Arquivo do mês: março 2024

HOMO DUPLEX

MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.com.br)

Paulo de Tarso, judeu da elite, que se tornou o mais importante agitador do Cristianismo, escreveu numa das suas epístolas: “Existem em mim dois homens”; e o foi post-mortem ao ser canonizado pela Igreja Católica, como pessoa e santo.

Assim, a tese de Émile Durkheim do “Homo Duplex” – que levou o famoso escritor inglês Joseph Conrad a se definir como tal, igualmente a São Paulo, passa a ser uma classificação antropológica na evolução da espécie humana.

Já tínhamos o quadro largamente difundido pela Antropologia Evolucionária no seriado que traz os “Homo habilis”; Homo ergaster; “”Homo erectus” e “Homo neanderthalensis” que tem início com os homídeos bi-pedalistas que usaram as mãos para fazer ferramentas até os dias de hoje, em que somos representantes do “Homo sapiens”.

Charles Darwin foi o primeiro a propor a relação de parentesco dos humanos com os antropoides (grandes macacos), e aprofundando, os estudos científicos mostram que o gênero Homo se destacou pelo desenvolvimento do sistema nervoso e da inteligência.

A evolução da espécie humana começou a seis milhões de anos, período em que a população de primatas do noroeste da África se dividiu em duas linhagens que evoluíram independentemente. O primeiro grupo permaneceu no ambiente da floresta tropical e o outro emigrou para diversas regiões planetárias.

Comprovando esta exposição, foram encontrados fósseis de ambos grupos, com os migrantes aparecendo em pesquisas arqueológicas na Europa, na Ásia e sul da Sibéria. A presença do Homo Sapiens em determinado momento da nossa história ainda não tem uma data esclarecida, mas ao tornar-se único do gênero Homo no planeta, após a extinção das outras espécies, é de cerca de 200.000 anos.

Nós somos estas criaturas que venceram e sobreviveram. Estamos classificados, segundo a Psicanálise, como “personalidades”, cerebralmente constituídas de consciente, pré-consciente e inconsciente; e é o consciente que nos dá as percepções, as memórias, os sentimentos e, segundo os freudianos, até as fantasias….

Isto, em estado normal, nos oferece todas as condições de viver em sociedade agindo nas ações intelectuais e políticas. Infelizmente, surgem problemas; um deles é aquele que chamávamos de “dupla personalidade” que os estudiosos da mente classificam hoje como Transtorno Dissociativo de Identidade.

O TDI consiste, na convicção extrema de uma ideia ou, contraditoriamente, estar sempre mudando de opinião, variando o comportamento insistentemente. Pesquisas feitas chegaram à Bipolaridade, a influência de dois polos cerebrais divergentes provocando a alternância comportamental entre euforia e depressão.

O indivíduo portador de bipolaridade sofre a oscilação do humor, manias e depressão, mostrando duplicidade e desequilíbrio inconscientes. Adotam, sem querer, atitudes inconcebíveis, como andar saltando sobre as linhas da calçada ou aperfeiçoando-se em alguma atividade até ilegal ou condenável.

Por isto, os duplex são valorizados por alguns governos pelas habilidades adquiridas. Ouvi dizer que na França e no Liechtenstein foram aproveitados antigos contrabandistas como agentes alfandegários; e com conhecimento de causa, atuaram impecáveis.

No primeiro governo de Getúlio Vargas, quando a moeda de Réis foi substituída pelo Cruzeiro, tiraram um moedeiro falso da cadeia, nomeando-o técnico na Casa da Moeda para criar o novo meio circulante metálico.

Agora, diante da realidade que nos cerca, temos que reconhecer que o Homo Duplex não está só. Os dúplices não são apenas os seres humanos, mas tudo o que nos cerca; e, além disto, as circunstâncias e as ocorrências também apresentam a sua duplicidade.

Está comprovado constantemente na chamada “grande mídia”. As pautas variam de acordo com os interesses das forças ocultas…. Variam entre a ênfase e a omissão no “Caso Marielle”, dá-se um inusitado critério ao besteirol das dormidas de Bolsonaro na Embaixada da Hungria e deleta-se as calúnias do casal Lula da Silva sobre os móveis do Alvorada.

