DAS PROIBIÇÕES

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MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.com.br)

Na ditadura militar que durou de 1964 a 1979 censurando a expressão do pensamento, cantou-se a canção de Caetano Veloso “É Proibido Proibir” como resistência. O autor parece até ter s’esquecido disto, pois não protesta contra a censura que o Governo Lula quer; mas os verdadeiros democratas, não.

Lembro-me de uma entrevista em que Caetano disse que o tema se inspirou num pichamento em muros, durante as revoltas estudantis de 1968 de Paris: “É Proibido Proibir”, palavra-de-ordem que se tornou um slogan nos países em que a liberdade é sufocada.

Desafiar proibições é da natureza humana; sofre, porém, a comezinha repressão desde a primeira infância, quando se é impedido de chupar o dedo na fase do prazer oral, e se torna rotineira ao longo da vida pelos costumes sociais e leis impostas pelos governos.

Algumas proibições no Brasil, por exemplo, são inusitadas… É ininteligível que um jovem de 15 anos tenha o direito de votar para presidente e não possa tirar a carteira de motorista.

Na minha mocidade, com menos de 18 anos, sofri a proibição de frequentar os salões de bilhar, e embora jogasse sinuca com destreza elogiável nos clubes sociais ficando, porém, impedido de disputar torneios públicos.

Revoltei-me logo cedo contra proibições estudando o que os escravocratas brasileiros criaram e deixaram uma preconceituosa herança para nós. Negava aos escravos comer à noite, inventando que é venenoso chupar manga e beber leite, que açúcar faz mal e banana dá prisão de ventre…. Tem até um ditado: “Banana de manhã é ouro, de tarde é prata, de noite mata…”.

Os males da escravatura são vigentes até hoje, com conceitos firmados, opiniões sem base sólida ou conhecimento científico aprofundado, sempre de forma negativa ou desfavorável.

As proibições são intolerantes, discriminatórias, opressivas e xenófobas, como termo literal de prejulgamento; com isto, estabelecem uma distopia simulada e repressiva contra as tendências sociais, políticas e tecnológicas discordantes do Sistema de Governo.

Esta constatação nos leva ao anarquista espanhol que chegou em país inóspito e perguntou a um nativo: – “Hay Gobierno nesta Tierra?”. “No”, respondeu o receptor; ele então foi veemente: – “Precisamos hacer-lo para después combater-lo!….”

No “Livro Vermelho dos Pensamentos de Millôr” o Humorista mostra revolta por ser governado. Diz: “Ser governado é ser inspecionado o tempo todo, ser espionado, legislado absurdamente, regulamentado, condicionado, doutrinado, estampilhado e proibido”.

Uma opinião bem diferente dos artistas que se submetem à opressão, por nostalgia de grilhões escravocratas ou porque se vendem pelos trinta dinheiros que o poder oferece com leis tipo Rouanet. Eles nos levam ao lamento de Maquiavel: “Como é perigoso tentar libertar um povo que prefere a escravidão!”.

Trazemos dos estudos da Mitologia Grega a dureza das proibições no Mito de Prometeu, Titã que simpatizava com os humanos e enfrentou o poderoso Zeus, que proibiu aos homens de possuírem o fogo. Vendo os viventes frágeis comendo alimentos crus e sofrendo frio, Prometeu rouba o fogo do Olimpo e o dá à humanidade, permitindo-lhe cozinhar, aquecer-se, desenvolver artes, ofícios e civilização.

Para puni-lo, Zeus manda acorrenta-lo a uma rocha onde um abutre diariamente lhe rasga a barriga e come-lhe o fígado, que à noite se regenera para que a tortura se repita eternamente.

O anedotário histórico conta que o dramaturgo francês Tristan Bernard contou esta lenda para seu netinho, que exclamou: – “Coitado do abutre!”. Bernard, surpreso, perguntou: -Como? Porque tens pena do abutre e não de Prometeu? A criança insistiu: – “Do abutre, sim, porque deve ser horrível comer fígado todos os dias…”

Vindos para legalizar as proibições, juízes interpretam as leis, nem sempre conforme determinou o legislador, e quando proíbem qualquer coisa fazem muitas vezes por interesses pessoais ou políticos.

… E as proibições nos levam a Montesquieu, curto e grosso: “Não há tirania mais cruel do que aquela que se perpetua sob o escudo da lei e em nome da Justiça”.

 

 

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