Arquivo do mês: janeiro 2017

Castro Alves

Amar e ser amado

Amar e ser amado! Com que anelo
Com quanto ardor este adorado sonho
Acalentei em meu delírio ardente
Por essas doces noites de desvelo!
Ser amado por ti, o teu alento
A bafejar-me a abrasadora frente!
Em teus olhos mirar meu pensamento,
Sentir em mim tu’alma, ter só vida
P’ra tão puro e celeste sentimento:
Ver nossas vidas quais dois mansos rios,
Juntos, juntos perderem-se no oceano —,
Beijar teus dedos em delírio insano
Nossas almas unidas, nosso alento,
Confundido também, amante — amado —
Como um anjo feliz… que pensamento!?

Castro Alves

MOTE

“Das almas grandes a nobreza é esta.”

GLOSA

AQUI, onde o talento verdadeiro
Não nega o povo o merecido preito;
Aqui onde no público respeito
Se conquista o brasão mais lisonjeiro.

Aqui onde o gênio sobranceiro
E, de torpes calúnias, ao efeito,
Jesuína, dos zoilos a despeito,
És tu que ocupas o lugar primeiro!

Repara como o povo te festeja…
Vê como em teu favor se manifesta,
Mau grado a mão, que, oculta, te apedreja!

Fazes bem desprezar quem te molesta;
Ser indif’rente ao regougar da inveja,
“Das almas grandes a nobreza é esta.”

Gregório de Matos

Cresce o desejo,

falta o sofrimento,

Sofrendo morro,

morro desejando,

Por uma, e outra parte estou penando

Sem poder dar alívio a meu tormento.

Se quero declarar meu pensamento,

Está-me um gesto grave acobardando,

E tenho por melhor morrer calando,

Que fiar-me de um néscio atrevimento.

Quem pretende alcançar, espera, e cala,

Porque quem temerário se abalança,

Muitas vezes o amor o desiguala.

Pois se aquele, que espera se alcança,

Quero ter por melhor morrer sem fala,

Que falando, perder toda esperança.

 

  • Comentários desativados em Gregório de Matos

ELEIÇÕES

MIRANDA SÁ (E-mail: mirandasa@uol.com.br)

“Nessas eleições tem que andar com óleo de peroba em spray, porque tem muita cara de pau por aí”    (El Padre)

Estamos às vésperas de duas eleições importantes. Elas representam a indicação dos presidentes da Câmara Federal e do Senado. Os nomes que aparecem encabeçando as chapas das mesas diretoras nos enojam e nos fazem duvidar se vivemos mesmo numa Democracia – com “D” maiúsculo.

O substantivo feminino “eleição” é dicionarizado como “ato de eleger”, o que não quer dizer muita coisa… A democracia grega elegia os “arcontes”, uma espécie de primeiro ministro, e nos países de língua neolatina, a palavra vem do latim, “electìo”, que significa “escolha”. Eleger é escolher.

O processo democrático para designar dirigentes a cargos públicos é uma votação para eleger pessoas afim de exercer um poder. Neste caso, a República Brasileira é falha: elegemos os representantes dos poderes Legislativo e Executivo, mas não os membros do Judiciário.

As tais eleições nas casas do Congresso ocorrerão no 2 de fevereiro sem a participação popular; seus membros escolherão os dirigentes, cujos nomes saem do bolso do colete dos “líderes” e um deles é sempre bafejado pela Presidência da República.

Na Câmara paira uma dúvida: o seu regimento proíbe que o presidente da Casa dispute a reeleição. Exercendo o mandato após o afastamento de Eduardo Cunha, o deputado Rodrigo Maia lançou-se candidato desprezando o Regimento. Argumenta que assumiu apenas um “mandato-tampão”, mas sofre contestação.

Juristas diversos consideram inconstitucional a reeleição de Maia, que ficou determinado oficialmente que cumpriria seu mandato até fevereiro de 2017. Está nas atas da Câmara. Caberá, entretanto, ao STF decidir sobre a constitucionalidade desta candidatura.