Da Mídia Duplex, as informações variam camaleonicamente; vão do verde para o vermelho e vice-versa, com seus “especialistas” alimentando as massas bipolarizadas pelo culto às personalidades políticas.

DOS INTELECTUAIS

MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.com.br)

Recebi uma crítica nos padrões democráticos que me inspirou este artigo. Veio de um jornalista atuante nas redes sociais, condenando-me por citar a frase do general Villas Boas que “substituir uma ideologia pela outra não contribui para a elaboração de uma base de pensamento que promova soluções concretas para os problemas brasileiros”.

Acho que este pensamento é irreparável, mesmo vindo de quem veio, com o perfil que apresenta, até mesmo agora, desfilando no noticiário dos jornais pela participação da esposa nas tramas golpistas de Bolsonaro.

Entretanto, concordo em gênero e número com a afirmação de que as ideologias fraudulentas do esquerdismo lulista e do direitismo bolsonarista nada contribuem para erguer o Brasil, devendo ser afastadas do cenário político, pois não conduzem como futuro digno que almejamos.

Em minha defesa, alicerço a discordância de que “um admirador das ideias de Brizola, não pode referir-se a um defensor da ditadura militar”. Esta posição traz vestígios de ódio; e o meu interlocutor poderia ter aprendido com o anarquista Malatesta, como fiz, estudando, que “devemos seguir ideias, não homens, e rebelarmo-nos contra o hábito de encarnar um princípio numa pessoa”.

Isto resume a condenação ao culto da personalidade vigente no País, adotado por frações intelectuais no atual estágio sócio-político polarizado pelos extremismos populistas. Muitas pessoas com formação educacional ou erudição autodidata perderam o senso crítico da realidade, infelicitados pelas ideologias distorcidas que estimulam o fanatismo.

O revolucionário meio de Comunicação que a Internet dispõe, traz muitos exemplos disto. Com esta observação lembrei-me que preparando-me para o Exame Vestibular, encontrei na estante do meu pai um livro do escritor francês, Julien Benda, que me chamou a atenção: “La trahison des clercs”.

Foi editado em 1927, quase 100 anos atrás; e pelas teses nele defendidas, foi largamente difundido e traduzido para o português como “A traição dos Intelectuais”, na mesma linha do alemão “Verantwortlichkeit der Intellektuellen” e do inglês “Treason Of The Intellectuals”.

Benda, que depois vim conhecer melhor, teve o perfil de questionador do autoritarismo, inimigo do nazismo e da fascista “Action Française”. Por isso, seria considerado hoje um pensador “de esquerda”; mas à sua época foi o contrário, o apontaram como conservador e até antiprogressista.

A intelectualidade viu na teoria “blendista” sobre as pessoas que trabalham e produzem exclusivamente com o intelecto, uma elucubração estranha (por nova) causando muita polêmica ao defender que o intelectual deve manter-se neutro e distanciado dos partidos; e fez mais. Exigiu de quem usa como ferramenta a mentalidade que a sua criação deve  limitar-se à defesa dos valores universais da verdade, justiça e liberdade.

Enfim, para Blenda, o intelectual deve se abster das paixões políticas; e que por sua própria natureza, o trabalho de inteligência deve conter-se de alinhamentos; que o seu protagonista deve apenas observar e analisar os movimentos políticos como o nacionalismo, do marxismo, do racismo, do sionismo, da xenofobia e do militarismo.

Considero tais proposições insuportáveis para alguns letrados brasileiros pelas heranças culturais que recebemos; acho, porém, que serve de alerta para os nossos jornalistas para não caírem na esparrela da adoção ideológica, incompatível com o exercício profissional. Prendi-me alguns vezes assim, e faço autocrítica.

O “prato feito” que sai das cozinhas partidárias com a salada mista de doutrinas falseadas e as malpassadas proteínas das inverdades, é servido para manter o sistema; e as promessas dos “líderes” partidários ou governistas, são as lavagens cerebrais que garantem a polarização, o fraudulento embate entre populistas para manter entre si a alternância no poder.

