MITOMANIA
MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.com.br )
“Não é aconselhável encontrar símbolos em tudo aquilo que se vê. Os símbolos tornam a vida cheia de horrores…” (Oscar Wilde)
Sou um admirador do mineiro Affonso Romano de Sant’Anna como poeta, mais do que como professor de literatura…. Degusto as poesias e nunca assisti suas aulas…. O pessoal do Twitter é testemunha de que não canso de postar os versos dele, recortados na sua maioria da “Implosão da Mentira”, um poema sempre atual no nosso cenário político…
A implosão da mentira faz parte da minha preocupação, pela multiplicação de falsos símbolos e criação de mitos vazios destinados a movimentos e personalidades na luta pelo poder; é a veneração dos tontos pelos protagonistas do show da mentira.
Exigente em relação aos agentes públicos, vejo muitas dessas figuras mais como mitômanas (ou mitomaníacas, como querem muitos) do que como mitos (como querem alguns).
Para a Mitomania, compulsão patológica para mentir, vou sempre a Sant’Anna, do qual reproduzo um excerto, extrato magnifico da sua poesia, à apreciação dos meus leitores:
“Mentiram-me./ Mentiram-me ontem e hoje mentem novamente./ Mentem de corpo e alma, completamente./ E mentem de maneira tão pungente que acho que mentem sinceramente./ Mentem, sobretudo, impune/mente”.
O verbete Mitomania dicionarizado é um substantivo feminino de origem grega, composto da raiz “mythos”, que significa ‘história’ ou ‘palavra’, e do sufixo “mania”, significando ‘desejo desordenado’. O termo é vigente na Psicologia como a tendência mórbida para contar mentiras compulsivamente, criar histórias fantásticas ou simular situações inexistentes.
Por não encontrarmos textos fora da Medicina sobre a mentira patológica, acatamos os estudos médicos sobre os sinais e sintomas deste transtorno de personalidade, entendendo-os como a “predisposição para mentir”.
Estudos neurocientíficos sugerem que este transtorno decorre de determinadas condições mentais, como transtorno bipolar, esquizofrenia ou transtorno de personalidade limítrofe.
Pesquisa feita pela Universidade Stanford, da Califórnia, Estados Unidos, levantou dados com crianças de 200 famílias de origem e formação diferentes, e concluiu que meninos e meninas começam a mentir com seis anos, mas que pela repressão doméstica e a convivência escolar abandonam o hábito; são poucos indivíduos que se tornam mitômanos.
Para o poeta e escritor russo Boris Pasternak, autor do famoso romance “Doutor Jivago”, em que relata as perseguições do regime stalinista contra a liberdade de expressão do pensamento, tem uma frase que talvez lhe condene aqui e agora: – “Os detentores do poder ficam tão ansiosos por estabelecer o mito da sua infalibilidade que se esforçam ao máximo para ignorar a verdade.
É um pensamento que vem de encomenda para o presidente Jair Bolsonaro, eleito “mito” pelos seus aduladores fanáticos e, talvez por isto usa e abusa da própria condição mitômana da infalibilidade… Desdenhou da pandemia do novo coronavírus tratando-a como uma “gripezinha”, receitou, a conselho de Trump, remédios ineficazes e condena a imunização em massa pela vacina.
Aparelhou o Ministério da Saúde com militares da ativa e da reserva sem a menor experiência em saúde pública. Perfilam-se diante dele, mas batem cabeça na campanha da vacinação aceitando suas ordens negacionistas.
Felizmente os brasileiros em geral – com exceção dos cultuadores da personalidade do Presidente – registram os discursos irrealistas, as opiniões insensatas e o comportamento estúpido dele, tudo oxigenado de mentiras para fazer-se acreditar.
Enganou durante um certo tempo com mensagens inexatas e fictícias que não se mantiveram; pelo contrário, levaram-no de “mito” a mitômano, aquela pessoa que “de tanto mentir tão brava/mente constrói um país de mentira diária/mente”…
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