Arquivo do mês: abril 2021

RESSURREIÇÃO

MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.com.br)

“A ressurreição derruba três muros intransponíveis: a morte, a injustiça e o fracasso”  (Dom Orlando Brandes)

Intitulei de “Ressuscitem o ‘Bessias’” uma mensagem escrita na semana retrasada comentando a indicação do ex-ministro Eduardo Pazuello, alvo da CPI da Covid, para um cargo a nível ministerial a fim de blindá-lo. (Repetia-se o caso de Dilma querendo livrar o corrupto Lula da prisão; o nome do secretário era Messias, mas a ex-presidente estava fanha na ocasião).

Recebi várias críticas sobre isto; o interessante porém, é que não foi somente dos bolsonaristas defendendo a medida frustrada que igualaria Bolsonaro a Dilma; os pareceres contrários mais contundentes (e alguns ofensivos), vieram de psicopatas decorebas da Bíblia considerando que referir-me à “ressurreição” é um despropósito.

Como admirador do pastor Martin Luther King, imolado pelo racista e extremista James Earl Ray, aproveito um seu pensamento na minha defesa: – “A religião mal-entendida é uma febre que pode terminar em delírio”; e não perdoo esses delirantes que me criticaram.

A ressurreição dos mortos é a base de todas as religiões. Para os cristãos, consta nos Velho e Novo testamentos e nos livros não-canônicos de Baruque, de Enoque e de Esdras, e é emblemática a volta de Jesus Cristo do reino dos mortos.

Assim, a metáfora que eu usei sobre o finado secretário da ex-presidente Dilma, não constitui nem uma ofensa ao morto, nem uma blasfêmia. Não fora a beleza proverbial do texto de Oscar Wilde sobre a ressurreição, encontraríamos nele, isto sim, um insulto ao sagrado.

Contou Wilde que ressurreto, Jesus surgia às vezes à noite, e numa delas reparou um jovem sentado à beira da estrada chorando. – “Porque choras? Perguntou o Nazareno; entre soluços, o rapaz respondeu: – “Eu estava morto e Vós me ressuscitastes; que poderei fazer vendo uma cruel realidade em torno de mim, senão chorar? ”.

Talvez fosse assim o que ‘Bessias’ encontrasse na infeliz conjuntura que o Brasil atravessa. Após tanto tempo afastado do mundo vivente, talvez se entristecesse e chorasse como o moço que Jesus ressuscitou observando o cenário político no Brasil, que provoca lágrimas de revolta a quem realmente ama o nosso País.

Por causa do negacionismo genocida de Bolsonaro, as coisas andam tão mal na luta contra a pandemia do novo coronavírus, pela negligência em todas as ações do governo federal, comprovadamente na falta de insumos hospitalares e até de vacinas!

A mais antiga ressurreição que conhecemos é a de Osiris, primeiro faraó egípcio, assassinado traiçoeiramente pelo irmão Set para tomar o poder. O morto teve várias partes do corpo separadas e atiradas no Rio Nilo; mas a sua dedicada esposa Isis, conseguiu reunir os pedaços e com a ajuda da cunhada Néftis, deusa da morte, ressuscita-o, e Osiris se torna o Deus do Julgamento final.

Essa lembrança mitológica da ressurreição nos leva a Bolsonaro, que vem fazendo de tudo para recuperar a confiança perdida para os que votaram nele contra a corrupção, e os traiu; tornando impossível que ressuscite moralmente.

Sem a hipocrisia dos “cristãos profissionais” e à crença da ressurreição, lembro a passagem bíblica em que Jesus traz Lázaro de volta à vida depois de quatro dias de sepultamento…. Mas considero um feito ainda maior do que ressuscitar os mortos, a certeza que o Cristo tem capacidade de ressuscitar os vivos.

O que não é o caso do Capitão Minto, que mesmo com as orações hipócritas dos pastores e padres políticos que apoiam os seus desatinos, jamais será perdoado pela resistência à imunização contra o vírus, nem por semear o ódio antirrepublicano entre os poderes constituídos.

Nem a ressurreição moral, nem a CPI da Covid, e muito menos o Código Penal, o salvarão da condenação histórica pelas quase 400 mil mortes de brasileiros, em grande parte devidas ao seu negacionismo….

