Arquivo do mês: julho 2019

Vinicius de Moraes

Soneto da Fidelidade

De tudo, ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.

Quero vivê-lo em cada vão momento
E em louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento.

E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama

Eu possa me dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.

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CAMINHO

MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.com.br)

“Você não pode mudar o vento, mas pode ajustar as velas do barco para chegar onde quer.” (Confúcio)

Escrevi um artigo homônimo em 2017, “O Caminho”, mostrando a intolerância stalinista contra um dos grandes intelectuais brasileiros, o escritor alagoano Otávio Brandão, autor de diversas obras entre elas, “Canais e Lagoas”, como o “Manifesto Sururu” que inspirou bem mais tarde o movimento recifense “Mangue Beat”.

Gosto muito da palavra Caminho. É poética e mística. Dicionarizada, é um substantivo masculino vindo do latim vulgar com origem celta (camminu), com riquíssima sinonímia na língua portuguesa de onde pescamos atalho, brecha, destino, momento, oportunidade, saga, senda, trilha, vereda e via.

A mitológica saga nórdica e a beleza sertaneja vivificada por Guimarães Rosa, se completam com senda, que coloquialmente é hábito, rotina; e na discussão filosófica entra com momento, oportunidade e via.

“Trilha” intitula um grupo do Twitter, com participantes comprometidos com o bem, pelo Desenvolvimento Econômico, Justiça, Patriotismo e Liberdade; luta pelo destino que todos queremos para o Brasil.

O Evangelho de João (14:6) registra as palavras de Jesus Cristo “eu sou o caminho, verdade e a vida” em uma conversa com seus apóstolos; e Confúcio, com uma lição magistral diz que: “a experiência é uma lanterna dependurada nas costas que apenas ilumina o caminho já percorrido”.

O notável orador paraibano José Américo de Almeida, cunhou na antologia dos grandes pensamentos brasileiros a frase “ninguém se perde no caminho da volta” lembrando que a gente adquire prática e perícia com o conhecimento transmitido ao longo da vida.

Pela minha ótica, a sociedade brasileira está precisando mais do que nunca de percorrer o caminho da verdade com uma lanterna iluminando as trevas de um passado recente, onde uma quadrilha se apossou do poder por um estelionato eleitoral e se manteve nele por 16 anos, demolindo, tijolo a tijolo, a ética, a honestidade e o respeito pelas tradições nacionais.

Tudo foi deles para eles. A demagogia midiática desenfreada, o assalto às empresas estatais, a criminosa transferência da riqueza nacional para as ditaduras narco-populistas e o aparelhamento do Estado, infiltrando agentes do caos nos três poderes da República.

Muito pior do que o lado material da desconstrução dos valores nacionais, o campo espiritual ficou desprovido do respeito humano e da solidariedade com a mútua e respeitosa consideração entre as pessoas. A fração perniciosa do narcopopulismo insiste em destruir reputações e impedir o avanço da luta contra o crime organizado, da bandidagem comum e dos políticos corruptos.

A ideia da solidariedade me levou ao escritor francês Remy de Gourmont que escreveu, referindo-se à uma prática de devoção budista em certos mosteiros do Nepal, que quando a neve e os temporais tornam impraticáveis as subidas na montanha, os monges recortam figurinhas de cavalo em papel e as soltam ao vento do alto das torres. Confiam que Buda vai recolhe-las e converte-las em cavalos de verdade para ajudar os peregrinos a se salvar.

Gostaria de pedir aos dirigentes do Congresso, do Executivo e do STF que pratiquem esta santa lição recortando em papel alumínio pequenos foguetes, e os soltem brilhantes sob o sol de Brasília indicando e defendendo o caminho de um futuro radioso para a nossa Pátria.

 

Carlos Drummond de Andrade

Poema de sete faces

Quando nasci, um anjo torto
desses que vivem na sombra
disse: Vai, Carlos! ser gauche na vida.

As casas espiam os homens
que correm atrás de mulheres.
A tarde talvez fosse azul,
não houvesse tantos desejos.

O bonde passa cheio de pernas:
pernas brancas pretas amarelas.
Para que tanta perna, meu Deus, pergunta meu coração.
Porém meus olhos
não perguntam nada.