Maia é candidato da base do governo e tem o apoio de Temer “por baixo dos panos”… E, até agora, não surgiram candidatos para enfrenta-lo com força. Os que apareceram vêm do “centrão” a bancada indefinida que elegeu Eduardo Cunha e que se julga em condições de eleger um dos seus.

Assim apareceram Jovair Arantes, do PTB, Rogério Rosso, do PSD e André Figueiredo, do PDT, este último apresentando-se como representante do lulopetismo, esperando que o afastamento de Maia permita-lhe ser o candidato do PT e satélites, como PCdoB, Psol e outros menos expressivos.

No Senado, o quadro é ainda mais sombrio. O candidato único é Eunício de Oliveira, indicado por Renan Calheiros, o que diz tudo. Empresário do agronegócio, apesar de possuidor de vasto latifúndio e cerca de setenta imóveis rurais em Goiás, conta com o apoio do lulopetismo.

O cenário destas eleições se complica ainda mais se o STF homologar as delações premiadas dos executivos da Odebrecht, principalmente do “príncipe” Marcelo, e vai piorar ainda mais se Eike Batista for preso, trazendo na bagagem o envolvimento das figurinhas carimbadas envolvidas no processo.

Estamos fartos das artimanhas políticas que se desenrolam nos três poderes da República. É insuportável ver-se que do mesmo jeito com que as facções criminosas dominam os presídios, o Brasil tenha os poderes exercidos por quem trocou o “Curriculum vitae” pela ficha policial.

 

Alex Polari

FOICES

 

E fosse o vento

como rajada

fio de foice

rente ao horizonte

cortando espigas e auroras.

E fosse fosco

o vidro que nos separasse

da paisagem

assim semeador

vulto impreciso pelas grades

colher o que?

que fímbria de esperança

que migalhas de posteridade

disputar com os ratos?

Álvares de Azevedo

Dinheiro

 

Sem ele não há cova- quem enterra
Assim grátis, a Deo? O batizado
Também custa dinheiro. Quem namora
Sem pagar as pratinhas ao Mercúrio?
Demais, as Dânaes também o adoram…
Quem imprime seus versos, quem passeia,
Quem sobe a Deputado, até Ministro,
Quem é mesmo Eleitor, embora sábio,
Embora gênio, talentosa fronte,
Alma Romana, se não tem dinheiro?
Fora a canalha de vazios bolsos!
O mundo é para todos… Certamente
Assim o disse Deus mas esse texto
Explica-se melhor e doutro modo…
Houve um erro de imprensa no Evangelho:
O mundo é um festim, concordo nisso,
Mas não entra ninguém sem ter as louras.

  • Comentários desativados em Álvares de Azevedo

Thiago de Mello

Os astros íntimos

Consulto a luz dos meus astros,
cada qual de cada vez.
Primeiro olho o do meu peito:
um sol turvo é o meu defeito.
A minha amada adormece
desgostosa do que sou:
a estrela da minha fronte
de descuidos se apagou.

Ela sonha mal do rumo
que minha galáxia tomou.
Não sabe que uma esmeralda
se esconde na dor que dou.

A cara consigo ver,
sem tremor e sem temor,
da treva engolindo a flor.
Percorre a mata um espanto.

A constelação que outrora
ardente cruzava o campo
da vida, hoje mal demora
no fulgor de um pirilampo.

Mas vale ver que perdura
serena em seu resplendor,
mesmo de luz esgarçada,
a nebulosa do amor.

ALGORÍTIMO

MIRANDA SÁ (E-mail: mirandasa@uol.com.br)

“Você quer passar o resto da sua vida vendendo água com açúcar ou quer uma chance de mudar o mundo? ” (Steve Jobs)  

Algoritmo foi indicada como “a palavra do ano” pelo dicionário “Oxford”, uma das referências mais importantes do mundo para a catalogação de novas palavras e expressões. É, entretanto, uma palavra antiquíssima, usada na Mesopotâmia e Egito antigos.

Foi usada e popularizada matematicamente por Euclides, um dos grandes professores da famosa escola de matemática de Alexandria, conhecida como “Museu”.

