O ESPIRITUALISMO
MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.com.br)
Há quem insista em tagarelar nos nossos ouvidos conceitos sobre a vida e a morte; lembram-me uma anedota que ouvi anos atrás e nunca a esqueci pelo conteúdo sarcástico, virtuoso e educativo.
A ironia pode ser virtuosa, sim; não ofende quem quer impor a sua vontade se abstendo de aceitar opinião contrária; foi assim que se desenvolveu a historieta citada: “Na antiga Atenas, Aristóteles caminhava pela Ágora suportando comedidamente a conversa de um cidadão que fuxicava sobre algumas personalidades da época; aquele parou de repente e perguntou se a sua loquacidade não perturbava as meditações filosóficas do interlocutor.
“– ‘Em nada me aborrece’, respondeu Aristóteles, – ‘Pode continuar; eu não o escuto’’”. Foi mais elegante do que Carlos Lacerda, respondendo ao aparte de um adversário que retrucou seu discurso, dizendo: – “As suas palavras entram no meu ouvido por um lado e saem pelo outro”. Lacerda foi curto e grosso: – “É a primeira vez que o ouço esta negação da Física; o som não se propaga no vácuo”.
Ao contrário do Filósofo e do brilhante jornalista, presto muita atenção aos que trazem ideias diferentes das minhas; é o caso do Espiritualismo, a crença de que a morte não é um fim, leva à vida eterna.
Trata-se de uma polêmica que vem de muito longe. Segundo estudiosos já era aceita no período Paleolítico, com os rituais de sepultamento dos mortos e o culto aos ancestrais. Chegou ao Antigo Egito, com Livro dos Mortos atestando a sobrevivência do espírito e orientando o falecido a se preparar para isto.
O Antigo Testamento, reverenciado por judeus e cristãos, registra a mediunidade e a] proibição de Moisés à “consulta aos mortos”; assim como fez o primeiro rei de Israel, Saul, invocando o espírito de Samuel com a ajuda de uma necromante.
Na Grécia Antiga, Homero trouxe na Odisseia a crença em que as almas dos mortos habitavam o Hades e que era possível entrar em contato com eles. Não ficou só, o filósofo Sócrates acreditava na imortalidade da alma.
Na Roma Antiga, que sofreu forte influência religiosa dos gregos, homenageava-se os mortos com um festival, a “Parentália“, celebrado anualmente de 13 a 21 de fevereiro; mais tarde sob a influência do Mitraísmo, o catolicismo adotou um feriado no Calendário Juliano dedicado às visitas aos túmulos familiares.
Quando os conquistadores espanhóis chegaram ao México e à Mesoamérica, viram a comemoração do Dia dos Mortos pelos astecas e maias. Essa cultura ancestral se estende até os dias de hoje com a visita aos cemitérios . levando aos entes queridos flores, velas, incensos, alimentos e bebidas. Reverenciam “La Catrina” – a caveira –, que é o símbolo do “Día de los Muertos”.
É difícil ajuizar como o culto dos mortos chegou ao Brasil antes da conquista portuguesa, mas está comprovada no encontro das Urnas Funerárias Marajoaras que foram usadas nos rituais funerários, ícones que se faziam presentes na iniciação dos jovens guerreiros e no festival da moça nova.
Afirmam os antropólogos que as festividades das Urnas Marajoaras lembravam a morte e os antepassados. Tive a oportunidade de ver e examinar a arte das urnas marajoaras no Museu Nacional, antes do criminoso incêndio ocorrido pela negligência dos seus curadores.
As peças atraíam nosso olhar pelo seu colorido vermelho e preto sobre fundo branco, com incisões e excisões de figuras antropomórficas e zoomórficas pintadas com esmero na combinação das cores.
A pesquisa arqueológica na Ilha de Marajó ecoa os conceitos espiritualistas que vieram mais tarde Brasil com as investigações científicas de Alan Kardec, que a minha mãe adotava, participando da Federação Espírita Brasileira.
Hoje temos uma dissidência do Espiritismo Kardecista, a “Conscienciologia”, divulgada pelo cirurgião plástico e médium brasileiro Waldo Vieira. Este estudo se dedica a conscientizar as pessoas da importância das experiências extra corporais que segundo Waldo, comprovam a existência da alma e a reencarnação.
Não fora o religiosismo que acompanha o espiritualismo, eu poderia expor os meus ouvidos à defesa da vida post-mortem.
” Perdoar é transferir a Deus o julgamento. Mas Deus não impede os bons de se defenderem dos maus.”
” O que não é possível ao Homem, para Deus é sempre possível.”