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IDADE DA RAZÃO

MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.com.br)

Michel de Montaigne, filósofo, escritor e humanista francês, autor dos antológicos “Ensaios”, expressou nos seus escritos um pensamento notável, embora pareça óbvio: “Basta viver setenta anos para se ver tudo e o seu oposto”.

Daí, mesmo sem precisar da Inteligência Artificial, criei um personagem de ficção (gente como a gente, não um robô) e dar-lhe algo mais do que a simples vivência neurônica, através da palavra que se lê com as lentes da realidade: “Estudo”.

Na vivência sócio-política que atravessamos, vê-se que a educação dos filhos e netos tem agitado o pessoal do “X”. Tuiteiros até abrangeram sobrinhos-netos, o que me despertou a atenção, trazendo-me para participar desta discussão saudável no corredor da inteligência.

É ponto pacífico que todos querem a felicidade dos seus descendentes – e os mais altruístas estendem este desejo a todas crianças do mundo. É um sentimento nos leva a perguntar: – “O que é a felicidade?”.

Em todos estágios civilizatórios sempre se procurou conquistar a felicidade pessoal ou coletiva; mas a amplitude e complexidade da sua definição nos leva ao seu aspecto psíquico.

Seguindo Jesus, os cristãos defendem que a conquista da felicidade é amar o próximo, sem nada exigir em troca; os ateus pensam como o sociólogo argentino Christian Ferrer, que considera a felicidade um estado emocional e estabelece o princípio de que o ideal de felicidade é a reciprocidade de uns e outros.

Vendo a vida pelo avesso do alto dos meus 90 anos, considero que a alegria e a tristeza, estes sim, são estados emocionais; mas não vejo como enquadrar a felicidade nisto. Indo ao dicionário, encontramos o verbete Felicidade como um substantivo feminino significando “estado de uma pessoa feliz” com diversas definições relativas, êxito, sucesso, sorte e ventura.

O criador da Psicanálise, Freud, cuja importância no estudo da saúde mental dispensa apresentação, defendeu que todo ser humano é movido pela busca da felicidade através do princípio do prazer; e foi pessimista, considerando esta ansiedade um fracasso, pela impossibilidade efetiva de satisfazer a todos os desejos.

Do lado metafísico, as religiões entregam a Deus a probabilidade de conquistar a felicidade; e o budismo ateu é tão exigente quanto Freud, pois o Mestre ensinou que a felicidade só será obtida pela superação do desejo em todas as suas formas, o que é dificílimo para o ser humano.

Temos um cruel episódio protagonizado pelo último rei da Lídia, Creso de Mermnada. que a História registra. Conta que ele, aprisionado por Ciro na guerra que destruiu o seu país, foi condenado à morte; e, diante do carrasco, proferiu: – “Dada a incerteza das vicissitudes humanas e a inconstância da sorte, ninguém pode se assumir como feliz enquanto não chegar a sua hora final”.

Expressou o pensamento do poeta Sólon, o sábio fundador da democracia ateniense; e também do pessimista Nietzsche, que escreveu: – “A luz das estrelas mais distantes chega tardiamente aos homens; e antes que chegue, o homem nega que ali haja estrelas”. Triste negativa de que seja possível aspirar a felicidade à luz das estrelas….

Como a compreensão vem com a velhice, segundo Platão, creio que poderemos ser felizes, sim; considero-me um homem feliz.

Conquistei isto formando a consciência da realidade. Desprezei a relatividade das coisas e e o egocentrismo dos que só enxergam a si mesmos. Na Idade da Razão vê-se que a felicidade pode tardar a vir como a luz das estrelas, mas certamente chegará o dia da iluminação; e ela chega.

Marjorie Salu

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Marjorie Salu

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