Todavia a sua etimologia é mais recente e discutível: uns pesquisadores citam sua origem no sobrenome Al-Khwarizmi, do matemático persa do século IX Mohamed ben Musa; outros defendem a origem da palavra em Al-goreten (raiz – conceito que se pode aplicar aos cálculos).

O “algorithmus infinitesimais” ´é utilizado para significar “maneiras de calcular com quantidades infinitésimas” (pequenas), uma invenção de Leibniz. Também é conhecido no meio financeiro, como “algos”.

Para se popularizar com a força que tem atualmente, o termo entrou na economia, na política e até ilustrado em receita culinária, como registra Alecio Soares Silva na sua tese de conclusão do curso na Universidade Federal de Campina Grande (Paraíba).

Essa “simplicidade”, porém, não é tão simples… Os algoritmos podem ser muito complexos. Eles “repetem passos (fazem interações) ou necessitam de decisões (tais como comparações ou lógica) até que a tarefa seja completada”.

Essa complexidade está, por exemplo, no conceito de um algoritmo que foi formalizado em 1936 pela Máquina de Turing de Alan Turing e pelo cálculo lambda de Alonzo Church, que formaram as primeiras fundações da Ciência da computação.

Embora não represente, necessariamente, um programa de computador, foi neste campo que matamos a charada: a Ciência da Computação define o uso do computador na realização de várias tarefas e, quando se trata de formar opinião pública, torna-se uma gigantesca força política.

O processo, segundo Christian Sandvig, professor de ciência da informação da Universidade de Michigan, é que “O algoritmo e o usuário coproduzem o feed”: “O computador te observa e aprende com o que você clica. Ao mesmo tempo, você decide como responder ao que ele mostra a você. ”

O Facebook – a rede social mais popular do mundo, com 1,59 bilhão de pessoas conectadas – reconhece que “o volume de conteúdo criado e compartilhado é proporcional ao número de usuários. Assim, o algoritmo é uma forma de permitir que cada pessoa tenha acesso ao que julga mais importante”.

É aí que reside o poder das redes sociais. Muitos tuiteiros desconhecem que a sua atividade comentando, analisando ou denunciando, tornam-se algoritmos, códigos baseados em inteligência artificial que ficam gravados nos sites de comunicação social.

Os algoritmos podem realizar a tarefa usando um conjunto diferenciado de instruções em mais ou menos tempo, espaço, ou esforço do que outros. Dessa maneira, o volume de mensagens se torna uma interação e uma força de expressão notável.

Foi assim que se realizaram as manifestações registradas na “Primavera Árabe” e, no Brasil, a convocação que levou milhões de pessoas às ruas protestando contra a corrupção e a incompetência administrativa do governo Dilma. Também a intervenção das redes sociais contra a nomeação de Lula da Silva para a Casa Civil para livrá-lo da Lava Jato, teve êxito. E assim saiu o impeachment, acabando com a Era PT.

É perfeita a lição de Diego Beas ensinando que “A rede social dotou o cidadão de uma nova e magnífica ferramenta que necessariamente subtrai poder ao Estado”. O algoritmo deve ser abastecido de mensagens contra a corrupção, os privilégios e a impunidade; pela prisão dos corruptos e do seu chefe Lula da Silva. E conquistaremos esta meta!

 

Junqueira Freire

SONETO

 

Arda de raiva contra mim a intriga,

Morra de dor a inveja insaciável;

Destile seu veneno detestável

A vil calúnia, pérfida inimiga.

Una-se todo, em traiçoeira liga,

Contra mim só, o mundo miserável.

Alimente por mim ódio entranhável

O coração da terra que me abriga.

 

Sei rir-me da vaidade dos humanos;

Sei desprezar um nome não preciso;

Sei insultar uns cálculos insanos.

 

Durmo feliz sobre o suave riso
De uns lábios de mulher gentis, ufanos;

E o mais que os homens são, desprezo e piso.

Paul McCartney – Ob-La-Di, Ob-La-Da

  • Comentários desativados em Paul McCartney – Ob-La-Di, Ob-La-Da