 

 

 

 

QUERIDOS PETS

MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.com.br)

Temos colegas no “X” que acham graça quando trocamos fotos e filmetes de gatos e cachorros que correm na Internet. Da minha parte vejo nestes “Pets” um dos complementos maravilhosos que a domesticação dos animais nos deu. Uso a palavra Pet, criticada pelos xenófobos antiamericanos, mas vencedora e generalizada entre nós.

É dicionarizada como substantivo masculino para designar animal de estimação; é curiosa a sua etimologia, emaranhada do latim para cá. Vem diretamente do inglês, mas teria sido herdada do francês “petit” que significa pequeno, e teria origem latina “petito/pittinus”.

Nos imperiais Estados Unidos a palavra Pet é consagrada; os franceses chamam de “animaux de compagnie”, que, em português, significa animais de companhia. No Brasil, adotou-se indiscutivelmente Pet, de onde se deriva Pet Shop, loja que vende produtos para animais.

Nossos indígenas têm para os bichinhos domésticos o nome de “Xerimbabo”, que em tupi significa “coisa muito querida”, este termo ainda é coloquial entre os habitantes dos estados do Norte; e o costume de tê-los familiarmente é sempre solicitado por crianças.

O politicamente correto, traz uma exceção no seu besteirol, adotando a expressão “Tutores” para o que antigamente chamávamos “Donos” dos xerimbabos…. Mas, por outro lado, trouxe a condenação para a domesticação de animais silvestres, uma idiotice nascida por falta de conhecimento do mundo.

Além dos cachorros e gatos que nos fazem companhia e que interagem conosco, é costume pelo mundo afora a criação de outros animais com a mesma finalidade; na África continental adotam avestruzes, camelos e cabras, em Madagascar, lêmures, na Ásia elefantes, cobras e macacos prego, na Austrália, kangurus, e, na China, pandas…

Na América central é comum criar-se camaleões e, por herança indígena, adotamos a companhia de alguns pássaros canoros, papagaios e saguis. Peixes de aquário estão presentes em todos os países; e o meu pai tinha uma estima especial por um jabuti que trouxe do Pará.

Quando morei em Natal, além de cachorros, gatos e papagaio, mantive e cuidava também de dois sapos cururus e um viveiro de mosquitos melíferos.

Considero a convivência com o animal de grande responsabilidade. Eles precisam de cuidados muito além da alimentação; devem ser observados como a melhor forma de resguardá-los de problemas com insetos, viroses e enfermidades. Meu filho  Henrique observou que um dos seus cachorros passou a beber muita água e levando-o à Clínica Veterinária, constatou-se que estava com diabetes….

Nos grandes centros, onde se goza de boa assistência médica especializada, aparecem problemas a corrigir. Por exemplo, criar cachorros em apartamentos é complicado, por que precisam necessariamente sair à rua e o cuidador deve recolher as suas fezes por educação. Vi numa Praça de São José da Costa Rica uma frase que mandei para a Prefeitura do Rio, mas fiquei sem resposta. É perfeita: “Ellos hacen por necessidad, usteds limpan por obligación”.

Com a minha mulher – que os adora – tutoramos dois gatos: Lennon e Ringo. Graças a observação deles, entendemos plenamente o porquê dos antigos egípcios os adorarem como deuses, e os celebramos Maomé por uma história que ouvi:

“O profeta estava em meditação e um gato se enroscou na manga de sua túnica e dormiu profundamente. Chegada a hora de rezar e Maomé cortou a manga com uma tesoura para não o acordar; como o gato pareceu sorrir-lhe, acariciou sua cabeça com a mão e concedeu-lhe o privilégio de somente cair sobre as próprias patas…”

Acho que quem não gosta de gato são aqueles que nunca os observaram. O poeta Ronsard deixou-nos um pensamento à reflexão: – “Os gatos são dotados de um espírito profético e os egípcios faziam muito bem divinizando-os”.

Ocorre conosco aqui em casa: quando um de nós, eu ou minha mulher adoecemos, sempre tem um que se aconchega na cama com o enfermo.

CRUZADAS & CRUZADA

MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.com.br)

Não tem razão o colega do “X” que com uma msg criticou-me pelo que considera antireligiosísmo nos meus artigos e crônicas; eu poderia responder-lhe pela mesma via, mas preferi fazê-lo publicamente no Blog.

