Arquivo do mês: abril 2024

DOS ANIMAIS

MIRANDA SÁ (E-mail: mirandasa@uol.com,br)

É emocionante o vídeo postado pela “Sexteto 4 Patas” como epitáfio pela morte do cachorro Joca, o Golden Retriever de 5 anos que faleceu durante um transporte aéreo pela irresponsabilidade da empresa Gollog, da Gol.

O grupo ‘Sexteto de 4 Pratas’ é de Fortaleza e composto por 10 animais: um poodle, cinco golden retrievers, três gatos e um cachorro sem raça definida. Solidários com Joca fazem um protesto pelo tratamento dado aos animais de estimação que acompanham seus tutores em viagens.

Foi ótima esta participação dos Pets, mais sentida e mais honesta do que a imunda politização do caso pelos conhecidos perfis de ocupantes do poder. Dos ministros togados do STF, passando por parlamentares e ecoando com a primeira dama, Janja da Silva e ministros subalternos.

Cobradas as providências apressou-se o ministro Silvio Costa Filho dos Portos e Aeroportos, cobrando da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) a instauração de um processo administrativo para apurar a falha do transporte aéreo.

No rabo do foguete midiático, como não poderia deixar de ser, achegaram-se a esta performance conhecidas figuras da oposição entre as quais os filhos 01, 02, 03 e 04 de Bolsonaro que não perdem oportunidade de acender a fogueira da polarização.

A evocação do triste episódio teve um desfile de oradores nas duas câmaras do Congresso e consternados sermões de padres católicos e pastores protestantes. Não foi notícia a participação da extremamente evangélica Michele Bolsonaro.

Estas manifestações em nome dos princípios religiosos, porém, não exaltaram o santo Pobrezinho de Assis, Francisco – o padroeiro dos animais. Fica claro que também não citariam o profeta Maomé, encoberto pelas discriminações ao islamismo tão condenado quanto o judaísmo sofrendo ambos o desprezo dos amorosos cristãos de fancaria….

A trivialidade dos políticos e religiosos brasileiros e a ignorância geral não lhes permite tomar conhecimento do que passa em outras culturas e possivelmente não tomaram conhecimento do Velho Testamento que ao mesmo em que exalta “animais que vivem na terra e são comestíveis, e hostiliza os que tem casco fendido e dividido em duas unhas e que rumina”.

Quanto a Maomé já escrevi outro dia uma passagem que ouvi muitos anos atrás e conta que o Profeta estava em meditação e um gato se enroscou na manga de sua túnica e dormiu profundamente. Chegada a hora de ir à Mesquita Maomé cortou a manga com uma tesoura para não o acordar; como o gato pareceu sorrir-lhe, acariciou sua cabeça com a mão e concedeu-lhe o privilégio de somente cair sobre as próprias patas…”

Além do benefício sobrenatural dado aos felinos, há outra lenda sobre Maomé que conquista a simpatia de quem ama os animais. Ressalta que ele amava realmente os animais e estes lhe retribuíam com amor: “um dia Maomé tirou cuidadosamente uma aranha que caíra num pote de mel. Lavou e lhe colocou numa folha de parreira ao sol para que secasse.

“Certa vez, tendo o Profeta que fugir dos seus inimigos entrou numa caverna, onde as aranhas trabalharam estendendo teias sobre a entrada. Os perseguidores entraram em todas as cavernas, mas passando por esta, passaram direto pois o tecido brilhando ao sol denunciariam se ali ele houvesse entrado.”

A gratidão dos animais é marcante. Muito diferente do comportamento de certos animais humanos que desprezam seus irmãos mesmo com os ouvidos engravidados pelas parábolas que pregam o amor ao próximo.

Assim se viu no silêncio absoluto dos políticos e religiosos no caso do pré-adolescente autista que sofria constantes bullyings, numa violência crescente que ocasionou a sua morte. Este episódio ocorreu na Escola Estadual “Júlio Pardo Couto”, em Praia Grande, litoral paulista.