N’EST PAS

MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.com.br)

‘Le Brésil n’est pas un pays sérieux’ (General De Gaulle)

Passando um olhar patriótico sobre o Brasil real, vivendo atualmente sob a mediocridade da política populista e o carreirismo eleitoral, é profundamente triste reconhecer que De Gaulle tinha razão.

Ao assumir patriotismo, lembro que George Orwell no seu badalado livro “1984” projetou um “Ministério da Verdade” usando uma “novilíngua” para distorcer a significação dos vocábulos; o que ocorre entre nós quando a palavra “patriotismo” é adotada por alguns como o culto da personalidade de Jair Bolsonaro.

Vem destes cultuadores fanáticos os aplausos para a totalitária “Lei de “Segurança Nacional” que confunde a pessoa do Presidente da República blindando-o como se fora o próprio Estado, levando-nos de volta a Luiz 14 que dizia “L’ Estat c’est moi”, – “O Estado sou Eu”.

Ungido ao poder por um desastroso desvio do destino, que arrastou expressiva fração do eleitorado inimiga da corrupção lulopetista para elegê-lo, traiu o discurso de campanha, aliou-se aos picaretas e se cercou de uma horda de aduladores oportunistas.

Assim, não é por acaso que o chamado Capitão Minto, ensimesmado, tenha desdenhado a pandemia, bravateado o negacionismo da Ciência e o desrespeito pelas regras sanitárias. O triste é que contou com o apoio das brigadas primitivas, antigos assessores, executores de “rachadinhas” e beneficiados com ações legislativas do “sindicato fardado” que dirigia da Câmara Federal.

Contará com o mesmo amparo agora, quando comete um bestial crime contra a nacionalidade, desprezando-a e envergonhando-a, ao impedir a realização do Censo Demográfico?

Não é preciso ser especialista nem cobrador “de oposição”, para entender que um País deve contar com informações confiáveis sobre todos os aspectos da vida cotidiana, afim de alicerçar a administração pública e conscientizar para a realidade nacional políticos, empresários e cidadãos.

O Brasil deve se orgulhar do IBGE que sempre trabalhou com seriedade e conquistou renome internacional pelo embasamento das suas pesquisas. Entretanto, a irresponsabilidade do atual governo federal não quer saber de números reais, desprezando-os e substituindo-os pela fraude, como vem ocorrendo na pandemia.

As contumazes mentiras de Bolsonaro, são acompanhadas pelo seu ”Posto Ipiranga” e o general Augusto Heleno, atingindo os limites do ridículo. O ministro Paulo Guedes ironizou o questionário do Censo e o general Heleno não esconde o menosprezo pela pesquisa dizendo que a taxa do desmatamento amazônico levantada pelo Inpe era inflada.

Constata-se com isto que Bolsonaro que não tem noção do que seja um Censo, porque ao manobrar no Congresso o Orçamento Picareta de 2021 fez pouco caso da megapesquisa populacional e econômica, pouco ligando que seja ou não seja realizada.

Assim, o Censo que ocorria a cada dez anos e ocorreria no ano passado, foi adiado para 2021 com a desculpa da pandemia, mas na realidade para economizar R$ 2 bilhões….

Novamente, em função da ignorância imperante em Brasília, o Governo Bolsonaro não deu importância ao financiamento do Censo quando tramitou no Congresso a lei orçamentária de 2021. E, na semana passada, o Presidente anunciou desavergonhadamente que o levantamento nacional sobre a conjuntura socioeconômica será adiado mais uma vez.

Quem tem cabeça de pensar sabe que todos os países devem ter estas informações obtidas por uma minuciosa operação estatística; que se torna complexa no Brasil, pela sua dimensão territorial de 8.515.692,27 km², distribuídos por 27 Unidades da Federação e 5.565 municípios.

Lembramos que as pesquisas seriam realizadas com visitas a todos os municípios, distritos, bairros e localidades rurais e urbanas, com visitas a domicílios, colhendo dados sobre as condições de vida da população; e ressaltamos que um País que não sabe quem são os seus cidadãos e cidadãs, não sabe o que realmente possui e o que pode realizar, não é um País sério, que traduzimos para o mundo: – “n’est pas serieux”.

