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Economia: ‘in’ e ‘out’

Tenho a impressão de que tudo começou com uma brincadeirinha sofisticada de salão lançada pela revista americana Esquire. In e out. Anos 50, possivelmente 40.

O tipo de roupa que estava por dentro (vamos adaptar logo a coisa), a atriz que estava por fora. O carro, a cidade balneária, o vinho, o restaurante, filmes, atores e atrizes e por aí afora. Pegou. Pegou furiosamente. Virou a coisa mais in do mundo. Até suas inevitáveis variações. Algo estava tão out, mas tão out que passava a ser in.

Claro que nós fomos nessa. O “quente” e o “frio” (ou “gelado” e ainda “devagar quase parando”) têm suas origens na matéria daquela que foi uma das mais sofisticadas publicações do mundo.

Corte rápido para o ano de 2009. In e out continuam firmes passando julgamento. Coroando isso, condenando aquilo. Vivemos tempos duros e complicados. É recessão pra cá, deflação pra lá, inflação acolá. Mais complicado que qualquer bolero. Quem não me deixa mentir é o Centro Nacional de Estatísticas do Reino Unido. Brincando, brincando, sua 62ª resenha anual mostra a quantas andam os cidadãos britânicos. Em matéria de gosto. Os jornais aproveitaram e pegaram a deixa da Esquire. Página inteira para o que está in e para o que está out. Por dentro e por fora, insisto, num acordo ou reforma pessoal.

Vivo aqui, interesso-me pelo que andam fazendo por aí. Quero estar por dentro e não por fora. Portanto, preparo-me para a recessão com um bom copo de vinho, boa comida e, talvez, uma boa noite diante da televisão vendo DVD alugado online. Estarei por dentro, in para valer. Essa noitada é a atual tendência, segundo aqueles que estudam os modos e costumes dos nativos que me cercam e que procuro seguir. Friso: por questões econômicas. Dinheiro, seu excesso ou falta, está muito na moda.

As pessoas estão comprando ameixas, ovos free-range e iogurtes. O povo é soberano e decidiu: recessão alguma vai lhe roubar os pequenos prazeres da vida nestas ilhas. Por esse motivo, o queijo parmesão e o vinho rosé passaram a fazer parte da lista do Centro de Estatísticas. Quem achava tremenda cafonice ir de vinho rosé quebrou a cara. É quente, quentérrimo. Servido, claro, beirando o geladinho. Vale lembrar o fato de que o rosé é o vinho de mais baixo teor alcoólico de todos os vinhos. Não cair de porre, não sair por aí de porre também já era. Out, out, out.

Beiram o “estar por fora” também os restaurantes. Embora com a dinheirama que (ninguém sabe o como e o porquê) anda rolando por aí não há motivo para se ficar com pena das casas de pasto (vamos dar nome aos vitelos) com suas miríades de estrelas. Acontece, porém, que as pessoas estão comprando seus almoços e jantares nos supermercados. Tudo micro-ondável. Principalmente, peixe e carne de boi. Não, as marmitas e os marmiteiros ainda não fizeram uma espetacular reentré.

Eletrônica? Tudo bem, sim senhor. O sinal analógico estará mais do que out, morto mesmo, a partir de 2011. Portanto, na moda estão os DVDs Blu-ray de alta definição, já que seu preço, coisa estranha, andou caindo bastante. Junto com eles, essa mania que pegou de se alugar pelo correio os simpáticos disquinhos que uma companhia especializada manda em envelopes já selados para você devolver. Dois ou três por semana. Uma pechincha.

Por fora, finalmente, muito por fora, as câmeras de 35mm, os vídeo-gravadores, os aparelhos de TV tradicionais, o CD player também tradicional, a galinha congelada, sobretudos (!?) e móveis de jardim feitos de matéria plástica. Tudo isso, já era. Já era mesmo.

Pena fiquei foi com alguns profissionais que eram de minha simpatia: os relojoeiros. Não estão devagar quase parando. Pararam mesmo. Feito os relógios no qual davam um jeito. Só que pararam de vez.

Fonte: Ivan Lessa, colunista da BBC Brasil

Marjorie Salu

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Marjorie Salu

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