 

 

 

 

DA TECNOLOGIA

MIRANDA SÁ (E-mail: mirandasa@uol.com.br)

Observei numa rachadura das pedras de uma calçada na minha vizinhança o nascimento vigoroso de uma plantinha, que pelas folhas encorpadas me parece uma leguminosa, quem sabe, um pé de feijão ou ervilha….

Escreveu um poeta que a força vital vence o cimento armado; e eu passei a acreditar nisto, como creio que a Internet e a Inteligência Artificial nasceram para aprimorar a vida humana.

Pouco m’importa se há pessoas que não pensam assim; pois sei que estas não são do time que acarinha um gato e vê brotar uma semente no caminhar pela rua. A gente vem encontrando no dia-a-dia muitos indivíduos cuja alegria fenece diante do novo.

Olhando pelo retrovisor da História um dos deuses da Jurisprudência Olímpica disse outro dia que antes da Internet proporcionar a democracia das redes sociais “era feliz e não sabia”. Concluímos que a sua noção de felicidade se baseia, não no bem-estar social, mas num público amordaçado para não exprimir opiniões.

Será isto uma espécie de ideologia, surgida da nostalgia de um passado analógico, correlato à submissão aos antigos meios de informação que decidiam, pelo interesse do sistema dominante, o que é bom e o que é ruim.

Esta realidade é encontrada na ficção que o filme “Coringa” nos trouxe – a premiada película dirigida por Todd Phillips, com Joaquin Phoenix no papel de Arthur Fleck e Robert De Niro interpretando o apresentador televisivo Murray Franklin.

Arthur Fleck, que trabalhava como palhaço e sonhava em participar de shows humorísticos era uma pessoa isolada, desconsiderada e agredida no ambiente de trabalho e convivia com uma mãe carente e psicótica.

Assistindo num carro do Metrô às provocações de três rapazes, e o assédio deles a uma passageira, sofre uma gargalhada nervosa, doentia, e é agredido pelos ultrajantes, o que desperta a sua personalidade criminosa, matando-os com tiros de revólver.

Pela divulgação por vídeo de uma comédia dele fracassada, é convidado a participar do programa de televisão de Murray, que o ridicularizara pela apresentação ridícula; então comparece à entrevista maquiado de palhaço e com os cabelos coloridos.

Pede para ser chamado de “Coringa”; e no seu discurso final confessa o triplo assassinato, protestando contra o poder político porque vem dele a definição do que é comédia, humor e tragédia.

Arthur encerra seu discurso sobre a sociedade que o marginalizou culpando a televisão por isto; levanta-se e dispara dois tiros em Murray, que morre na hora. O programa é interrompido com ele se dirigindo para a câmera um, se despedindo com o slogan usual: – “Esta é a vida”.

Termina preso, e graças a um desastre com o carro de polícia que o conduzia, é salvo por pessoas usando máscaras de palhaço e é aplaudido pela multidão manifestando protesto.

Como a tevê do Coringa, a tecnologia no Brasil vem sendo condenada pelo sistema, na mesma mistura de realidade e ficção. É, felizmente distinguível, pois vem de um poderoso figurante do Poder Judiciário, o ministro Alexandre de Moraes, ecoando nas bases lulopetistas com um surpreendente apoio.

A surpresa ocorre por contradizer a História da Política, que durante muitos anos mostrou a “esquerda” como progressista e a “direita” como conservadora. Agora, este capítulo traz apenas a mediocridade de uma esquerda populista polarizando com uma direita populista, na disputa pelo poder.

A “esquerda lulista” – que não estudou a dialética – revigora-se no culto à personalidade de Lula –, mas ignora a contradição que nega aos desavisados que o seu líder representa a “vanguarda do atraso” e não do progresso nacional.

Assim, os ofendidos e humilhados pela ignorância vigente na Era Lulopetista não se conformam em ver setores do PSOL atuarem contra o uso da inteligência artificial no sistema educacional do Estado de São Paulo.

Os verdadeiros democratas se revoltam em ver o deputado Orlando Silva do Partido Comunista do Brasil, agora transformado num puxadinho do PT, dizer que é “inevitável” a regulação das redes sociais.

Felizmente podemos exaltar a Tecnologia em nome dos estudantes brasileiros do Sesi Araras (SP) que conquistaram uma vitória inédita no Champion’s Award, o maior torneio de robótica do mundo realizado em Houston, EUA.

