Arquivo do mês: abril 2025

DA ROTINA

MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.com.br)

Uma das definições de Rotina que mais me agrada é vê-la como a forma organizada de viver. Há pessoas que não consideram este tipo de rotina como norma, dizendo que quem o adota tem uma vida de tédio, sem a graça do aventureirismo, a fuga dos padrões e o enfrentamento do inusitado.

É aí que encontro na sabedoria popular a resposta democrática para quem pensa diferente, seguindo o ditado: “Em cada cabeça uma sentença”; seja, que cada um interprete e assuma uma posição diante da sua realidade.

Como verbete dicionarizado, Rotina é um substantivo feminino com a etimologia de origem francesa “routine”, significando caminho sempre obedecido e usual e repetida maneira de realizar tarefas cotidianas.

Há figuradamente a definição de “conservadorismo que se opõe ao progresso”. Esta, então, é completamente descabida, como vejo nas redes sociais, principalmente nos grupos em que navego, “Tribo do Bem” e “#BrasilConsciente”, em que os participantes mantêm coerência pessoal, sempre enriquecendo os argumentos.

Confesso que neste meu convívio pouco me preocupa em cobrar posições assumidas diferente das minhas; analiso mais e melhor os protagonistas de fora, para entender o que se passa além da bolha. Desta maneira, estabeleço a rotina de analisar os fatos conforme chegam virtualmente.

Como rotina pessoal, trago o exemplo do que se passou comigo um dia desses, quando ainda convalescente da queda que sofri, fui ao Centro com a minha mulher cumprir duas obrigações intransferíveis: o cadastramento exigido a pessoas da minha idade pelo Ministério da Economia.; e, no Cartório de Títulos, confirmar um pagamento do IPTU já realizado.

Fugi à Rotina, não foi? Mas, ao voltar para casa, entreguei-me por completo ao meu dia-a-dia. Uma partida de Canastra às 11,30h e o aperitivo do almoço; almoçado, fui à sesta – a notável rotina dos mexicanos –, cochilando ao som da minha vitrolinha de cds.

Alertado pelo despertador para assistir o jogo do Arsenal contra o Real Madri, assisti um belo espetáculo que me levou ao futebol brasileiro do passado, aquele das jogadas individuais que eu adorava na juventude, nada parecido com o futebol europeu.

Lá na Europa, a atuação em campo dos profissionais obedece a estratégia dos recuos atraindo o adversário para possibilitar o contra-ataque, um esquema psicológico que vem sendo usado pelo técnico flamenguista Davi Luís e esquecido pelo time ao jogar contra o Central de Córdoba, perdendo de 2 x 1…

Após a diversão com o futebol, fui à leitura. Estou relendo o Dicionário Filosófico de Voltaire e concomitantemente folheio o curioso debate de Bertrand Russel com o padre Copleston sobre a existência de Deus.

É assim que levo a vida desde muitos anos. Domesticação, diversão e estudo, a fuga da banalidade que enxameia o noticiário televisivo, idiotizando as massas com debates ensaiados e comentários repetitivos, comprovando o que vaticinou Joseph Pulitzer ao dizer que: – “Com o tempo, uma imprensa cínica, mercenária, demagógica e corrupta formará um público tão vil como ela mesma”.

Do antigo jornalismo contestador, independente e vibrante, sobrou infelizmente um produto degenerado., que exemplificou ao silenciar contra a criminosa censura da ESPN e sem se solidarizar com os jornalistas demitidos pela denúncia que fizeram contra a CBF, um covil de bandidos com tentáculos no STF e na Presidência da República.

Enquanto isso, temos um público vil de cabeça feita pela conspiração midiática do Sistema, mantendo acesa a nojenta polarização dos dois populistas corruptos, Bolso e Lula…. E é este público que observo rotineiramente fora dos grupos que sigo no “X” e no “BS”.

Enquanto mantenho o respeito pela opinião alheia que discorda da minha, a manada garroteada pela polarização discrimina e xinga com ataques pessoais que se sobrepõem ao argumento.

Por isto, venho repetindo rotineiramente a máxima de Lao-Tsé: “Reaja inteligentemente mesmo a um tratamento não inteligente”, exaltando a educação no trato com outrem e a defesa da liberdade da expressão do pensamento. Esta foge do tédio, pela animação no confronto das ideias que desejamos “conservar” política e filosoficamente.

DA MITOLOGIA

MIRANDA SÁ (E-mail: mirandasa@uol.com.br)

Como parece estarmos de volta à exaltação da Cultura, lembrei-me do presente que o Teatro nos dá, desde a antiga Grécia, quando Eurípedes escreveu “Hipólito” (Ιππόλυτος) com um tema que se tornou clássico com a obra da Racine “Fedra”.