O homem atrás do bigode
é sério, simples e forte.
Quase não conversa.
Tem poucos, raros amigos
o homem atrás dos óculos e do bigode.

Meu Deus, por que me abandonaste
se sabias que eu não era Deus
se sabias que eu era fraco.

Mundo mundo vasto mundo,
se eu me chamasse Raimundo
seria uma rima, não seria uma solução.
Mundo mundo vasto mundo,
mais vasto é meu coração.

Eu não devia te dizer
mas essa lua
mas esse conhaque

botam a gente comovido como o diabo.

 

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DOS MILAGRES

MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.com.br)

“No desespero e no perigo, as pessoas aprendem a acreditar no milagre. De outra forma não sobreviveriam”  (Erich Remarque)

Escrevi num artigo anterior que as palavras são instrumentos para batear sapiência; e acrescento: é através delas que as pessoas se entendem, se julgam e se compreendem. Escritas ou faladas, quando traduzem um pensamento puro, já não pertencem a quem as proferiu; se ampliam e incorporam-se ao senso comum.

No mundo das ideias, as palavras condenam a intriga, o preconceito, o racismo e a violência, mas de outro lado recolhem e afagam a amizade verdadeira, o amor, a solidariedade humana e a verdade.

O mundo real, ao contrário. Não me lembro quem, e o doutor Google não soube dizer, deixou escrito que: “A natureza é implacavelmente indiferente. Essa é uma das lições mais duras que devemos aprender.”

Com os padrões de comportamento ditados por minorias introvertidas muitas pessoas se afastam do convívio social trazendo em si a indiferença; mas detêm o poder irremovível de escolher o que advier.  É o que as religiões monoteístas, judaísmo, cristianismo e islamismo chamam de livre-arbítrio, embora isto não esteja explícito nem no velho, nem no novo testamentos, tampouco no Alcorão.

É este impulso natural que nos leva a crer ou não crer em milagres. Dicionarizado, o verbete “Milagre” é um substantivo masculino vindo do latim, “miraculum”, do verbo “mirare”, que se traduz por “maravilhar-se”. Trata-se de um acontecimento incomum, extraordinário, que não se explica normalmente e a Ciência não comprova.

Hollywood nos trouxe em 1999 o belo filme “À Espera de um Milagre”, dirigido por Frank Darabont contando no elenco com Tom Hanks, Michael Clarke Duncan, David Morse e Bonnie Hunt.

Passa-se no corredor da morte de uma prisão no Sul dos Estados Unidos. O chefe da carceragem, beneficiado pela cura sobrenatural de uma terrível infecção renal, pelo poder miraculoso de um preso, Coffey, condenado por ter matado duas crianças, tem o maior respeito por ele.

Na presença de outros agentes penitenciários, assiste-se à ressuscitação de um rato e o restabelecimento de uma senhora que tinha um câncer no cérebro. No papel do milagreiro Coffey, M. C. Duncan conquistou o prêmio de Melhor Ator Coadjuvante pela magnífica interpretação.

No Brasil de hoje, somos milhares de brasileiros à espera de um milagre que salve a nossa Pátria do enredo maléfico deixado pelos dezesseis anos dos governos petistas de Lula da Silva e do seu mamulengo, Dilma Rousseff, quando se institucionalizou a corrupção levando o País a tornar-se exportador de propinas para a América Latina.

E mais: deixaram a administração pública infiltrada de agentes narcopopulistas que sabotam quaisquer iniciativas e esforços para dar um fim na corrupção e criar condições para o desenvolvimento econômico do País.

Agora mesmo, estamos assistindo uma continuada conspiração, com tramas midiáticas e terrorismo virtual, botando vida política e social pelo avesso. Vemos o senhor Glenn Greenwald, cúmplice de uma criminosa ação de hackers contra personalidades do Ministério Público e da Justiça Federal, receber apoio de setores da política e da mídia, numa orquestração planejada e executada para abalar os ministros do STF, visando soltar o presidiário corrupto Lula da Silva.