Mas temo por eles. Pode até ser que em vez de aplausos na sua volta ao Brasil, sejam presos, porque a Tecnologia é criminalizada pelos fundamentalistas do obscurantismo jurídico.

DA FELICIDADE

MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.com.br)

A busca da Felicidade é uma fantasia diversionista para fazer esquecer as agruras do dia-a-dia das pessoas que vivem nos andares de baixo do edifício social. Ou esquecidas no subsolo, o porão da miséria.

Esta procura tem uma campanha massiva provocando enquetes e até incentivou países a criar um Ministério da Felicidade; e vem de longe. O meu bisavô português João da Costa Fortinho, que foi pupilo de Camilo Castelo Branco e era político, adotava a consigna “A República resume a felicidade de uma Nação”. Foi um dos 33 da independência uruguaia.

Assim, para mim, a Felicidade entra ancestralmente na política, e emerge agora no Brasil com o ministro togado Alexandre de Moraes, olhando pelo retrovisor da História diz que quando não havia a Internet “era feliz e não sabia” …. O Juiz assume com esta declaração a sua abominação pela democracia nas redes sociais,

O besteirol descabelado traz na sua enorme cretinice uma ressalva elogiável: Lembrou o samba clássico de saudoso Ataulfo Alves, “Meus Tempos de Criança” que encerra nas estrofes com “Eu Era Feliz e Não Sabia”.

Na poesia, a Felicidade acalenta um sentimento de alegria e satisfação, contentamento e a premissa de ser feliz, características ressaltadas no belo poema de Mário Quintana “Da Felicidade”.

Este sentimento poético é atemporal e não se arrasta na virada dos séculos, quando as redes sociais não existiam; e é por isto que Alexandre de Moraes se expõe como um saudosista da época em que os políticos ficavam livres das críticas, das denúncias de corrupção, das farsas eleitorais e das truculências repressivas….

Para quem interpreta a Constituição de um País, é uma saudade estranha da Idade de Ouro das Falcatruas, em que a Felicidade constituía na facilidade de se obter o êxito pessoal duvidoso, o sucesso dos interesses partidários e grupistas, e o enriquecimento dos que misturavam o público e o privado para obter propinas.

Nas redes sociais não valem os cem anos de segredos de Bolsonaro e Lula e os processos sigilosos do STF; nenhuma perversão fica escondida após surgirem na Web as ferramentas de expressão do pensamento, Facebook, Instagram, Telegram, YouTube, Tic-Toc, WhatsApp e o “X”, rebatizo do Twitter.

Facilitada a liberdade de expressar opiniões e divulgar coisas do interesse geral provoca lamentos dos corruptos, dos seus cúmplices e dos publicistas mercenários a serviço do populismo demagógico.

Assim, a poderosa corporação dos andares do alto, onde pavoneia Alexandre de Moraes, relembra as várias formas da felicidade perdida, lástima dos especialistas da GloboNews que entraram na corrente saudosista revelando que eram mais felizes na era analógica….

Também eram felizes os lulopetistas que assaltaram a Petrobras em conluio com empreiteiras corruptoras; idem os que passavam incólumes de prestar contas do dinheiro público desviado. E eram felizes os seus tutores, ministros do STF, de quem Moraes é porta-voz; praticavam o “garantismo” favorecendo o crime e os criminosos sem conhecimento público.

O conceito de Felicidade se encontra no dicionário Aurélio significando o estado de espírito de quem está alegre ou satisfeito; e que deste substantivo nasceu o adjetivo Feliz, originário do latim “felix, felīcis”, associado a fértil, “fertĭlis”, o que provoca alegria, contentamento e júbilo.

Uma sociedade feliz seria encontrada na teoria de Campanela. De Cícero, de Swift, de Platão e Morus que inventaram repúblicas e reinos ideais onde são mais interessantes as exclusões do que as admissões.

