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CRIAÇÃO

MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.com.br)

Imaginar é o princípio da criação. Nós imaginamos o que desejamos, queremos o que imaginamos e, finalmente, criamos aquilo que queremos” (Bernard Shaw)

Não, não estou a fim de falar sobre os textos bíblicos Gênesis 1:27 e Gênesis 1:28, descrevendo como Deus criou os seres humanos, homem e mulher, parecidos com Ele próprio. Nem lembrar que o Criador lhes disse: “Frutificai e multiplicai-vos, e enchei a terra, e sujeitai-a; e dominai sobre os peixes do mar e sobre as aves dos céus, e sobre todo o animal que se move sobre a terra”.

Se entendesse da arte pictórica, preferiria escrever sobre o comentadíssimo afresco “A Criação de Adão” que Michelangelo pintou no teto da Capela Sistina no século 16 a pedido do papa Júlio II. Sei apenas que a presença de Lilith, esposa mística de Adão, na pintura, cria polêmica até hoje…

O substantivo feminino “Criação” tem uma grande amplitude desde a origem linguística, do latim creatĭo,ōnis, significando conceber, desenvolver, elaborar, engendrar, procriar…  E na linguagem coloquial da língua portuguesa, temos um vastíssimo sinonimato, como compor, educar, fabricar, fazer, formar, idealizar, iniciar, imaginar e até parir…

Com a palavra, temos o efeito de criar, de tirar do nada; encontramos nela a capacidade de inventar como se vê especialmente nas agências de publicidade, ou de simplesmente domesticar animais nos galinheiros e chiqueiros para consumo alimentar.

É interessante no estudo da linguagem o processo de criação de novas palavras, os chamados neologismos, expressões derivadas ou formadas de outras já existentes, na mesma língua ou importadas. Citei num dos últimos artigos, o “radar” nascido da rubrica inglesa formada pelo “RA”, rádio, “D”, detetection, e “A”, de and e “R” de ranging que muitos não sabiam…

Da Inglaterra veio também a expressão “perder o trem”, atribuída a Churchill; que se tornando popular, inspirou o sambista Adoniram Barbosa nos versos “… Se eu perder o trem /que sai agora, às onze horas/ Só amanhã, de manhã”…

Do pessoal estrangeiro recebemos também dos franceses uma interessante criatividade idiomática, vindas, por exemplo, de Marcel Prévost, “semi-virgem”, de Taine, “velho regime”, e de Napoleão “espoliador”…

O brasilês, como se refere o mestre gaúcho José Carlos Bortoloti, é rico em criadores de neologismos, entre os quais vale a pena citar Bernardo Guimarães, Franklin Távora, Guimarães Rosa, José de Alencar, José Lins do Rego, Manoel Bandeira e Mário Quintana. Modéstia à parte, lá em cima escrevi “sinonimato” que não existe nos dicionários…

As expressões populares entre nós dão um colorido especial ao brasilês. Nossa gíria se expande como uma pandemia. Antigamente – por força dos programas radiofônicos e dos primórdios da televisão quase todas saíam do Rio de Janeiro.

Com o tempo, o intercâmbio e o estudo, descobriu-se o universo dos regionalismos, a bela diversidade das expressões populares cobrindo o território nacional do Oiapoque ao Chuí…

Das antiguidades francesas adaptadas e correntes no Nordeste, e do lusitano arcaico remanescente nas Minas Gerais ao galante castelhano dos gaúchos, formamos o nosso idioma, que no dizer de Noel Rosa, “…já passou do português! ”.

A criação chegou à pandemia do novo coronavírus, nos costumes, na linguagem, e até no anedotário. Levou-nos a aprender a ficar em casa e gerenciar o tempo; a popularizar o termo “negativismo” dantes usado somente pelos filósofos, para designar a política sinistra dos governantes aliados da peste…

No anedotário vale a pena lembrar o comentário do jornalista Mário Sabino sobre o “programinha em São Paulo pós-flexibilização: clube, shopping, restaurante, cineminha, vinhozinho — e fim de noite no hospital”.

… E vem da Alemanha tão sisuda, uma piada pronta: a BVG, empresa de transporte públicos, pede ao povo renúncia geral no uso de desodorante, em campanha para incentivar o uso de máscaras…

Marjorie Salu

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