Categorias: Artigo

DAS PAIXÕES

MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.com.br)

Civilização significa tudo aquilo que os seres humanos desenvolveram ao longo dos anos para se sobrepor à ancestral condição animalesca. Trata-se de uma arquitetura social para atender à humanidade nas suas necessidades.

O processo da evolução civilizatória levou as nações a se organizarem com um esquema jurídico para manter as instituições governamentais e proteger a cidadania contra o poder monocrático das ditaduras.

É por isto que a civilização deve ser defendida contra o individualismo. São impulsos individuais de lideranças políticas que adotem qualquer rótulo ideológico seja de “direita” ou de “esquerda”.

Só visando a coletividade é que as nações podem cumprir a tarefa de aproveitar o que a Natureza oferece, visando produzir bens para o bem estar social. Assim pensando, desde os tempos remotos, nasceram sonhos utópicos fazendo a festa dos filósofos….

As utopias visam regimes perfeitos que só podem existir teoricamente. Uma sociedade excepcional, igualitária, distributiva e justa é o modelo inatingível que o filósofo, escritor e humanista inglês, Tomás Morus, criou em 1516 junto com o próprio termo, “Utopia”.

A tese de um sistema ideal das condições e relacionamento humano defendida por Morus foi possivelmente inspirada no antecessor, o filósofo grego Platão, que trouxe no seu livro “Atlântida”, uma cidade governada por filósofos, onde o Saber e a Justiça orientariam a vida coletiva.

Entre os sonhos de uma sociedade perfeita funcionando como um todo surgiu cem anos depois da “Utopia”, em 1602, a “A Cidade do Sol”, a projeção de uma sociedade teocrática e científica organizada pela cooperação intelectual, foi defendida pelo frade dominicano Tomazo Campanella; e, no mesmo século, em 1627, o filósofo Francis Bacon escreveu a “Nova Atlântida”, exaltando o papel da ciência e da pesquisa por instituições de governo respeitáveis como base para o progresso.

Este conjunto imaginário por uma sociedade perfeita ressurgiu na agitação intelectual da Revolução Francesa e radicalizou cem anos depois (1871) na Comuna de Paris, um governo popular formado por operários sob influência anarquista que durou 72 dias.

A Utopia, levada à prática pela primeira vez pelos communards, implementou reformas que mais tarde foram adotadas na comunidade internacional, como o ensino gratuito e a autogestão de fábricas.

Esta experiência anarquista foi sufocada pelo exército francês resultando em milhares de mortos e 43.522 presos incluindo entre eles 1.054 mulheres; tal violência acendeu as paixões políticas na Europa e de lá, se expandiu mundialmente.

O espírito da contradição entre revolucionários e governos opressores levou Helvétius, filósofo francês, maçom e literato, a observar que há paixões originárias da Natureza e as que se tornam a bandeira das revoltas contra ambições, corrupção e a desigualdade social e política.

Interessante é que Helvétius concluiu que estas duas espécies de paixão produzem uma terceira, aquela que leva o ser humano a adotar “amor por um” e “ódio pelo outro” ….

Com esta tese, caímos no caso brasileiro da nojenta polarização eleitoral atualmente reinante e assumindo a forma caricata da paixão, o culto da personalidade. Veja-se que assentados no favoritismo e nos privilégios, os polarizadores Jair e Lula partilham da ideia dos “programas sociais” que mascaram a compra de votos com o dinheiro público.

Isto provoca o contraponto entre o desenvolvimento social, econômico e político e a estagnação que favorece uma minoria; esta distorção mantém a política populista que subtrai valores do mundo do trabalho para favorecer o não-trabalho. É o fascismo com a fantasia do socialismo, trocando o princípio “quem não trabalha não come”, por outro: “ganhe uma bolsa e vote na gente”.

Assim, as paixões do sistema de alternância eleitoralista tornam-se ridículas vendo-se a disputa de ambos lados para conquistar a simpatia de Trump; a direita bolsonarista puxando o saco na copa e cozinha da Casa Branca e a esquerda lulista chamando o presidente dos EUA de “cumpanhero Trump” ….

Marjorie Salu

Compartilhar
Publicado por
Marjorie Salu

Textos Recentes

DAS PROIBIÇÕES

MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.com.br) Na ditadura militar que durou de 1964 a 1979 censurando a expressão do pensamento, cantou-se a…

30 de setembro de 2025 18h41

Augusto Frederico Schmidt

As chuvas da primavera Em breve virão as chuvas da Primavera, As chuvas da primavera Vão descer sobre os campos,…

25 de setembro de 2025 20h00

DE MURMÚRIOS

MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.com.br) Só ouvi a palavra “Murmúrios” em letras de boleros e tangos. É visceral; o seu intimismo…

24 de setembro de 2025 12h03

Marina Colasanti

Outras palavras Para dizer certas coisas são precisas palavras outras novas palavras nunca ditas antes ou nunca antes postas lado…

21 de setembro de 2025 20h00

Pagu

Canal Nada mais sou que um canal Seria verde se fosse o caso Mas estão mortas todas as esperanças Sou…

18 de setembro de 2025 20h00

Patativa do Assaré

O agregado e o operário Sou matuto do Nordeste criado dentro da mata caboclo cabra da peste poeta cabeça chata…

16 de setembro de 2025 20h00