Assumo os comentários com dúvidas e reprovação sobre as fantasias do Antigo Testamento, desacreditando que Matusalém tenha vivido 969 anos, na lenda de Adão e Eva (a não ser como metáfora) e que o príncipe egípcio Moisés abriu as águas do Mar Vermelho e tenha conversado com Deus acocorado diante de uma sarça ardente.

Isto, para mim, não é ser contra a religião. Pelo contrário, poucos defendem a liberdade religiosa como eu, que desde a pré-adolescência estudo as diversas crenças adorativas, no correr da História da Humanidade.  Até já pensei em escrever um livro sobre elas.

Conheço-as desde o animismo primitivo à dualidade do mazdeísmo na antiga Pérsia, do politeísmo nos primeiros impérios da Antiguidade, das manifestações orientais e do monoteísmo judaico-cristão.

Defensor convicto da liberdade de crença, não me furto, porém, de criticar desmandos praticados em nome de Deus; denunciando sempre a hipocrisia piedosa e o fanatismo estúpido e xenófobo. Faço-o com base em pesquisas históricas de boa origem; dos muitos estudiosos que através dos tempos mostram a adulteração do cristianismo primitivo ao se assumir como Catolicismo, religião oficial do Império Romano.

… E foi pelo imperialismo que se formou no Ocidente uma nova concepção religiosa por sua organização burocrática copiada de antigos cultos, principalmente do mitraísmo, e por coroar o humilde Jesus de Nazaré em Rei dos Reis…

Uma vez poderosa, a Igreja Católica, Apostólica e Romana assumiu historicamente horrores praticados. Quem há de negar a violência imposta na criação, exaltação e desempenho das Cruzadas? Das referências que se tem deste desvario movido para libertar a chamada “Terra Santa”, temos o fundamento do antissemitismo e antiislamismo ocidentais.

Sobre as cruzadas, encontrei um texto do escritor ítalo-argentino Pitigrilli, que não assino embaixo, mas o levo em conta para as minhas análises. Saiu no livro “O Sacrossanto Direito de não Ligar” o comentário intitulado “O malogro total das Cruzadas” que não lograram cumprir seu objetivo de libertar santo sepulcro dos muçulmanos.

A Primeira Cruzada, criada pelo papa Urbano II em 1095 para tornar os cristãos inimigos dos muçulmanos, a História registra que esta expedição reuniu “duzentos e sessenta mil maltrapilhos, esfomeados, egressos das galés e prostitutas, conduzidos por nobres feudais que tiveram o propósito de conquistar cidades orientais para si; mas o Santo Sepulcro ficou onde estava, tendo no entorno seis milhões de cadáveres.

Pittigrilli mostra que sem qualquer devoção e humanismo as Cruzadas trouxeram vantagens; para a sua formação, foram recrutados todos os aventureiros da Europa; e esses malfeitores encontraram de passagem casas para saquear, mulheres indefesas para ultrajar e gente inocente para exterminar.

E o resultado foi pior, vendo na Palestina a convivência pacifica entre judeus e árabes, os cruzados, acusaram os primeiros de “crucificar Jesus Cristo” e os outros demonizados como adeptos do “infiel” Maomé.

Entre suas consequências, surgiu a caça às bruxas, a brutal repressão contra os perseverantes seguidores das antigas religiões; uma manifestação fanática que não se restringiu aos druidas e xamãs, mas voltou-se também contra os chamados “heréticos”,  críticos dos dogmas e dos costumes licenciosos do papado.

Esta perseguição insana proporcionou em 1233 a criação da Inquisição pelo papa Gregório 9º, batizada de “Santo Ofício”, que nada teve de santo; pois foi uma ação demoníaca, cruel e desumana, comparável ao que o nazismo fez no século passado.

Há quem ignore, e é bom dizer que esta ingerência genocida não se limitou aos católicos romanos; teve também a participação de protestantes, como se viu no suplício sofrido por Calvet ordenado por Calvino, que exigiu lenha verde na fogueira que queimou o condenado, “para que ele sofresse mais”.

Com esta descritiva vem a minha adoção ao princípio de que perseguir, torturar e matar em nome de qualquer religião é crime hediondo condenável; por isto movo a minha “cruzada” para condenar as guerras religiosas, por serem o exemplo mais do que perfeito da negação de Deus.