As utopias sonhadas erguiam monumentos à palavra Felicidade; a homenagem a este verbete que me leva ao mestre Machado de Assis: “Palavra puxa palavra, uma ideia traz outra, e assim se faz um livro, um governo, ou uma revolução”; e dele, levando-nos à reflexão pelo momento de atravessamos, o genial pensamento: “O tempo é um químico invisível, que dissolve, compõe, extrai e transforma todas as substâncias morais.

DA LIBERDADE

MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.com.br)

Mal terminara a 2ª Grande Guerra, em 1946, meu pai levou-me para assistir na ABI (onde mais tarde, com muito orgulho, fui conselheiro em quatro mandatos) uma conferência do jornalista, escritor e orador Austregésilo de Athayde.

Austregésilo foi dirigente dos Diários Associados, com importante participação na Revista “O Cruzeiro” e recebeu o Prêmio Maria Moors Cabot, o Oscar da imprensa norte-americana.

O conferencista chegara a pouco dos Estados Unidos e relatou a sua estadia lá, impressionando-me ao contar que, convidado para um almoço e com o hábito de acordar cedo, fez hora visitando várias igrejas católicas e protestantes dos arredores, assistindo repetitivos sermões dos padres e pastores.

Estes pregadores cobravam dos fiéis a obrigação de defender a Liberdade. Não só a liberdade de culto, de expressão do pensamento e do jornalismo. De todas as liberdades. Curioso, durante a refeição ele perguntou aos convivas se havia alguma ameaça contra a Democracia no país.

À unanimidade, todos responderam que a defesa da Liberdade não pode ser esquecida; deve sempre ser lembrada, em todo lugar e a qualquer hora. Naqueles dias eu tinha 13 anos; mais tarde encontrei este alerta com Jean Jacques Rousseau: “Povos livres, lembrai-vos desta máxima: A liberdade pode ser conquistada, mas nunca recuperada”.

Como o filósofo libertário, pensaram assim respeitáveis personalidades da História, da Poesia, da Política e da Religião. Assim pensaram os autores do Hino da Proclamação da República, o jornalista Medeiros e Albuquerque e o compositor e maestro Leopoldo Miguez, enchendo de brio as nossas cabeças com o refrão “Liberdade! Liberdade!/ Abre as asas sobre nós!”.

Como o materialista Bakunin, sou um amante fanático da liberdade, e como o pregador cristão Martin Luther King, acho que para satisfazer a sede de liberdade devemos afastar o cálice da amargura e do ódio.

O problema é que a ciência política está vendo a humanidade ser ameaçada pelo totalitarismo ditatorial, mascarado de “Democracia Relativa” ou “Democracia Efetiva”, adjetivando e negaceando o valor que a autêntica liberdade oferece.

A liberdade com responsabilidade, que a “Tribo do Bem” vem praticando nas redes sociais, ocupando o lugar da imprensa cínica, mercenária, demagógica e corrupta que segundo Joseph Pulitzer forma “um público tão vil como ela mesma”.

A Web oferece à cidadania as armas destinadas a defender ideias, o interesse nacional e o sonho de liberdade. Os fascistas de hoje, que se assumem como antifascistas, e os políticos, magistrados e formadores de opinião que relativizam a Democracia, aparecem intimidando o “X”, o You Tube e outras ferramentas da opinião pública.

Poeticamente, a divina Cecília Meirelles escreveu que “Liberdade é uma palavra que o sonho humano alimenta, não há ninguém que explique e ninguém que não entenda”; e o supremo crítico da autocracia opressora, George Orwell é curto e grosso: “Se a liberdade significa alguma coisa, é sobretudo o direito de dizer às outras pessoas o que elas não querem ouvir”.

A voz do povo – que é a voz de Deus – se expressou em 1989 no magnífico samba-enredo da Escola Imperatriz Leopoldinense; composto por Niltinho Tristeza, Preto Joia, Vicentinho e Jurandir, que Dominguinhos do Estácio, cantou: “Liberdade! Liberdade! / Abre as asas sobre nós! / E que a voz da igualdade/ Seja sempre a nossa voz”.

Tudo por uma Liberdade sem adjetivos. Afirmemos com Rosa de Luxemburgo que “Liberdade somente para membros do partido e do governo, não é, de modo nenhum, liberdade”.

