Categorias: Artigo

A CONSTITUIÇÃO

MIRANDA SÁ (E-mail: mirandasa@uol.com.br)

                  “Eu sei bem que é melhor não vender nada, nem vinho puro, nem vinho falsificado” (Machado de Assis)

Não gostei e continuo sem gostar da Constituição de 88, gongórica e populista. Seu estilo rococó, cheia de brechas e falta de exatidão. Dá muito trabalho para interpretá-la, por isso vale a pena discutir ideias em torno da Carta Magna e a proposta do general Hamilton Mourão, de que – ‘Uma Constituição não precisa ser feita por eleitos pelo povo”.

À primeira vista, a declaração do General parece uma precaução sobre a possibilidade da convocação de uma Constituinte eleita com a maioria dos picaretas de sempre, conforme a legislação eleitoral vigente e os vícios da politicagem reinante.

Se os atuais parlamentares, mesmo com a pequena renovação costumeira, escrevessem uma nova Constituição, ela traria os mesmos privilégios que os mantém, assegurando-lhes a infame profissionalização da política e suas vantagens indevidas.

Em teoria obedeceria a “princípios democráticos”, mas há vários exemplos de rompimento da legitimidade monopolista de uma constituinte, em se tratando de mudar o sistema político deperecido e corrupto. Só não enxergam isto os usufrutuários e defensores da complacência e o favorecimento das leis.

Pela dificuldade de pesquisar certas passagens do Império, não posso afirmar se foi em 1882 ou 1883 que o Poder Legislativo, com anuência do Poder Moderador e pronta execução do Poder Judicial, extinguiu a “Polícia Secreta” então instituída pela constituinte de 1824.

O argumento para o fim dos “secretos” baseou-se no abuso ignorante de alguns membros do órgão que, para se darem importância, diziam – “Sou polícia secreta”, com intenção vaidosa de se fazer respeitar…

Aqueles esbirros traíam a própria condição de serem secretos como fazem hoje os que arrotam a defesa de uma constituinte sem impedir que as raposas felpudas da politicagem participem dela. Já imaginaram Sarney, Barbalho, Renan, Collor, Requião, Cid Gomes, Aécio e Suplicy aprovando uma Constituição?

Seria temeroso, mas mesmo assim, a ideia de Mourão de fazer uma Constituição elaborada por “notáveis”, teoricamente patriotas, honestos, cultos e independentes, é discutível: quem seriam os novos José Bonifácio, Rui Barbosa, Epitácio Pessoa, Milton Campos ou Aliomar Baleeiro?

Para saltar sobre a Democracia, conquistada por alto preço, não podíamos ter “notáveis” tipo Nelson Jobim, ou Alexandre Moraes, ou José Afonso da Silva, e muito menos pela facção política que se assenta no STF, que lá adentrou e faz a Justiça sair por outra porta…

Entretanto, os espertalhões hipertróficos da política e mantidos por currais eleitorais, sendo mais representantes da ignorância do que do pleito democrático, não se iludem sobre isto. Controlam partidos e se cercam de cúmplices ou comparsas remunerados. Seriam estes que nos dariam uma Constituição verdadeiramente republicana e democrática?

Machado de Assis escreveu que “As constituições são os tratados de paz celebrados entre a potência popular e a potência monárquica”; peço vênia ao grande escritor e pensador para perguntar: Se a Carta for elaborada sem uma constituinte e aprovada por um plebiscito será uma vitória da “potência popular”?

Marjorie Salu

Compartilhar
Publicado por
Marjorie Salu

Textos Recentes

FALANDO GREGO

MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.om.br) MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.om.br) Clássico é clássico; não foi por acaso que Shakespeare criou expressões que…

13 de outubro de 2025 18h05

DAS PAIXÕES

MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.com.br) Civilização significa tudo aquilo que os seres humanos desenvolveram ao longo dos anos para se sobrepor…

8 de outubro de 2025 8h55

DAS PROIBIÇÕES

MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.com.br) Na ditadura militar que durou de 1964 a 1979 censurando a expressão do pensamento, cantou-se a…

30 de setembro de 2025 18h41

Augusto Frederico Schmidt

As chuvas da primavera Em breve virão as chuvas da Primavera, As chuvas da primavera Vão descer sobre os campos,…

25 de setembro de 2025 20h00

DE MURMÚRIOS

MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.com.br) Só ouvi a palavra “Murmúrios” em letras de boleros e tangos. É visceral; o seu intimismo…

24 de setembro de 2025 12h03

Marina Colasanti

Outras palavras Para dizer certas coisas são precisas palavras outras novas palavras nunca ditas antes ou nunca antes postas lado…

21 de setembro de 2025 20h00