Elizabeth Bishop

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CADELA ROSADA

 

 

Sol forte, céu azul. O Rio sua.

Praia apinhada de barracas. Nua,

passo apressado, você cruza a rua.

 

Nunca vi um cão tão nu, tão sem nada,

sem pêlo, pele tão avermelhada…

Quem a vê até troca de calçada.

 

Têm medo da raiva. Mas isso não

é hidrofobia — é sarna. O olhar é são

e esperto. E os seus filhotes, onde estão?

 

(Tetas cheias de leite.) Em que favela

você os escondeu, em que ruela,

pra viver sua vida de cadela?

 

Você não sabia? Deu no jornal:

pra resolver o problema social,

estão jogando os mendigos num canal.

 

E não são só pedintes os lançados

no rio da Guarda: idiotas, aleijados,

vagabundos, alcoólatras, drogados.

 

Se fazem isso com gente, os estúpidos,

com pernetas ou bípedes, sem escrúpulos,

o que não fariam com um quadrúpede?

 

A piada mais contada hoje em dia

é que os mendigos, em vez de comida,

andam comprando bóias salva-vidas.

 

Você, no estado em que está, com esses peitos,

jogada no rio, afundava feito

parafuso. Falando sério, o jeito

 

mesmo é vestir alguma fantasia.

Não dá pra você ficar por aí à

toa com essa cara. Você devia

 

pôr uma máscara qualquer. Que tal?

Até a quarta-feira, é Carnaval!

Dance um samba! Abaixo o baixo-astral!

 

Dizem que o Carnaval está acabando,

culpa do rádio, dos americanos…

Dizem a mesma bobagem todo ano.

 

O Carnaval está cada vez melhor!

Agora, um cão pelado é mesmo um horror…

Vamos, se fantasie! A-lá-lá-ô…!

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