A colunista Mônica Bergamo do jornal oposicionista Folha de São Paulo, porta-voz do lulopetismo, revelou outro dia a reunião de 40 advogados comprometidos em defender Greenwald. Não é pelo cerceamento da liberdade de informar, mas para impedir investigações da movimentação financeira dele pelo Coaf…

Engrossando esta grande maquinação, outro tentáculo do lulopetismo, o partido Rede, pediu que o STF suspenda qualquer investigação a respeito deste conluio contra a Lava Jato e o ministro Sérgio Moro.

Diante disso, quem pode calar-se? Sigam-me os brasileiros no compasso das palavras de Abraham Lincoln: “Pecar pelo silêncio, quando se deve protestar, faz da cidadania vergonhosamente covarde”.

Manuel Bandeira

O CACTO

Aquele cacto lembrava os gestos desesperados de estatuária:
Laocoonte constrangido pelas serpentes,
Ugolino e os filhos esfaimados.
Evocava também o seco Nordeste, carnaubais, caatingas…
Era enorme, mesmo para esta terra de feracidades excep-
cionais.

Um dia um tufão furibundo abateu-o pela raiz.
O cacto tombou atravessado na rua,
Quebrou os beirais do casario fronteiro,
Impediu o trânsito de bondes, automóveis, carroças,
Arrebentou os cabos elétricos e durante vinte e quatro horas
privou a cidade de iluminação e energia:

– Era belo, áspero, intratável.

Augusto dos Anjos

Psicologia de um vencido

Eu, filho do carbono e do amoníaco,
Monstro de escuridão e rutilância,
Sofro, desde a epigênese da infância,
A influência má dos signos do zodíaco.

Profundissimamente hipocondríaco,
Este ambiente me causa repugnância…
Sobe-me à boca uma ânsia análoga à ânsia
Que se escapa da boca de um cardíaco.

Já o verme — este operário das ruínas —
Que o sangue podre das carnificinas
Come, e à vida em geral declara guerra,

Anda a espreitar meus olhos para roê-los,
E há-de deixar-me apenas os cabelos,
Na frialdade inorgânica da terra!

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Olavo Bilac

Via Láctea

“Ora (direis) ouvir estrelas! Certo
Perdeste o senso!” e eu vos direi, no entanto,
Que, para ouvi-las, muita vez desperto
E abro as janelas, pálido de espanto…

E conversamos toda a noite, enquanto
A via-láctea, como um pálio aberto,
Cintila. E, ao vir do sol, saudoso e em pranto,
Inda as procuro pelo céu deserto.

Direis agora: “tresloucado amigo!
Que conversas com elas? Que sentido
Tem o que dizem, quando estão contigo?”

E eu vos direi: “amai para entendê-las!
Pois só quem ama pode ter ouvido
Capaz de ouvir e de entender estrelas”.

CONSELHO

MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.com.br)

“Se você é capaz de distinguir entre o bom e o mau conselho, então não precisa de conselho”
(Edward Murphy)

Quando deixei de ser menino, mas ainda não me tornara adulto, ouvi uma lição que trago até hoje nos ouvidos: “Se conselho fosse bom não seria gratuito, cobrar-se-ia muito caro por ele”… Poucos da minha geração seguiram este ensinamento, ouvindo-os e distribuindo-os com outros…

Talvez estivessem certos. É inconveniente pedir conselhos, mas deve-se recebe-los com agrado, e sendo bons, passa-los adiante para quem encontre utilidade neles.

No meu caso, guardo com carinho o valor das palavras que ilustram os pensamentos, elas são os instrumentos adequados para garimpar sabedoria. Aprendi com o grande Confúcio: “Eu não procuro saber das respostas, procuro compreender as perguntas. ” As palavras, escritas ou faladas são moedas de troca das experiências.

Perguntar é uma obrigação de quem quer aprender. Lembro uma história antiga que ouvi, mas não sei se expressa uma passagem histórica ou uma lenda; como é elucidativa, memorizei-a e registro-a em linguagem corrente. Ei-la:

“Na primeira vez em que foi convidado a falar num comício, Alcebíades, o grande orador e político da antiguidade grega, sofreu um medo danado de enfrentar o auditório. Sentiu aquilo que a gíria teatral chama “trac”, a vacilação em enfrentar o público. O seu tio Péricles mandou-o procurar o conselho de Sócrates, o sábio.