DA VIOLÊNCIA

MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.com.br)

A Violência se alastra pelo mundo como o espetáculo e o estrondo das cachoeiras, é impossível não a ver nem a ouvir. A agressividade, o desrespeito e a ofensa se fazem presentes no noticiário jornalístico do nosso dia-a-dia.

O verbete Violência, dicionarizado, é um substantivo feminino de etimologia latina “violentia.ae” – qualidade de violento; no nosso idioma, é opressão, tirania, sujeição de uma pessoa forçando-a a fazer algo que se recusa por livre vontade. Em termos jurídicos, trata-se de constrangimento físico ou moral exercido sobre alguém, obrigando-o a cumprir o que lhe é imposto: violência física, violência psicológica.

A Organização Mundial de Saúde define a Violência como “o uso intencional de força física ou poder, ameaçados ou reais, contra si mesmo, contra outra pessoa ou contra um grupo ou comunidade”.

Com vistas à Violência, o Anarquismo combate o arbítrio do Estado, cujas ações, segundo seus teóricos, constituem formas de violência de natureza estrutural, como a pobreza pela negatividade do bem-estar social com políticas que produzem e estimulam a desigualdade socioeconômica mantendo privilégios e injustiças.

Em verdade, a pobreza é sem dúvida uma violência mantida por políticas opressivas sobre grupos minoritários despossuídos de direitos legais. Com isto, surge o que os estudiosos classificam como “Violência Interpessoal”.

Esta tipologia define diferentes formas de violência: a conjugal ou familiar, que ocorre no próprio lar; e a violência comunitária, que acontece entre pessoas sem vínculos de parentesco, que podem ser conhecidas ou mesmo entre desconhecidos.

No campo da violência interpessoal se achegam as ideologias religiosas e políticas capituladas nas páginas da História da Humanidade. Encontramos curiosamente (e é um fato notório na atual conjuntura) que os estamentos eclesiais e partidários se acusam uns aos outros de violência em análogas situações.

É inegável, por exemplo, que a Bíblia judaico-cristã encerra um vasto acervo de fatos violentos, trazendo – como já disse alguém – “ao lado de exemplos de virtude, estupro e fratricídio humanizados, e os castigos da ira divina como o dilúvio, pragas do Egito e destruição de Sodoma e Gomorra”.

Encontra-se na passagem de Adão e Eva, um exemplo de violência: Jeová propondo normas de obediência e preceitos ditados pela sua autoridade; e tais normas sendo desobedecidas pelo casal primevo, levou-o à expulsão do paraíso.

O cristianismo imperial da Igreja Católica criou a “injúria de sangue” contra os judeus e os seus tribunais da Inquisição condenaram como feiticeiras as parteiras e as mulheres que se aconselhavam com elas. Ainda hoje surgem acusações de satanismo contra adeptos de religiões de origem africana ou indígena.

Ao longo da História temos diversos capítulos sobre a violência nos quatro ou cinco mil amos de civilização. Desde os tijolinhos em sânscrito da Mesopotâmia, aos papiros egípcios e os rolos da Torá, para ficar apenas no Ocidente; e, nesta banda do planeta Terra, a opressão tirânica da política e a crueldade nas guerras religiosas.

Vejo no discurso de ódio uma forma de violência na política brasileira; é, para mim, a ouverture da opereta de horror que vimos assistindo com protagonistas entre os que combatem o terrorismo. É a desfaçatez dos bolsonaristas defendendo o armamentismo como defesa; e vem fantasiada de amor pelos odientos lulopetistas contra adversários.

Este rancor cai por terra com a pregação de Mahatma Gandhi: Acusado de covarde, ele retrucou: – “A não-violência e a covardia não combinam. Posso imaginar um homem armado até os dentes que no fundo é um covarde. A posse de armas insinua um elemento de medo, se não mesmo de covardia. Mas a verdadeira não-violência é uma impossibilidade sem a posse de um destemor inflexível”.

A “Não-Violência” é o que nós, tuiteiros independentes da polarização, praticamos.

 

 

DO IMPOSSÍVEL

MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.com.br.)