 

 

PROTESTO

MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.com.br)

“Quem aceita o mal sem protestar, coopera com ele” (Martin Luther King)

É impossível esconder o protesto dos 380 mil mortos pela covid-19 contra o presidente Bolsonaro, mais preocupado com a sua reeleição do que em promover a vacinação em massa, única maneira de debelar a pandemia.

Em vez de adquirir vacinas e insumos hospitalares, de mobilizar e ampliar equipes de atendimento às vítimas do vírus, a Familiocracia no poder recruta mercenários e “tolos ideológicos” como agitadores para esconder a política negacionista e fazer do Capitão Minto o “Pai da Vacina”…. É o novo slogan: “A fraude acima de tudo”.

Levantam-se protestos mundo afora; do empresariado, dos trabalhadores, dos intelectuais, do sistema econômico, da magistratura e da política; mas o protesto dos mortos traz a força milenar da maldição do “Rei Tut”, encontrada na tumba dele em 1922 pelo arqueólogo Howard Carter.

Numa parede cheia de pinturas representando Tutancâmon e os seus feitos em vida, numa vasilha contendo fungos, hieróglifos alertavam: – “Ai de quem violar o sono do Faraó! ”. Uma ameaça explícita a quem violasse o túmulo que atingiu os seus descobridores, pois a maioria dos membros da equipe de Carter morreu de causas sobrenaturais; e também alcançou Lorde Carnarvon, o financiador da expedição.

Muitos negam isto, afirmando não passar de uma lenda; mas há quem considere e acredite nas antigas profecias, fazendo ilações sobre acontecimentos coincidentes.

É, mais ou menos, o que vem ocorrendo no Brasil: duas correntes de opinião; uma que questiona os fatos em busca da verdade; e outra que se baseia nas repetidas mentiras do mitômano Bolsonaro.

Nos entrechoques da política miúda, prevalece a sabedoria popular ao dizer que “nem tudo que reluz é ouro”, um princípio que alerta para as fraudes do folheado a ouro, da máquina de fazer dinheiro, da pérola falsa e da demagogia populista….

Nenhuma destas arapucas armadas por vigaristas consegue enganar quem está prevenido sobre as vírgulas de um decreto, a convocação de uma CPI para não investigar, e não levar a sério o bando oportunista que se fantasia “de direita” e “conservador”.

Os observadores da política nacional estão vacinados contra o fanático culto de personalidades e seguidores de ideologias adulteradas por falsos gurus. Vêm claramente a orquestração do grupo que atua sob a orientação baixada de salas contíguas à do Presidente no Palácio do Planalto.

É o ativismo bolsonarista. São poucos, mas confirmam a observação de Mark Twain que disse: – “os tolos representam quatro quintos da humanidade”, dando oportunidade aos espertos para conduzi-los.

Nas redes sociais a gente está sempre topando com um deles, particularmente os recém-chegados no Twitter, que não seguem os princípios éticos que adotávamos e deixam de lado os critérios de socialização (é possível que algum desses imbecis confunda socialização com socialismo, mas não é).

Com este pessoal, passamos a encontrar mensagens padronizadas, opiniões selecionadas, ofensas pessoais e xingamentos com palavrões…. E vão ao exagero com ataques a quem não reza pela cartilha do desvario governamental grotescamente ideologizado.

Contra tudo isto, chega o protesto dos nossos mortos “transportando estrelas no negro infinito”, como os viu o poeta mexicano Amado Nervo. Do além, inspiram as suas famílias e os seus amigos a também repudiar a falta de consciência e a desumanidade de Bolsonaro na prática da sua política necrófila.

É preciso que a presença espiritual dos que morreram graças ao negacionismo, faça os civis se comoverem, e que os militares cumpram o princípio da caserna:  “A verdade é um símbolo da honra militar”.

