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APARÊNCIA

MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.com.br)

“A mulher de César não basta ser honesta, deve parecer honesta” (Caio Júlio César)

Não me lembro se já contei a história recolhida de um livro, cujo título e autor se perderam na memória, mas cujo conteúdo ficou inesquecível. Guardei-a “de cabeça”:

– Quando estavam sendo concluídas as obras da Catedral de Colônia, em 1880, o seu arquiteto, Ernst Friedrich Zwirner, mandou que um escultor que aplicasse melhor o polimento num dos demônios que se projetam nos nichos do teto.

– “Como poderão vê-lo daqui, a 50 metros de distância? ”, ponderou o artífice, que recebeu de pronto uma resposta transcendente:

– “Nós não construímos esta catedral para homens, mas para Deus. Por isso deve ser perfeita”.

A aparência deveria receber cuidados de todas as pessoas. Não da aparência física que o tempo desgasta, mas do que está além da percepção formal.  Segundo Platão, desse mundo das aparências sensíveis só se pode ter conhecimento verossímil ou provável, dada a sua natureza incerta e fugaz; o conhecimento racional que tem por objeto o ser”.

Como verbete dicionarizado, “Aparência” é um substantivo feminino de origem latina (apparentia.ae), aquilo que se mostra à primeira vista; exterioridade, aspecto; e/ou um fato contradiz todas as configurações, engano, ilusão.

Enganoso e ilusório é o poder político. O sábio Machado de Assis que não me canso de ler e reler, refere-se à aparência da politicagem dizendo que “não será difícil achar semelhança entre uma eleição e uma mágica; avultam em ambas as visualidades e tramoias”.

Vemos tristemente que o carreirismo, o egocentrismo e fraude são desvios morais que não se limitam aos poliqueiros no exercício dos seus mandatos. É verdade que a eleição é o começo de tudo na corrida pelo poder, mas há os que chegam lá sem precisar de votos e são os que mais criam conflitos na sociedade.

Estes, de autoridade questionável entre os cidadãos e cidadãs que não lhes outorgaram força moral com liberdade de escolha, ministros do Supremo Tribunal Federal parecem os personagens sinistros dos filmes de terror programados para o Halloween…

Destaca-se um deles levando-nos à locução “Vergonha Alheia” no que ocorreu entre o ministro Marco Aurélio Mello e a advogada Daniela Lima de Andrade Borges.

Ela iniciava a defesa oral de um processo com as palavras “… inclusive queria confessar aqui para vocês, que nessa causa se discute…” quando foi interrompida por Mello que, indignado, repreendeu-a rispidamente pela referência “vocês” e não “excelências” como manda a “liturgia”.

A personalidade psicopática deste senhor exige um tratamento médico. Ele se coloca no Olimpo, como se o STF metaforicamente fosse. Acredita ter a força sobre raios e trovões, como Zeus; e evocar tempestades e maremotos como Netuno…

Revoltante é que este devaneio efêmero de alguém que urina e defeca como todos os mortais, torna-se coletivo com o comportamento deformado dos seus colegas, despindo-se de toda dignidade ao abrir os portões dos presídios somente para soltar um bandido de estimação.

Estes usurpadores do Poder Judiciário não se acovardaram porque contam com apoio nos porões dos outros poderes republicanos, no Legislativo controlado pelos picaretas do Congresso Nacional e no Executivo, pela tibieza comprometida que transita nos corredores do Palácio do Planalto.

Vemos assim, na Catedral dos interesses nacionais, os demônios da prepotência de um ministro do STF, a ditadura do Judiciário e o silêncio cúmplice dos políticos cuja formação patriótica se resume a discursos demagógicos.

Marjorie Salu

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