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TELEGRAMA

MIRANDA SÁ (E-mail: mirandasa@uolcom.br)

“Trame, planeje, calcule, postule…. E conte com isso! ” (Henry Miller)

Não faz muito tempo que escrevi uma crônica sobre as coisas que a Geração Web não conheceu, são tantas que nos obriga a selecionar apenas algumas, como apontador de lápis, caderno de caligrafia, caneta tinteiro, cartas, gravador portátil, máquina de escrever, telegrama…. Também o bom trato com os velhos….

A distinção com a terceira idade não desapareceu e ainda é respeitada pelos que não são filhos de chocadeira; quanto ao Telegrama, com a sua abreviação básica, teve um curto retorno  por uns tempos, quando o Twitter exigia dos micreiros 140 toques, ampliados depois para 280 em 2017.

O pensamento expresso sumariamente valorizava a expressão, dava-lhe qualidade e retratava a inteligência nos resumos, como no jornalismo temos as sinopses para atender os apressados.

Assim eram os telegramas. Meio de comunicação entre pessoas e instituições, com mensagens curtas e urgentes que eram entregues envelopados no endereço de destino; antes eram transmitidos pelo telégrafo, depois por telefone e agora temos um similar pouco usado via Internet.

Nos velhos tempos memorizava juras de amor; mensagens confidenciais, comerciais ou políticas; e comunicados funestos, noticiando acidentes e mortes. Temendo receber notícias tristes, muitas pessoas hesitavam em abri-los….

Parecia natural o temor por tomar conhecimento de acontecimentos telegramados. A gramática apresenta a figura da “preterição” que consiste em passar por cima de um texto, mas a curiosidade sobre o conteúdo de um telegrama era irresistível.

Antigamente era muito difícil manter sigilos. Os segredos eram um prato feito nas conversas familiares, almoços e jantares, bate papo de botequim. Tem até uma interessante resenha de Gore Vidal que diz: – “Quando alguém me pergunta se posso guardar um segredo, respondo: “Por que eu deveria, se você não pôde? ”.

Na Era da Mitomania Bolsonarista os sigilos fazem parte do discurso presidencial, uma breve simulação disto é espantosa: o capitão Bolsonaro fez segredo por 100 anos de um teste de vacinação; o Exército usou o mesmo período para dar conhecimento do julgamento do general Eduardo Pazuello por participar de comício partidário.

Tivemos a pouco um absurdo dos absurdos: o Governo Federal pôs sob sigilo as idas dos filhos do Presidente ao Palácio do Planalto! Assim, não é estranhável que um encontro de pastores evangélicos com Bolsonaro seja sigiloso; principalmente depois do escandaloso pastoril do gabinete paralelo no Ministério da Educação que revelou cobrança de propinas por pastores lobistas.

Talvez seja exibir demais de um governo do Centrão (como seria também de um governo lulopetista, porque os populistas são iguais), mas, em nome da Democracia e da Transparência na Administração Pública, os sigilos deveriam ser proibidos.

Perdoem-me os que pensam diferente por considera-los tolos. Não chegam a ser uns imbecis úteis como os alemães que apoiaram os nazistas e aplaudiram Hitler, embora contribuam para a disseminação do mistério na vida política dos governantes.

Além da manada cultuadora de personalidades, temos igualmente a omissão silenciosa dos garantistas togados e dos esgotados militares da ativa que apadrinham este tenebroso artigo de fé do sigilo.

Gostaria de fantasiar um pouco acreditando num Tribunal da Opinião Pública e num Exército do Patriotismo que, reunidos, enviaram o seguinte telegrama endereçado à Nação Brasileira:

“ACORDA POVO BIPT É IMPOSSÍVEL DORMIR NUM PAÍS ONDE SEGREDOS DOS OCUPANTES DO PODER SÃO LEGAIS PT O RUIDO DESTA MISTIFICAÇÃO LEVANTA SUSPEITAS VG NÃO SE ACUMPLICIE PT REAJA” ASS. A CONSCIÊNCIA

Marjorie Salu

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Marjorie Salu

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