 

 

OS TOLOS

MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.com.br)

“Para fazer um tolo compreender é necessário dar-lhe cocorotes na cabeça, enquanto para o inteligente basta uma palavra” (Provérbio persa)

Sem cocorotes, torna-se muito difícil aos tolos compreenderem o trágico momento da pandemia. Tangidos por negacionistas no poder, levantam a justa bandeira da liberdade religiosa para defender igrejas de portas abertas, sem ver que se trata de uma medida emergencial e temporária para defender vidas. A Liberdade é um bem.

Antes disto, estes mesmos patetas, ouvindo “a voz do dono” (antiga propaganda da RCA/Victor), combatiam os avanços científicos das máscaras, do distanciamento, do isolamento e cuidados nos contatos familiares, mas contra as medidas preventivas evocam um deus restrito a quatro paredes das igrejas….

Dando um triste exemplo, assistimos os malabarismos negacionistas do presidente Bolsonaro, se desdizendo para esconder a sua obsessão de enfrentar a lógica preventiva. Foi assim que convocou uma reunião com empresários, em que esteve representada ficcionalmente a empresa Lúcifer & Cia. Ltda., que explora os tolos em transações necrófilas.

O Anjo Caído, que preside o Conselho Diretor da L&C, sabe melhor do que ninguém que “os tolos representam quatro quintos da humanidade” conforme constatou Marc Twain, e para eles dá 50% de desconto na compra do produto da moda, o negacionismo.

Assim, vê-se formarem filas de néscios para comprar o negacionismo luciferiano, uniformizados com a camiseta do besteirol e gestos que agradam o aprendiz de ditador, para exibi-lo nas redes sociais. Ao receberem uma crítica, agridem quem os contradiz indignados e raivosos.

São organizados sob o comando de um esperto, poucos, mas ruidosos, repetindo as palavras-de-ordem do interesse do poder; quando ouvem “um chega prá lá” recebem de imediato a solidariedade dos colegas que compõem os quatro quintos da humanidade….

Perguntem a estes boçais qual é a diferença entre um berrante gaúcho e o shofar judeu, e ele certamente abordará o formato ou o som produzido, embora envolvido neste contexto. Adianto-lhes: ambos são feitos de chifres e emitem sons parecidos; e a diferença é que o shofar é tocado em serviços religiosos e o berrante para recolher o gado….

Alguém já disse – perdoem-me esquecer quem foi -, que “vale mais uma hora de sábio que a vida inteira de tolo”, pensamento lúcido que infelizmente não chegou ao ouvido dos brasileiros e por isso os broncos se juntam aos picaretas e ganham as eleições chegando ao poder. E logo se colocam acima das leis e da consciência social.

Um dos presidentes da República eleito e reeleito pelos palermas dos quatro quintos brasileiros – Lula da Silva –, além das medidas provisórias vendidas e das propinas recebidas, cometia os erros idiomáticos do linguajar de pelegos sindicais, e era aplaudido por acadêmicos.

Entre inúmeras condecorações recebidas, esse sentenciado em duas instâncias por corrupção e lavagem de dinheiro, foi brindado por várias universidades com o título “Doutor Honoris Causa”; e agora, sob aplausos dos lorpas socialisteiros, foi inocentado por firulas jurídicas no STF garantindo-lhe a impunidade, não pelo analfabetismo, mas pela desvairada corrupção.

O atual presidente, chefe da seita que se auto assume como “de direita” e “conservadora” é, no outro extremo, um apedeuta grosseiro e presumido, e também com desvios rasteiros de corrupção pelas “rachadinhas” e “cheques do Queiroz”, e nem para deleitar os tolos fanáticos que o seguem, não rem moral para queixar-se do seu adversário…

Neste quadro insólito de cinquenta tons desarmonizados, eu gostaria de vacinar os tolos azuis e vermelhos que protagonizam o avesso pastoril da politicagem; mas como disse Voltaire: – “É difícil livrar os parvos das correntes que eles próprios veneram”.

 

 

 

 

TITANIC

MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.com.br)

“A gente quer a vida como a vida quer” (Banda Titãs, in “Comida”)

É impressionante o pavor dos seguidores de Bolsonaro reagindo contra a convocação da CPI da Covid-19. Veem as investigações sobre a política governamental durante a pandemia como aquele iceberg que afundou o luxuoso transatlântico da White Star Line, saído dos estaleiros de Belford, na Irlanda.

