DOGMAS

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MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.com.br

“Dogma não significa ausência de pensamento, mas sim o fim do pensamento” (Chesterton)

As cidades-estados da velha Grécia, que foram o berço da Democracia, eram contraditoriamente governadas por uma teocracia; que foi copiada pelos “bispos cristãos” ao conquistar o poder em Roma criando o Papado.

Esta organização eclesial fortemente hierarquizada substituiu as antigas comunidades cristãs livres que tiveram de se submeter ao imperador Constantino e a sua fraude oportunista de que dialogara com Jesus Cristo…

Assim, o cristianismo católico passou a governar através de uma simbiose Deus-Estado…. Inventou até um título para Deus, “Rei dos reis”…. E o papa então tornou-se o representante de Deus na Terra, como Pontifex Maximus, como era o chefe do colégio dos sacerdotes na antiga religião romana.

O Papado com o poder imperialmente consolidado chegou à Idade Média estendendo o seu mando aos países europeus convertidos, pondo os bispos a serviço dos governos e divinizando também os ocupantes do poder.

Esta interação teocrática dominou com forte repressão, criando tribunais de exceção que sentenciavam prisões, torturas e condenações à morte pela fogueira. Mas como todo poder totalitário, degenerou-se estimulando a revolta dos clérigos honestos. A reação culminou com a Reforma Protestante.

Este movimento nasceu da repulsa ao modo de vida luxurioso do bispado e do repúdio à politicagem e a corrupção de grande parte do clero, comportamento que corroeu o Sacro Império Romano Germânico.

Como autodefesa, o Papado viu-se obrigado em 1546 a convocar um concílio a fim de reestruturar o ordenamento clerical. Conhecido como “Concílio de Trento”, o sínodo realizou-se sob a direção do papa Paulo III; aprovou duras medidas para disciplinar o sacerdócio, proibiu a imoral venda de indulgências, criou seminários para formar padres e permitiu a livre expressão de pensadores cristãos, como Inácio de Loyola e Erasmo de Roterdã.

Foi assim que surgiu a “contrarreforma”. Esta, apesar do arejamento das ideias humanistas, teve que fazer concessões para conter a rejeição dos ultramontanos conservadores e dogmáticos, fortalecendo a Inquisição para julgar “hereges”,

“Herege” é uma palavra grega, “hairetikós”, que significa escolher. Seriam as pessoas que pela visão de um bispo investido de juiz, inconformadas com as correntes retrógradas mantidas no Vaticano, como todo aquele que contestasse os dogmas estabelecidos de cima para baixo pela hierarquia eclesial sem ter por base os Evangelhos.

Dessa maneira, o recalque da burocracia sacerdotal manteve os dogmas, impondo que as decisões do Papado deveriam ser acatadas sem análises, discussão ou questionamentos, um princípio doutrinário absurdo que chegou até os dias atuais.

Desta posição bitolada originou-se a beatice, o carolismo igrejeiro; enfim, o fanatismo, pois só os fanáticos não têm dúvidas sobre o que lhes impõem como verdade.

Vê-se até hoje no campo da política, exemplos desse servilismo aceitando a exigência de obedecermos aos programas de Governo que não são dogmas, e acolher como correto o discurso de quem ocupa eventualmente o poder. Ambos exigem a discussão, e no mínimo, o diálogo.

Não se deve aceitar e curvar-se à imposição dos segredos misteriosos do capitão Bolsonaro sobre o trânsito e o comportamento dos seus familiares, com decreto de sigilo por 100 anos quanto à ida e vinda dos filhos no Palácio do Planalto

Trata-se de uma medida que nos obriga à reflexão, a discutir e a protestar; chega de sigilos! Por honestidade consigo mesmo, o brasileiro deve adotar o princípio socratiano de que “a vida sem questionamentos, não merece ser vivida”.

A revolta contra “segredos” jurídicos e governamentais dogmáticos é um imperativo de consciência cívica. Pensemos, pois, com André Gide: “Crê nos que buscam a verdade. Ponha em dúvida aqueles que dizem tê-la encontrado”.

 

 

 

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