COMIGO ME DESAVIM
Comigo me desavim,
Sou posto em todo perigo;
Não posso viver comigo
Nem posso fugir de mim.
Com dor, da gente fugia,
Antes que esta assim crescesse:
Agora já fugiria
De mim, se de mim pudesse.
Que meio espero ou que fim
Do vão trabalho que sigo,
Pois que trago a mim comigo
Tamanho imigo de mim?
Sá de Miranda
O Poeta
Contemporâneo de Camões (1524?-1580), o poeta Francisco de Sá de Miranda (1481-1558) é, depois do bardo de “Os Lusíadas”, o autor português mais lido do século XVI.
Sua trova “Comigo me Desavim” é uma pequena obra prima. Antecipa, em poesia, questões que até hoje parecem estranhas ao senso comum. Nada soa mais desafinado do que alguém revelar que está de mal consigo mesmo. Ou seja, “eu é um outro”, como disse Arthur Rimbaud (1854-1891), 300 anos depois. Sá de Miranda já sabia.
Afora o pioneirismo da idéia, não é possível deixar de notar a música no trovar desse bardo quinhentista. Os versos fluem, e Miranda trabalha com a malícia das palavras. Paralelismos: “Não posso viver comigo / Nem posso fugir de mim”. Observe-se, também, nos dois versos finais, a riqueza da aproximação entre as palavras “comigo” e “imigo”.
Comigo, claro, é com+migo (eu). Imigo, forma sincopada de inimigo, soa como se fosse in+migo. Quer dizer, o inimigo está dentro de mim. Genial. (Augusto de Campos faz esta observação sobre a palavra “imigo” em seu livro O Anticrítico, Cia. das Letras, 1986.)
Outro poema muito conhecido de Sá de Miranda é o soneto “O sol é grande”. Nele, o poeta discorre sobre a mutabilidade das coisas (“Ó cousas todas vãs, todas mudaves”). O tema é o mesmo cantado por Camões em seu soneto “Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades”.
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