Do outro lado, muitos acham que é uma excelente chance para o Presidente provar que está certo na sua condução da política sanitária enfrentando o vírus; afirma-se que o temor dos bolsonaristas mostra o contrário do que afirmam, que a mentira e a fraude substituíram o slogan “O Brasil Acima de Tudo”….

Pelo interesse nacional na apuração dos fatos, os brasileiros não comparam esta CPI com a montanha de gelo flutuante que partiu o Titanic ao meio e levou-o ao fundo do oceano, mas uma maneira de esclarecer como o Ministério da Saúde se conduziu na pandemia.

Vê-se paralelamente quão insólito é o ataque virulento do Presidente ao STF, em particular ao ministro Luiz Barroso, sempre acompanhado pelos seus seguidores. Em verdade, vê-se que os que se opõem à CPI, levantam críticas usando a camisa listrada dos malandros, e não a toga da magistratura, porque é inegável que a decisão do ministro Barroso foi técnica, baseada no texto constitucional.

Diante disto, observa-se que não há boa-fé dos fanáticos que seguem a forma desrespeitosa e grosseira com que o presidente Bolsonaro reagiu. Se na verdade são amigos, deveriam educá-lo, mostrando que o comportamento republicano exige que siga a norma consagrada do Direito, de que decisão de Justiça não se discute, se cumpre.

O historiador, filósofo e poeta romano Caio Cornélio Tácito, que passou à História simplesmente como Tácito, disse que – “Os aduladores são a pior espécie de inimigos”, projetando ad futurum os servis puxa-sacos que cercam o Presidente, mais prejudiciais a ele do que uma barulhenta oposição política e parlamentar.

Como baixar a cabeça, subalternos, à desobediência infantilóide de Bolsonaro, com xingamentos e ataques pessoais, exibindo um comportamento nefasto a si próprio? Será ele intocável, um semideus como os titãs da mitologia greco-romana ou apenas um homem de carne e osso que eventualmente ocupa a presidência da República?

Foi lembrando os Titãs que chegamos ao navio Titanic, cujo nome que veio da palavra “titãs”, entidades divinas da mitologia, filhos de Gaia e Urano. “Mito” por “mito”, esta comparação nos levou à história da primeira geração dos deuses do Olimpo.

Eram seis homens e seis mulheres que governaram o mundo após Cronos – o Tempo – ter matado Urano para defender Gaia, atacada por ele. Antes de Zeus, o governo deles, com Cronos à frente, representou a Era conhecida como “A Idade de Ouro”.

O rock brasileiro marca a presença da Banda Titãs, que no ano passado gravou o seu CD “O Brasil de Que Deu Certo”, e sempre evoca saudades das composições cheias de poesia como “Epitáfio” e “Enquanto Houver Sol”. É antológica a sua canção “É preciso saber viver”, com os versos: “Quem espera que a vida/ Seja feita de ilusão/ Pode até ficar maluco/ Ou morrer na solidão…”.

Navegando nos mares revoltos da pandemia, enfrentando as ondas da necropolítica governamental e 350 mil cadáveres boiando, voltamos à ficção do Titanic bolsonarista construído nos estaleiros da Barra da Tijuca, Rio de Janeiro, tendo como armadores “os meninos do Presidente”, advogados despachados, empresários expertos, PMs aposentados e a turma operária tendo como mestre –de-obras Fabrício Queiroz…

Entusiastas da indestrutibilidade do barco, escreveram na linha d’água os slogans “Os Filhos Acima de Todos” e “Reeleição Acima de Tudo” e puseram o novo Titanic a navegar em Brasília, no Lago Paranoá, símbolo do poder marítimo do Palácio do Planalto….

Será a CPI da Covid-19 que o levará ao fundo?

 

 

SOMBRAS

MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.com.br)

“Onde o amor impera, não há desejo de poder; e onde o poder predomina, há falta de amor. Um é a sombra do outro” (Carl Jung))

Mesmo com a idade avançada, não me sai da memória o tempo em que escutava no rádio a novela do “Sombra” – um personagem de histórias policiais que me encantava.