Expressando ao Mestre o que ocorria, Alcebíades ouviu dele: – “Acaso te acanharias em falar cara a cara com o feirante Ariston? ” – “Não”, respondeu o jovem.

“O filósofo insistiu: – “Terias medo de conversar cara a cara com o sapateiro Leandro? ” – “Evidente que não! ”, enfatizou o político principiante.

“Sócrates então resumiu o seu julgamento sobre a multidão: – “Nesse caso, o que pode te causar preocupação a ideia de vê-los ambos multiplicados por cem ou por mil? ”

Esta tirada filosófica substituiu o “Conselho” o substantivo masculino originário do latim, (concilium, ii) com significado de associação, reunião, assembleia, concílio. A palavra vulgarizada passou também a ser pessoa que dá conselhos; quem aconselha, orienta, dá direcionamentos a outrem; aconselhador, guia.

Conselho pode ser um aviso, um parecer ou um grupo de pessoas com funções deliberativas, como “conselho de família”, “conselho de ministros” ou “conselho de guerra”. Parece estranho, mas estão corretos os verbetes conselho (com “s”) e concelho (com “c”) na língua portuguesa.

Esta troca-letras é corriqueira e frequente na gramática e usual na advocacia, na magistratura e no parlamento. Registra-se com ela a vitória do ministro Sérgio Moro sobre os jornalistas comprometidos em criticá-lo e metidos a conhecer a língua lusófona. Participando de uma audiência pública no Congresso, Moro usou a palavra “Conge” sendo criticado pela mídia como se tivesse cometido um erro.

Esse exemplo mais do que perfeito da crítica ignorante teve efeito entre os ignorantes lulopetistas ávidos em apontar erros do juiz da Lava Jato, mas não entre os estudiosos do idioma…. Agentes midiáticos não pesquisaram o novo acordo ortográfico, nem estudaram a redução de sílabas átonas na linguagem coloquial.

Para o respeitado gramático, doutor Ernani Terra, a palavra “Conjugue” na terminologia jurídica, tem como raiz “jugo”, trazendo em si o conceito de vínculo matrimonial. Deslizou na linguagem comum para “Conge”. Terra, ironicamente, apela para outro jargão advocatício, o “benefício da dúvida”, que deveria ser dado a Moro…

Na minha opinião, como Sérgio Moro é Sérgio Moro, caber-lhe-á até o direito de criar neologismos… por isso, o Dicionário informal sempre presente no Google, apressou-se a registrar o verbete como variação falada de “conjugue”, referindo-se à pessoa com quem se mantém relacionamento matrimonial.

Para os cretinos que atacam Moro para defender o arquicorrupto Lula da Silva, preso por corrupção e lavagem de dinheiro, deixo-lhes Machado de Assis: “Ouçam-me este conselho: em política, não se perdoa nem se esquece nada”.

Mário Quintana

O Tempo

A vida é o dever que nós trouxemos para fazer em casa.
Quando se vê, já são seis horas!
Quando se vê, já é sexta-feira!
Quando se vê, já é natal…
Quando se vê, já terminou o ano…
Quando se vê perdemos o amor da nossa vida.
Quando se vê passaram 50 anos!
Agora é tarde demais para ser reprovado…
Se me fosse dado um dia, outra oportunidade, eu nem olhava o relógio.
Seguiria sempre em frente e iria jogando pelo caminho a casca dourada e inútil das horas…

Fernando Pessoa

Não sei quantas almas tenho

Não sei quantas almas tenho.
Cada momento mudei.
Continuamente me estranho.
Nunca me vi nem achei.
De tanto ser, só tenho alma.
Quem tem alma não tem calma.
Quem vê é só o que vê,
Quem sente não é quem é,

Atento ao que sou e vejo,
Torno-me eles e não eu.
Cada meu sonho ou desejo
É do que nasce e não meu.
Sou minha própria paisagem;
Assisto à minha passagem,
Diverso, móbil e só,
Não sei sentir-me onde estou.

Por isso, alheio, vou lendo
Como páginas, meu ser.
O que segue não prevendo,
O que passou a esquecer.
Noto à margem do que li
O que julguei que senti.
Releio e digo: “Fui eu ?”
Deus sabe, porque o escreveu.