentos e ideias.

Por desgostar do poder constituído, Sócrates foi preso, acusado de corromper a juventude e provocar mudanças na religião, desdenhando dos deuses com o princípio “Conhece-te a ti mesmo” que era, para ele, a essência da vida. Foi condenado a suicidar-se tomando um veneno chamado cicuta, em 399 a/C.

Aproveitando os traços desta sapiente trajetória filosófica, qualquer um de nós gostaria de ver as nossas casas repletas de verdadeiros amigos.

Afirmando “amigos de verdade” evitamos vulgarizar a palavra que é empregada, por exemplo, como “amigo do alheio”, referindo-se a ladrão, figurinha carimbada nos meios políticos brasileiros; ou, também, “amigo da onça”, designando quem foi considerado amigo e se revelou traiçoeiro ou desleal.

Temos ainda na gíria brasileira a expressão “amigo urso” também voltada para o infiel e traidor; mas, para compensar, o lado do bem adota “amigo do peito”, aquele que é íntimo, confidente e protetor, o que nos conforta. É este que rareia entre os políticos brasileiros, deixando-os quase todos alheios à realidade por excesso de louvaminhas e falta de informação.

Sócrates, que ainda vive através dos seus ensinamentos, ensinou que “uma vida sem desafios não vale a pena ser vivida”, o que parece um recado secular, antecipado para o presidente Jair Bolsonaro.

O Presidente, enfrentando obstáculos para cumprir suas promessas eleitorais, deve estar atento seu maior amigo e conselheiro, ele próprio, que vive no seu cérebro e no coração desde quando aspirou a presidência da República…

Cora Coralina

Aninha e suas pedras

Não te deixes destruir…
Ajuntando novas pedras
e construindo novos poemas.
Recria tua vida, sempre, sempre.
Remove pedras e planta roseiras e faz doces. Recomeça.
Faz de tua vida mesquinha
um poema.
E viverás no coração dos jovens
e na memória das gerações que hão de vir.
Esta fonte é para uso de todos os sedentos.
Toma a tua parte.
Vem a estas páginas
e não entraves seu uso
aos que têm sede.