Lembro-me do pensamento, mas esqueci a origem e o nome do autor que deve ter sido um realista escrevendo que “o impossível é aquilo que acontece todos os dias”. É um prêmio da Loteria que sai para alguém, ou a prisão de fugitivos da Penitenciária de “Segurança Máxima” de Mossoró depois de 50 dias de buscas interrompidas….

A palavra Impossível dicionarizada é um adjetivo de dois gêneros e substantivo masculino, que o “Oxford Languages” define como aquilo que não pode ser, existir ou acontecer, trazendo o esdrúxulo exemplo “nascer um cavalo de uma galinha”. O nosso idioma herdou do latim “impossibĭle”, significando que não é possível; que não pode existir; que não pode realizar-se.

Há, porém, exemplos históricos desmentindo o irrealizável. Meus amigos que amam o Teatro possivelmente considerarão impossível o que a História nos conta sobre Shakespeare que sem condições pecuniárias de encenar um castelo, botava um cartaz no palco escrito; “isto é um Castelo”.

O matemático holandês Ludolph van Ceulen, que acrescentou ao famoso “Pi” algumas das suas relações decimais já calculadas, perseguiu mais uma, sem conseguir encontrá-la para juntar às outras 35 já conhecidas.  Julgou ao fim da vida ser incalculável o acréscimo; seis anos após sua morte estudiosos ingleses acharam o número 707.

Na década de 1940, quando meninos assistíamos a série Flash Gordon, com foguetes, telefones celulares no pulso à guisa de relógio, e interlocuções por vídeo em telas, achávamos inacreditável que viesse a ocorrer. A Televisão já fora inventada, foguetes foram ejetados na guerra  e levou somente 30 anos para o celular aparecer….

Os cristãos autênticos jamais imaginaram a distorção das palavras de Jesus o Mestre da Galileia. Suas parábolas sublimes ao nível popular foram mais tarde ocultas pelo latim, uma língua morta, usada pela Igreja Católica Imperial. Hoje, o papa Francisco, falando a linguagem do povo, promove avanços sócio-políticos que eram julgados como difíceis no Vaticano.

Assim se desmente o sentido da eternidade. Não são eternos os nossos entendimentos, as celebridades, as investigações científicas, nem os cânones burocráticos de uma religião.

Registra uma historieta hollywoodiana que a 20th Century Fox homenageou a atriz Greta Garbo mandando cunhar uma medalha de ouro com o perfil dela com o lema “À Glória Eterna”. Uma das minhas filhas, a que está comemorando 44 anos de idade, não sabe quem foi Greta Garbo….

Sobre o cinema, lembro que disseram que colapsaria com o surgimento da televisão; na verdade, as salas de exibição definharam; mas os produtores cinematográficos logo se adaptaram, levando os filmes para a telinha, que virou telona e manteve a arte mais viva do que nunca. O impossível aconteceu.

O incogitável também fraquejou com o Vaticano deixando de lado o Index Proibitório, que impedia a leitura de livros e punia os seus autores até com a excomunhão. Hoje, repetimos sem temor a frase de Oscar Wilde: “Não existem livros morais ou imorais. Os livros são bem ou mal escritos”.

No Brasil atual, os políticos mostram inconfessáveis extravagâncias, avanços no Erário e o desprezo pelo futuro do Brasil e das gerações vindouras. Mas não será para sempre. O genial Maquiavel, estudioso da política, previu isto, escrevendo n’ “O Príncipe” que tudo o que tem começo, tem fim.

Então, que não dure uma eternidade o final da desgraçada polarização entre Bolsonaro e Lula, populistas corruptos auto assumidos fraudulentamente como “de direita” e “de esquerda”.

Como ambos usam a religião para ludibriar. Lembramos aos cristãos seus seguidores a frase bíblica do livro de Lucas, capítulo 1, versículo 37, enfatizando que só a divindade tem a exclusividade de realizar qualquer coisa; lá está escrito: “somente para Deus nada é impossível”.

O ESPIRITUALISMO

MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.com.br)

Há quem insista em tagarelar nos nossos ouvidos conceitos sobre a vida e a morte; lembram-me uma anedota que ouvi anos atrás e nunca a esqueci pelo conteúdo sarcástico, virtuoso e educativo.