A trilha sonora, com acordes compassados e segundos em silêncio, imprimia atenção e expectativa para o aparecimento do personagem e a sua voz cavernosa: -“ O Sombra sabe…”, precedida de um riso em crescendo, “ah-ah-ah-ah-ah! ”.

Para um menino, o programa construía a ideia do combate ao crime, que mais tarde veio desenhado em revista de quadrinhos. O benéfico perseguidor mascarado “The Shadow” foi criado pelo escritor norte-americano Walter Brown; era um disfarce do milionário Lamont Cranston, na história que mais tarde inspirou a criação do Batman.

Além do personagem, o verbete Sombra é um substantivo feminino oriundo do latim “sulumbra”, nascida da expressão “sub illa umbra”, a parte escura do céu…. É a penumbra provocada pelo bloqueio da luz; significa também silhueta e até a maquiagem que dá cor às pálpebras.

Ao deixar a infância interessei-me pela Mitologia Grega e Romana, encontrando nos poemas épicos de Homero, Ilíada e Odisseia personagens sedutores, e especialmente encantou-me a Ilíada, a guerra protagonizada por Ulisses, rei de Ítaca, inventor do célebre Cavalo de Tróia. E foi com ele esbarrei em sombras.

Visitando o inferno, Ulisses viu Aquiles, outro grande guerreiro, comandando uma legião de heróis falecidos em combate; felicitou-o pela glória que conquistara entre os vivos e o reconhecimento dos mortos. Aquiles, porém, falou humildemente: – “Não tente me consolar, nobre Ulisses; eu preferiria lavrar o campo como servo, privado de privilégios e bens, do que comandar um Exército de Sombras…

A lendária saga de Aquiles aponta que a sua morte se deveu a uma flecha envenenada que lhe atingiu no calcanhar, a parte do corpo sem proteção da armadura; daí nasceu a expressão “calcanhar de Aquiles”, referindo-se à parte fraca de uma pessoa.

No correr da vida cai no esquecimento as lições que a própria vida recebeu; e comandar um “Exército de Sombras” é motivo de alegria e acrobacias verbais para Bolsonaro, que insiste em referir-se “o ‘MEU’ exército” querendo que acreditem ser ele dono de um “Exército” que pode acompanha-lo numa aventura golpista.

Na verdade, o Capitão Minto comanda um exército de sombras, com oficiais reservistas de farda no armário: uns até bem-intencionados, outros apenas para dobrar os rendimentos, muitos saudosistas do regime militar, em sintonia com conspirações, e mais alguns revanchistas esquizofrênicos contra o Estado de Direito.

De pijama ou de paletó e gravata, este Exército das Sombras nada tem a ver com os militares da ativa, do Exército de Caxias, com desempenho nos quarteis aonde impera a hierarquia a o patriotismo; e são tradicionalmente legalistas.

Há um 2º Exército das Sombras. Formado de mercenários que atuam nas redes sociais em defesa do Governo Bolsonaro, com a ignorância intolerante dos obedientes sabujos atrás da caça; estes, apesar de organizados e ruidosos não são levados a sério on line por disseminar fake news.

Pela religião mal compreendida (como alertou Martin Luther King), formou-se um 3º Exército das Sombras, e já tem um graduado no STF…. São religiosos “ao extremo” misturados com neo-cristãos oportunistas mergulhando nas trevas bolsonaristas como falsos defensores da liberdade religiosa.

Um cristão autêntico, despojado de vaidades e vacinado contra a politicalha, o padre Júlio Lancellotti, diz com sapiência e fé que “a essencialidade da liberdade religiosa é o testemunho de Deus. Não é ir no templo testemunhar o cofre…”.

Nestes tempos estranhos que vivemos, ouvir a voz da razão propõe uma justa repartição de sombras e de luz, pela união de todos contra a pandemia, propomos seguir as palavras do Cristo:  -“Perdoai-os, Pai, pois eles não sabem o que fazem”.