DA JUSTIÇA

MIRANDA SÁ (E-mail: mirandasa@uol.com.br)

Fica difícil desenvolver o tema sem separar duas justiças, a Justiça Aplicada, dos tribunais, órgãos burocráticos de governo composto de juízes e promotores nomeados para interpretar a Lei; e a Justiça Teórica, segundo Adeodato (que os acadêmicos de Direito conhecem), “a virtude moral que rege o ser espiritual no combate ao egoísmo biológico, orgânico, do indivíduo”.

Na Justiça Aplicada, a apreciação de processos de partes em litígio, casos e pessoas, é sempre uma balança que, em tese, deveria manter o equilíbrio entre as pretensões e interesses conflitantes na vida social da comunidade.

A Justiça Teórica foi aquele passo à frente para a civilização, criada dos primeiros impérios da Antiguidade. O exemplo disto está nos contos das Mil e Uma Noites, que levou o lendário califa Harun al-Rashid à ficção.

O Califa, de acordo com historiadores, é o símbolo da Era de Ouro Islâmica. Reinou de 786 e 809, quando a Europa vivia mergulhada na Idade Média, e o Islã atravessava uma era marcando economicamente a fartura de bens materiais e o desenvolvimento cultural nos campos da Arquitetura, da Ciência com a pesquisa e tradução para o árabe das grandes obras do grego clássico, hindu e persa.

Com uma formação intelectual vasta, abrangendo economia, geografia, história, música, poesia e religião, Harun fundou a lendária biblioteca Bayt al-Hikma (“Casa da Sabedoria”) em Bagdá, e lá costumava imitar Salomão, presidindo julgamentos.

Nas Mil e Uma Noites fictícias temos a história de que ele sonhou que lhe apareceu um anjo e levou-o para o céu e lá chegando disse-lhe: – “Califa, concedeste liberdade a nove prisioneiros a pedido de amigos e familiares, mas restou um na prisão; Alah intervém por ele”.

No amanhecer do dia seguinte, Harun al-Rashid chamou o Vizir, e perguntou se havia alguém na prisão. – “Há um peregrino que foi preso junto a nove malfeitores e se diz inocente” falou o ministro.

– “Traga-o a minha presença”…. E quando o prisioneiro chegou, o Califa ordenou que falasse, ouvindo dele a história de que os policiais haviam perseguido uma quadrilha de dez indivíduos, mas um escapou e eles temeram ser acusados de ter facilitado a fuga; então prenderam-no para completar a conta, e ele que não teve quem apelasse por ele.

A historieta das Mil e Uma Noites conta que Harum sentiu a sinceridade dos inocentes no rosto e na voz do preso; ordenou a sua soltura, oferecendo-lhe um café da manhã com frutas, leite, mel, pães e queijos. Depois mandou-o banhar-se e receber roupas adequadas para conviver na sua corte para onde foi convidado.

A Justiça do esplendoroso reino de Harun al-Rashid teve uma intervenção divina para ser cumprida libertando um preso sem culpa.

Aqui no Brasil, nos dias atuais, os juízes não ouvem Deus, adoram o Bezerro de Ouro, como se vê, assistindo-se envergonhadamente um ministro do 5TF, Dias Toffoli, sentenciar em defesa dos corruptos e corruptores condenados pela Lava Jato.

Não há qualquer explicação para isto, a não ser o acumpliciamento de quem esteve envolvido nas tramoias do lulopetismo com as empreiteiras, tendo sido denunciado como usufruidor de propinas da Odebrecht sob o codinome “Amigo do Amigo do Meu Pai”.

Assim temos a Justiça dos Juízes, que vem degradando o conceito de Justiça, com ardis como o que permitem cônjuges e parentes de magistrados advogarem causas que eles julgam; e, no caso insólito de Toffoli, foi a mulher dele a autora da defesa.

A revoltante decisão monocrática de suspender o pagamento das multas reconhecidas pelos corruptos e corruptores exige a convocação do coletivo para derrubá-la. Não o fazendo o presidente da Corte passa a ser cúmplice da Injustiça.