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Sapatos, ovos e CPMF

MIRANDA SÁ (E-mail: mirandasa@uol.com.br)

O presidente dos EUA George W. Bush  dava uma entrevista coletiva em Bagdá, em dezembro de 2008, quando o jornalista iraquiano Muntadar al-Zaidi tirou os sapatos e atirou-os contra ele.

Arremessar sapatos é um grave insulto no mundo árabe e Zaidi foi processado, dizendo em sua defesa que ao ver Bush sorrindo ao dizer “ter vindo se despedir do Iraque”, sentiu “o sangue dos inocentes mortos ou ficados órfãos no meu pé no momento”.

Sem querer, atirar sapatos como protesto foi além fronteiras iraquianas e as sapatadas se tornaram uma manifestação adotada mundo afora.

Nas eleições gerais da Índia, após uma verdadeira onda de sapatadas contra candidatos demagogos, um analista chegou a afirmar que o ato era “o máximo em arma não violenta”. Também chegou à Bélgica com acionistas do grupo financeiro Fortis atirando sapatos contra a diretoria da empresa

Assim, este estilo de insurreição pacífica inspirou comédias teatrais e televisivas, virou videogame e foi usado por grupos de relacionamento virtual na Internet. Mais antigo e conhecido é o costume de atirar ovos e tomates em desafetos, praticado principalmente pelas torcidas de futebol.

Ficaram na memória da crônica esportiva ocorrências entre simpatizantes do Treze de Campina Grande, do Flamengo e Botafogo do Rio e do Corinthians paulista. Todas aconteceram por causa de derrotas humilhantes, ou contra cartolas desacreditados ou técnicos repudiados.

Em comícios políticos e demonstrações partidárias aparecem aqui e acolá indicando descontentamentos ou evidenciando dissidências. Contra governos incompetentes ou corruptos, mostram-se como revolta pacífica embora sofrendo críticas, evidentemente, da imprensa adesista.

Não faz muito tempo, isto ocorreu na República Tcheca, com  Milos Zeman na presidência, quando grande multidão vaiou-o  e cobriu-o com uma saraivada de ovos durante um comício. A notícia trouxe um lado cômico, pois os seguranças de Zeman abriram guarda-chuvas para protegê-lo.

Ao assistir os repetidos atos terroristas nas manifestações populares de São Paulo e Rio de Janeiro, revolto-me pela leniência com que os governos tratam esses indivíduos mascarados, antidemocráticos, porque quem esconde o rosto não apresenta boas intenções. No Rio, em 2013, uma ala de disfarçados foi paga pelo PT para desestabilizar o governo de Sérgio Cabral, merecedor de protestos, mas não para sofrer atos violentos de vandalismo.

No dia 9, sexta-feira, em São Paulo, a marcha contra o aumento das passagens de ônibus repetiu a coação irrefletida dos black-blocs, atacando a polícia e fazendo quebra-quebra. Como gatos escondidos com o rabo de fora, atacaram o governador Alckmin e livraram a cara do responsável direto, Haddad, demonstrando inegável dependência partidária.

É preciso ter caráter, autonomia partidária (e coragem) para fazer valer o protesto pacífico das sapatadas e ovadas… E, da minha parte, considero até aconselhável fazer-se valer desse expediente para ganhar atenção da mídia e do público. Se entre os/as jornalistas que piedosamente (quase de joelhos) participam das entrevistas palacianas de Dilma houvesse um(a) de coragem, perguntar-lhe-ia a opinião sobre a volta da CPMF. Se a resposta fosse a favor, uma sapatada, por falta de ovos, nela!

Miranda Sá

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