Na versão dos dois, temos uma tragédia ambígua descrevendo a desventura de Fedra que era esposa de Teseu e se apaixonou por Hipólito, filho ilegítimo do marido, propondo-lhe a consumação desse amor… E Hipólito recusou-lhe.

A ambiguidade da interpretação mitológica em que um aceita e outro nega, levou-me a relembrar das vésperas da fracassada conspiração golpista e o relatório do Ministério da Defesa sobre as eleições – onde jamais deveria ter se metido -, acendendo uma vela a Deus e outra ao diabo.

De um lado, assegurou a legitimidade das urnas eletrônicas “em nome da verdade” que, segundo o Boletim do Exército, é o símbolo da honradez militar; mas, do outro lado, serviu à ambição do ex-Presidente, levantando a hipótese de um tal “código secreto”.

De secreto já temos os mergulhos na impunidade, com os sigilos de cem anos do Executivo e o orçamento camuflado dos picaretas do Congresso Nacional; com o “Relatório” inventaram mais um, para satisfazer as loucuras golpistas da seita bolsonarista….

A turma adoradora dos “Deuses das Rachadinhas” deveria se preocupar em fazer oposição ao eleito, Lula da Silva, sem deixar que o próprio partido dele, o PT, se encarregue disto como sempre faz. Bastaria aproveitar-se da experiência que assistimos com Bolsonaro, que se derrotou a si mesmo, ao adotar os desvarios extremistas dos filhos.

Para combater Lula, começariam por vê-lo como o Rei da Demagogia, que governa com os malabarismos da pelegagem sindical driblando a Lei para arrancar dinheiro do contribuinte na ânsia de pagar as promessas de campanha.

… E já que comecei surfando nas ondas dos mares Egeu e Jônico que banham a Grécia, vou à figura de Midas, rei da Lídia, que entrou no disse-me-disse do folclore ocidental pela riqueza imensa e distribuição em ouro para conquistar intelectuais com uma espécie de Lei Rouanet da sua época

Por uma concessão do deus Baco, tudo em que Midas tocava virava ouro; por isto, a sua querida filha Phoebe transformou-se em estátua de ouro ao encostar nele. Imitam-no os populistas fascistóides (não importa a ideologia que adotem, sejam de direita ou esquerda) que usam a riqueza nacional para se manter no poder.

Dessa maneira vê-se a disseminação da pandemia populista latina (cuja febre tem alcançado também na Europa francos, normandos e saxões). O princípio desta política é dúbia; enfrenta o contraditório da responsabilidade fiscal com o populismo distributivo.

O populismo é um mergulho na corrupção a fim de conquistar adeptos e comprar votos pensando na futura eleição. Vale para os dois polarizadores eleitorais, Bolso e Lula, aplaudidos e acompanhados por comparsas capazes de tudo, seja nos desvios de conduta, seja no sonho fascistóide de se manter no poder.

De um lado, Bolso se inflou na política praticando o sindicalismo fardado e investindo contra o Erário; foi derrotado na tentativa de reeleição; do outro lado, seu vencedor, Lula, olha somente pelo retrovisor da História fazendo uma política que se limita em distribuir com o dinheiro público esmolas com fito eleitoral.

Ouvimos repetidamente declarações dos atuais ocupantes do poder a intenção de seguir na trilha pantanosa da irresponsabilidade fiscal como se fora a “socialização” do Erário através de bolsas e de cotas…. Contra isto, se ouve ecoando no continental território brasileiro o toque de alerta para os autênticos patriotas, mostrando a volta da corrupção e a necessidade urgente de se fazer mudanças na política e na economia.

Para enxergar a realidade e reconstruir o País, não é preciso pegar carona na permanente insatisfação dos caminhoneiros, nem os usar para bloquear estradas; basta-nos pegar metrô e ônibus, ir à feira, à farmácia ou ao supermercado, para ouvir “nos ouvidos” as reações do povão. Esta é a verdadeira contestação e a razão de gritar “fora Lula”.

Sente-se que está em curso a revolta popular refletida e atestada por várias pesquisas de opinião pública, mostrando a queda vertiginosa da popularidade de Lula da Silva e do seu governo.

São números e percentuais que não se limitam à horda dos fanáticos apoiadores do mito frouxo e corrupto, assentados em argumentos levianos para justificar o quebra-quebra de Brasília, planejado para dar sustança a um golpe de Estado.

Aliás, a cabulice dos polarizadores Bolso e Lula limita-se a preparar-se para as próximas eleições, sem pensar no País e na Nação, mas apenas em si próprios. E nisto, sem nenhum pudor, os seus seguidores também colaboram com o estúpido fanatismo.

Nesta Mitologia viva e ululante como larva de esgoto, temos deuses nos três poderes republicanos que se aquecem na fogueira do poder desde as Capitanias Hereditárias do favoritismo, dos degredados, dos cruéis predadores de índios e dos escravocratas.

É o “Sistema”.