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LUCIDEZ

MIRANDA SÁ (E-mail: mirandasa@uol.com.br)

“A claridade é uma justa repartição de sombras e de luz” (Goethe)

No meu último artigo, “Dialética”, deixei de lado o silêncio sobre as críticas que recebo, e numa delas – faz algum tempo – fui acusado de esquecer a minha laicidade político-religiosa para defender o Papa Francisco.

Não nego que vejo como positiva para a Igreja Católica e para os autênticos cristãos, a presença do cardeal presbítero Jorge Mario Bergoglio, o argentino que atualmente se senta no trono de São Pedro.

Esta posição deve-se à percepção de que Francisco levou para Roma uma visão nova, arejada, experiente e, sobretudo, corajosa. Não é por acaso que é um Jesuíta; e assim sendo levou-me a uma narrativa que ouvi do padre José Maria, meu primo já falecido.

Esse meu parente sacerdote, cristão convicto de vocação eclesiástica, abandonou a batina para se casar, forçado pelas cretinices herdadas de estúpidos dogmas e das imposições imperiais do imperador Constantino que nada têm a ver com Jesus Cristo.

A história é a seguinte: – “Reunidos certa noite quatro religiosos, um beneditino, um capuchinho, um dominicano e um jesuíta liam o breviário. Uma pane na energia apagou a lâmpada. Daí, falou o capuchinho: – Continuo o breviário no escuro, pois conheço-o de cor.

“O beneditino então sugeriu que se abandonasse o breviário e conversassem sobre a origem da Criação pelas palavras de Deus, “Faça-se a luz”. Pegando a palavra, o dominicano discursou sobre a vontade de Deus na origem de tudo.

“O jesuíta havia se afastado, e mal se fez silêncio na interlocução dos colegas a iluminação voltou. Ele fora trocar o fusível e iluminou o ambiente…”.

A praticidade dos membros da Companhia de Jesus é um dos motivos que me faz dar crédito ao Pontífice na condução dos destinos da Igreja Católica. Embora não seja católico e, em matéria de religião, um agnóstico, acato e respeito a fé dos cristãos, como admiro o humanismo dos budistas e o fervor dos islamitas.

Pela independência em torno das ideias que insisto em manter, sinto-me liberto dos preconceitos políticos, religiosos e sociais; e quando da coroação do Papa Francisco estava de passagem por Buenos Aires, cidade que me fascina e reforça a minha admiração pelos argentinos.

Estava na capital platina quando a fumaça branca anunciou a eleição do novo papa. Pensei que encontraria à venda fotos e botons de Francisco para levar para amigos católicos no Brasil, mas procurando-os em Buenos Aires nada achei.

Lá em Buenos Aires, tenho um amigo comunista que é dono de uma banca de jornal na calle Florida, a quem perguntei qual a razão desse desprezo por um conterrâneo, no que ele, no seu sectarismo ideológico, foi curto e grosso dizendo-me –: “Precisamos de tempo para apreciá-lo por que nunca se sabe de que lado ele está…”

A desconfiança de fazer prognósticos sobre o papel de um indivíduo assumindo o poder, me parece correta. Fi-lo com relação ao capitão Bolsonaro; depois, revoltado com a sua traição às promessas de campanha, com a decepção que cresceu pelas suas mentiras cínicas em defesa dos filhos e contra a Lava Jato, tornei-me opositor um dia após Sérgio Moro sair do Ministério.

Segui o caminho de quem é patriota e combatente contra a corrupção; é impossível que se aceite a aliança silenciosa do bolsonarismo com o lulopetismo, pela impunidade dos corruptos, igualando-os e juntando-os na fotografia em grande angular do extremismo populista e delinquente.

Segundo Tolstoi a lucidez deve chegar ao limiar da alma; por isso estou à espera de alguém, não importa cor, sexo, religião ou partido, que se candidate a trocar os fusíveis, e que se faça a luz para a Nação Brasileira.

Marjorie Salu

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