 

SILÊNCIO

MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.com.br)

“É preciso que alguém fale, e fale alto, e diga tudo, custe o que custar! ” (José Américo de Almeida)

Homenageou-se no mês de março o aniversário do jornal norte-rio-grandense “Tribuna do Norte” e o seu fundador, Aluízio Alves, jornalista de vocação sempre atuante. Aluízio, como homem de bom senso, conhecia o leitor-padrão dos jornais e ensinava na redação que era melhor suprimir o trecho de uma matéria do que acrescentar firulas ao conteúdo.

O noticiário jornalístico se perde por excesso de floreado que tira a atenção do leitor, como uma reportagem que li vinda de Nova York muitos anos atrás. Trouxe a história de uma violinista (de nome italiano, mas esqueci) que deixou no testamento o pedido para que no seu enterro se ouvisse uma tocata de Paganini e que o seu Stradivarius fosse enterrado com ela…. Ora, ouvir Paganini é uma maravilha; mas enterrar uma fortuna por simples egoísmo é uma excentricidade muito cara.

Essa extravagância testamentária se repete com pessoas de várias profissões, não é como se pode pensar, a vaidade egocêntrica dos artistas; a encontramos, por exemplo, entre os políticos, em maioria carreiristas, gananciosos e personalistas, como vimos nos discursos em defesa das emendas parlamentares discutindo o Orçamento.

Ensinar a fazer silêncio em algumas oportunidades deveria fazer parte da educação doméstica infantil, como escovar os dentes, não falar com a boca cheia e não beber água antes da sopa…. Hemingway lembrou num dos seus livros que “são necessários dois anos para aprendermos a falar e sessenta para aprendermos a calar”.

Como tal ensino não é praticado, vimos há pouco o ministro Fábio Faria exagerar na falação, sugerindo que os jornais publicassem balanços sobre vítimas da pandemia, ignorando que já havia se formado um consórcio dos veículos de imprensa só com este objetivo…. E é o “homem de Bolsonaro” na Comunicação.

Tem um aconselhamento proverbial que diz: – “Falar é bom, calar é melhor, mas ambos são desagradáveis quando levados ao exagero”; esta lição serviria ao governador João Dória, que com incontinência propagandista correu para anunciar uma “vacina 100% brasileira” o que não é bem assim…

Os agentes públicos deveriam atentar que se o pronunciamento correr o risco de um equívoco, melhor será que se faça silêncio. Dicionarizada, a palavra “Silêncio” é um substantivo masculino significando total ausência de som, e também uma interjeição, quando vem precedida pelo sinal de exclamação. A origem é latina (silentium, -ii) e tem referência à situação de quem se abstém ou para de falar.

Um dos mais belos toques militares de corneta é clarinada do Silêncio, que é executado como honra fúnebre em enterros e avisa o recolhimento noturno. Kafka se refere à energia que reside no silêncio, e Shakespeare encerrou a sua genial peça Hamlet saindo da boca do príncipe moribundo: – “O resto é silêncio…” destas palavras se aproveitou o festejado escritor gaúcho Érico Veríssimo intitulando um dos seus livros, publicado em 1943, “O Resto É Silêncio.

Guardar o silêncio é prova de inteligência; mas ao alcançarem o poder, muitos s’ esquecem disto mantendo irrefreável loquacidade em assuntos que não lhe competem, ou simplesmente desconhecem, mas fingem conhecer…. E o pior é que não se conformam com as críticas da mídia sobre a tagarelice.

É assim que age o inconsequente presidente Bolsonaro na pandemia do novo coronavírus. Obcecado em desdenhar a peste como foi orientado pelo antigo líder, Donald Trump (que já se desculpou, mas não repercutiu aqui), e sem uma assessoria para orientá-lo, pois se cerca de iguais e inferiores à sua formação intelectual, continua dando maus exemplos à população pelo negacionismo explícito….

E, desgraçadamente, influencia o bando extremista falsamente assumido como “de direita” ou “conservador”, mas simplesmente de fanáticos pelo Chefe e achegados ao poder, muitos deles recebendo pixuleco nas redes sociais para defender o “tratamento precoce”.

Neste cenário vergonhoso e constrangedor, dá vontade de sugerir ao “Posto Ipiranga de Bolsonaro”, o ministro Paulo Guedes, ávido pela ressurreição da CPMF, que crie uma taxa para os boquirrotos, na mesma proporção como cobra pelos alimentos.