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O DEVER

MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.com.br)

“Minha espada não tem partidos” (Luiz Alves de Lima e Silva, Duque de Caxias)

Li certa vez numa publicação da Companhia de Jesus a narrativa (não sei se uma alegoria ou representação histórica) sobre Santo Inácio de Loiola, contando que ele acabara de escrever uma carta com instruções para seus seguidores e sofreu uma crise cardíaca. O padre-secretário apressou-se a lhe atender, mas ele, agonizante disse: – “Cuide primeiro da carta que é de interesse da Companhia…”.

Isto é, sem dúvida, uma bela ilustração do senso de dever. Coisa de Santo. O nosso epigrafado, o patrono do Exército, Duque de Caxias, manteve, como soldado, uma conduta que é um grande exemplo de ética, e, principalmente, de respeito ao dever consciente.

Infelizmente, este herói da Pátria não está sendo seguido como o fizeram combatentes da Guerra do Paraguai, quando ele exortou: “Sigam-me os que forem brasileiros”.

Temos assistido muitos homens públicos, civis e militares, alheios ao cumprimento de obrigações com a cidadania e alguns até mesmo de agradecimento aos que lhes ajudaram a se eleger.

Agora mesmo, mostrando desprezo pela Lei e pelo Dever, assistimos o presidente Jair Bolsonaro cometer uma deplorável falta de respeito às leis vigentes e à educação dos futuros cidadãos sem atender ao mínimo de atenção de que deveria servir de modelo para os seus compatriotas.

Visitando a cidade de Eldorado, no interior paulista, o Transgressor descumpriu o decreto estadual que obriga o uso de máscaras de proteção contra o novo coronavírus em locais públicos; e não satisfeito em infringir a lei não usando o acessório medicinal, mandou que uma criança que se aproximou dele tirasse a máscara para cumprimentá-lo.

Que triste figurino presidencial nós temos! Como não bastasse falar sem pensar, agir sem estudar e governar para toda Nação e não apenas para uma fração, ele está moldando um comportamento abominável para os seus fanáticos seguidores.

Outro dia (5/set), um descerebrado cultuador da personalidade do Presidente, escreveu no Twitter que tem “vontade de socar a cara de quem está usando máscara nas ruas”, num impulso insano que está a exigir uma assistência psiquiátrica.

Admito, sinceramente, que muitas pessoas não se sentem à vontade usando o equipamento defensivo contra a covid-19; acho que até podem se arriscar não cumprindo as orientações médicas de cautela. Mas, mesmo sem ser milico, acompanho o Duque de Caxias, exigindo obediência às regras sócio-políticas estabelecidas.

Dos fardados, ordena-se disciplina. Se não formam com o regulamento; se não cumprem o dever, estão certamente de passo errado na marcha pela Ordem e o Progresso, para um Brasil culto, desenvolvido e justo.

Já cobrei em artigos anteriores uma assessoria inteligente e ponderada ao senhor Presidente da República. Alguém com autoridade moral para dizer-lhe que ele não é mais um deputado do “baixo clero”, nem o sindicalista defensor de aumentos salariais e vantagens para as corporações militares, mas o Chefe da Nação.

Para assumir uma postura de estadista, como tiveram (pode-se discordar politicamente, mas reconhecer o comportamento) Getúlio Vargas, Juscelino Kubitscheck e Ernesto Geisel, deve ser o espelho de altivez impondo respeito à cidadania.

Caso queira continuar um capitão lendário eleito pelos seus seguidores – como capitães lendários foram do outro lado da moeda seus inimigos Lamarca e Prestes pelos deles –, o presidente Jair Bolsonaro deve se habituar a assumir a postura condizente com o cargo que ocupa; mas se quiser, pode manter o comportamento desaforado dos antigos cabos de polícia das cidadezinhas sertanejas…

Marjorie Salu

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