FALANDO GREGO

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MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.om.br)

MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.om.br)

Clássico é clássico; não foi por acaso que Shakespeare criou expressões que entraram na linguagem popular em todos idiomas do mundo…. N’ “A Tragédia de Júlio César” (1599) temos no ato 1, cena 2, Cássio perguntando a Servíllio Casca o que Cícero havia dito, e este responde: “De minha parte, era grego para mim”.

Casca não havia entendido o que Cícero dizia porque este, realmente, estava falando em grego, mas a imagem de “falar grego”, passou a manifestar algo incompreensível a outra pessoa.

No Brasil – às escondidas de pessoas alheadas – a genialidade de Lima Barreto trouxe um magnífico conto, “O Homem que Sabia Javanês”, mostrando o fascínio bacharelesco dos letrados pela falsa erudição.

Lima observou que os círculos jurídicos, sociais e políticos da sua época limitavam-se num vazio intelectual, fato que os anos não deletaram da vida pública, ao contrário, acumularam no “quartinho dos fundos” da História.

Frases de sonoridade imperceptível ao ouvido nos levam a um conto do escritor, editor e crítico literário Edgar Allan Poe. A narrativa leva à denúncia coletiva de uma vizinhança que ouviu gritos de pavor na madrugada, concordando todos que se tratava de vocábulos alemães notadamente a palavra “Ja”, sim, partícula afirmativa.

Poe lembra, porém, que o “Ja”, embora comum ao idioma alemão, é usado em sueco, no dinamarquês, no flamengo, no holandês, no húngaro, em alguns dialetos italianos e na linguagem coloquial dos norte-americanos.

Embora todas testemunhas imputarem a um alemão a gritaria, comprovou-se por fim que os gritos eram guinchos que partiam de um macaco…. Neste contexto factual refletimos que estamos vivendo no século 21, portanto o besteirol ininteligível deveria tornar-se extinto.

Infelizmente, a experiência de viver mostra que a conjuntura política e social fala grego aos cérebros doentios que mantêm larvas de fanatismo que, como diz Voltaire, é uma doença contagiosa como a varíola.

O discurso versátil referindo-se às circunstâncias ambientais é uma droga consumível pela massa ignara, diferentemente de um conjunto de informações que expressam a realidade que os ouvidos broncos não conseguem distinguir.

A analogia das palavras ilusórias e o populismo não têm valor histórico, não passam de relíquias neuróticas cujos cultuadores concebem como verdade, identificando-a como um conceito abstrato.

Sobre o julgamento de Jesus nos Evangelhos, Pilatos, o governador romano, questionou: – “O que é a verdade?”. Cristo nada respondeu.

O silêncio muitas vezes substitui um relato verossímil de pormenores, e, ao contrário da passagem evangélica (escrita em grego) a verdade chega à política através de ideologias distorcidas, da esquerda populista e da direita nada conservadora.

Assistimos pela facilidade das informações que a Internet e a Inteligência Artificial oferecem (e é por isto que os governos arbitrários querem suprimi-las) nos levam a crer que o Brasil se enroscou num redemoinho de inverdades que os três poderes da República turbinam.

Falta um penetra dos andares de cima do condomínio jurídico, uma pessoa com discernimento para falar aos semideuses togados que ali habitam para deixar de lado a defesa da “demogracinha” e atuem como juízes autênticos, defendendo a Democracia como fizeram os déspotas esclarecidos do século dezoito, também absolutos senhores do poder, mas adotando ideias iluministas.

Entre os mais notáveis destas figuras foram Catarina II da Rússia, Frederico II da Prússia, José II da Áustria e o Marquês de Pombal em Portugal. Temos o exemplo marcante de Democracia num fato em que a História registra com Frederico II:

Em razão de um burburinho de rua, Frederico encerrou uma reunião e perguntou ao seu ajudante de ordens o que havia. O oficial disse que alguém fixara um cartaz ofensivo à monarquia, mas colou muito alto e o povão estava tendo dificuldade de ler; acrescentou que iria mandar a guarda armada dispersar a multidão.

O Monarca negou esta ordem e foi à janela; para ser ouvido pela aglomeração, ordenou em voz bem alta ao sentinela à porta do palácio: – “Abaixa o cartaz para que todos possam ler!”. Provocou dessa maneira risadas na multidão que se dispersou aclamando-o….

No Brasil, em pleno século 21, o Complexo STF-Lula é incapaz de um gesto desta grandeza; ao contrário, uma crítica aos semideuses togados do Supremo Olimpo, vai a julgamento como agressão ao Estado…

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