Categorias: Notas

Miles Davis e John Coltrane

Miles Davis (1926 – 1991)

Miles Davis efetivamente constitui, sozinho, um capítulo à parte dentro do jazz. Pode-se dizer, sem medo de errar, que ele foi uma verdadeira força propulsora do jazz durante mais de quarenta anos. Seu som ao trompete, puro, macio e quase sem vibrato, emitido freqüentemente com o uso da surdina, e seu fraseado conciso e despojado tornaram-se marcas registradas. Sua personalidade difícil, às vezes contraditória, também. Fundador do cool jazz, do jazz modal, do jazz-rock e da fusion, Miles fez da renovação das linguagens o principal impulso gerador de sua música.

Sua carreira, inciada dentro do bebop, apresentou uma fase brilhante já em 1948-1950, com a formação da célebre Miles Davis-Capitol Orchestra, onde o genial arranjador Gil Evans começou a escrever verdadeiras obras-primas que davam todas as condições para a expressividade de Miles. A colaboração Miles-Evans continuou ao longo dos anos 50. Os arranjos de Evans não têm paralelo em nenhuma big band: trata-se de peças impressionistas, com estruturas elaboradas, texturas timbrísticas sofisticadas, revelando influências variadas que incluíam, por exemplo, a música espanhola.

Paralelamente ao trabalho com Gil Evans, Miles dava, a partir de 1949, os contornos ao nascente estilo cool, eminentemente apropriado à sua maneira intimista de tocar, gravando as sessões intituladas Birth of the Cool.

De 1956 em diante, Miles lidera um quinteto / sexteto que, através de suas várias formações, entraria para a história do jazz. Para se ter uma idéia dos talentos envolvidos, inicialmente o quinteto contava com o saxofonista John Coltrane, o pianista Red Garland, o contrabaixista Paul Chambers e o baterista Philly Joe Jones; esta formação gravou a série de discos intitulados Relaxin’, Workin’, Steamin’ e Cookin‘. Com a entrada do sax alto Cannonball Adderley, o conjunto se tranformou no sexteto que gravou Milestones. Em 1959 Red Garland foi substituído por Bill Evans e Wynton Kelly, que se revezavam ao piano, e Jones cedeu o lugar a Jimmy Cobb, no sexteto que gravou um dos discos mais cult do jazz de todos os tempos, Kind of Blue.

Com Live/Evil, de 1970, e alguns outros discos até 1972, encerra-se uma fase na carreira de Miles e tem início outra, ainda mais controversa que a de Bitches Brew. Durante os anos 70 e 80, Miles continua realizando experiências com a integração de linguagens, renovando completamente seus conjuntos com músicos pouco conhecidos, afastando-se do jazz (mesmo do jazz-rock) e aproximando-se do funk até do hip-hop. Mas, como se trata de Miles, nem por isso tal fusão se torna trivial ou comercial. Embora as opiniões se dividam acerca das obras desse período, o som de Miles continua inconfundível, e sua poderosa mente musical continua claramente no controle.

Em 28 de setembro de 1991 o trompete de Miles silencia. Sua obra – vasta, multifacetada, evolutiva, desbravadora, ora hermética, ora lírica – irá certamente fornecer material para análise e motivo de puro deslumbramento para muitas gerações.

Fonte: ejazz/o site do jazz e da música instrumental brasileira

Marjorie Salu

Compartilhar
Publicado por
Marjorie Salu
Temas: jazzMiles Davis

Textos Recentes

DA ÉTICA

MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.com.br) Entre os méritos que não deixo de lembrar e elogiar, a antiga Editora Abril nos deu…

20 de outubro de 2025 18h10

FALANDO GREGO

MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.om.br) MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.om.br) Clássico é clássico; não foi por acaso que Shakespeare criou expressões que…

13 de outubro de 2025 18h05

DAS PAIXÕES

MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.com.br) Civilização significa tudo aquilo que os seres humanos desenvolveram ao longo dos anos para se sobrepor…

8 de outubro de 2025 8h55

DAS PROIBIÇÕES

MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.com.br) Na ditadura militar que durou de 1964 a 1979 censurando a expressão do pensamento, cantou-se a…

30 de setembro de 2025 18h41

Augusto Frederico Schmidt

As chuvas da primavera Em breve virão as chuvas da Primavera, As chuvas da primavera Vão descer sobre os campos,…

25 de setembro de 2025 20h00

DE MURMÚRIOS

MIRANDA SÁ (Email: mirandasa@uol.com.br) Só ouvi a palavra “Murmúrios” em letras de boleros e tangos. É visceral; o seu intimismo…

24 de setembro de 2025 12h03