A ironia pode ser virtuosa, sim; não ofende quem quer impor a sua vontade se abstendo de aceitar opinião contrária; foi assim que se desenvolveu a historieta citada: “Na antiga Atenas, Aristóteles caminhava pela Ágora suportando comedidamente a conversa de um cidadão que fuxicava sobre algumas personalidades da época; aquele parou de repente e perguntou se a sua loquacidade não perturbava as meditações filosóficas do interlocutor.

“– ‘Em nada me aborrece’, respondeu Aristóteles, – ‘Pode continuar; eu não o escuto’’”. Foi mais elegante do que Carlos Lacerda, respondendo ao aparte de um adversário que retrucou seu discurso, dizendo: – “As suas palavras entram no meu ouvido por um lado e saem pelo outro”. Lacerda foi curto e grosso: – “É a primeira vez que o ouço esta negação da Física; o som não se propaga no vácuo”.

Ao contrário do Filósofo e do brilhante jornalista, presto muita atenção aos que trazem ideias diferentes das minhas; é o caso do Espiritualismo, a crença de que a morte não é um fim, leva à vida eterna.

Trata-se de uma polêmica que vem de muito longe. Segundo estudiosos já era aceita no período Paleolítico, com os rituais de sepultamento dos mortos e o culto aos ancestrais. Chegou ao Antigo Egito, com Livro dos Mortos atestando a sobrevivência do espírito e orientando o falecido a se preparar para isto.

O Antigo Testamento, reverenciado por judeus e cristãos, registra a mediunidade e a] proibição de Moisés à “consulta aos mortos”; assim como fez o primeiro rei de Israel, Saul, invocando o espírito de Samuel com a ajuda de uma necromante.

Na Grécia Antiga, Homero trouxe na Odisseia a crença em que as almas dos mortos habitavam o Hades e que era possível entrar em contato com eles. Não ficou só, o filósofo Sócrates acreditava na imortalidade da alma.

Na Roma Antiga, que sofreu forte influência religiosa dos gregos, homenageava-se os mortos com um festival, a “Parentália“, celebrado anualmente de 13 a 21 de fevereiro; mais tarde sob a influência do Mitraísmo, o catolicismo adotou um feriado no Calendário Juliano dedicado às visitas aos túmulos familiares.

Quando os conquistadores espanhóis chegaram ao México e à Mesoamérica, viram a comemoração do Dia dos Mortos pelos astecas e maias. Essa cultura ancestral se estende até os dias de hoje com a visita aos cemitérios . levando aos entes queridos flores, velas, incensos, alimentos e bebidas. Reverenciam “La Catrina” – a caveira –, que é o símbolo do “Día de los Muertos”.

É difícil ajuizar como o culto dos mortos chegou ao Brasil antes da conquista portuguesa, mas está comprovada no encontro das Urnas Funerárias Marajoaras que foram usadas nos rituais funerários, ícones que se faziam presentes na iniciação dos jovens guerreiros e no festival da moça nova.

Afirmam os antropólogos que as festividades das Urnas Marajoaras lembravam a morte e os antepassados. Tive a oportunidade de ver e examinar a arte das urnas marajoaras no Museu Nacional, antes do criminoso incêndio ocorrido pela negligência dos seus curadores.

As peças atraíam nosso olhar pelo seu colorido vermelho e preto sobre fundo branco, com incisões e excisões de figuras antropomórficas e zoomórficas pintadas com esmero na combinação das cores.

A pesquisa arqueológica na Ilha de Marajó ecoa os conceitos espiritualistas que vieram mais tarde Brasil com as investigações científicas de Alan Kardec, que a minha mãe adotava, participando da Federação Espírita Brasileira.

Hoje temos uma dissidência do Espiritismo Kardecista, a “Conscienciologia”, divulgada pelo cirurgião plástico e médium brasileiro Waldo Vieira. Este estudo se dedica a conscientizar as pessoas da importância das experiências extra corporais que segundo Waldo, comprovam a existência da alma e a reencarnação.

Não fora o religiosismo que acompanha o espiritualismo, eu poderia expor os meus ouvidos à defesa da vida post-mortem.